Juiz Eurico Reis alvo de inquérito disciplinar

Confrontado com inquérito do Conselho Superior de Magistratura, Eurico Reis retorque que "direito à liberdade de expressão se sobrepõe ao dever de reserva" dos juízes.

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Eurico Reis (ao centro) Nuno Ferreira Santos

O Conselho Superior de Magistratura (CSM) decidiu abrir na terça-feira um inquérito disciplinar ao juiz-desembargador Eurico Reis, ex-presidente do Conselho Nacional de Procriação Medicamente Assistida (CNPMA), na sequência de uma entrevista que o magistrado deu ao semanário Expresso há várias semanas e em que criticou o Tribunal Constitucional.

Eurico Reis comentava uma notícia avançada no início de Fevereiro que revelava que o Tribunal Constitucional se estava a preparar para chumbar a lei da gestação de substituição. "Seria um autêntico golpe de Estado - e estou a usar as palavras com o peso que elas têm - que o TC decretasse, se decretar, que a lei é inconstitucional com efeitos retroactivos. As decisões dos tribunais funcionam sempre para a frente”, declarou ao Expresso em Fevereiro.

Contactado pelo PÚBLICO, o vice-presidente do CSM, Mário Morgado, confirmou que o plenário da passada terça-feira decidiu abrir um inquérito disciplinar ao juiz.

Sem querer fazer comentários antes de ser notificado do processo, o desembargador defende que "o direito à liberdade de expressão se sobrepõe ao dever de reserva" dos juízes. “Tenho a obrigação de obedecer às decisões do Tribunal Constitucional mas acho que isso não me pode tirar o direito a ter uma opinião. Era o que faltava”, afirmou ao PÚBLICO.

O juiz que trabalha no Tribunal da Relação de Lisboa recorda, a propósito, que não é a primeira vez que é alvo de um processo disciplinar instaurado pelo Conselho Superior de Magistratura. Diz que tem ainda pendente no Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) uma queixa relativa a um processo instaurado pelo CSM em 2012 e em que acabou por ser condenado. Na altura foi o então presidente do Tribunal da Relação de Lisboa que se queixou de Eurico Reis depois de este ter dado uma entrevista ao jornal a explicar as circunstâncias do desaparecimento de um processo em que ele próprio era queixoso.  

Esta quinta-feira, Eurico Reis demitiu-se do CNPMA em protesto contra o acórdão do TC que declarou inconstitucionais várias normas da lei da gestação de substituição e procriação medicamente assistida.  "Demito-me em forma de protesto. Não concordo com aquela solução. Como já disse, aquela decisão é para cumprir, mas acho que é um desastre completo", justificou.

O acórdão do TC foi conhecido na terça-feira. Apesar de afirmarem que a gestação de substituição, "só por si, não viola a dignidade da gestante nem da criança nascida em consequência de tal procedimento", os juízes consideram que alguns aspectos do diploma legal lesam "princípios e direitos fundamentais consagrados na Constituição".

Nomeadamente a "excessiva indeterminação" da lei no que toca aos limites da autonomia das partes do contrato de gestação de substituição e o prazo de arrependimento da gestante, que consideram curto.  Outra norma considerada inconstitucional diz respeito à identidade genética, deixando de estar garantido o anonimato do dador. 

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