Jovens que interromperam Passos Coelho vão lançar manifesto contra o Governo

Mariana Pinho (que não consegue pagar o passe) e Filipa Gonçalves (que não consegue emprego e pensa emigrar) fazem parte deste grupo criado no dia da Greve Geral

“Desemprego, precariedade e emigração.” Foi contra as “três soluções oferecidas pelo Governo a quem sai do ensino superior” que um grupo de oito jovens ergueu esta quarta-feira uma faixa com a palavra "Demite-te", no exacto momento em que o primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, iniciou o seu discurso durante um seminário sobre segurança na Universidade Nova de Lisboa.

“É a única solução. Este Governo não tem capacidade nem competência. Passos Coelho e Nuno Crato não podem continuar”, disse ao P3 Filipa Gonçalves, uma dos jovens que participou no protesto. O grupo de estudantes que entrou no seminário desta manhã é apenas uma pequena parte de um grupo que começou a formar-se a 14 de Novembro, dia de Greve Geral.

Uns conheceram-se no próprio dia, outros já se conheciam antes. “Com o Orçamento do Estado e as últimas medidas aplicadas ao ensino superior faz cada vez mais sentido protestar”, disse a jovem de 26 anos, a terminar o mestrado em Ciência Política no Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE).

Foi com preocupação que a estudante ouviu as declarações de Passos Coelho numa entrevista recente à TVI: "Achamos que esta ameaça de pagamento no secundário foi uma estratégia para depois aumentarem ainda mais as propinas no superior, uma espécie de preparação." 

Abandonos não param

Nos próximos dias, o grupo, constituído por jovens de vários partidos políticos e outros sem filiação, vai tornar público um manifesto, assinado já por 100 pessoas, contra a política do Governo PSD-CDS. É a resposta de quem vê “cada vez mais pessoas a abandonarem a faculdade, muita gente a congelar a matrícula à entrada do segundo semestre”, contou Mariana Pinho, estudante da Universidade Nova.

Este mês, o dinheiro não chegou para o passe, que com o fim do desconto sub-23 custa agora 40 euros por mês. Mariana tinha de decidir: andar nos transportes públicos sem pagar e sujeitar-se a ser multada, ou deixar de ir às aulas. “A mobilidade devia ser um direito e também isso nos tiraram”, lamenta.

Já na fase final do mestrado, “com as despesas a aumentarem e a família com dificuldades”, Filipa Gonçalves iniciou a busca por emprego. Inglória, até agora: “Se não tiver solução cá tenho de emigrar, mas preferia ficar.”

Contra o fim da cantina 

A cantina, maioritariamente frequentada por alunos do ISCTE, como Filipa Gonçalves, está também em vias de fechar: “As funcionárias já foram informadas de que a cantina ia encerrar. Durante as férias de Natal deve fechar”, lamenta a aluna de Ciência Política.

É mais uma dificuldade para juntar à lista: na verdade, atenta Mariana Pinho, já há uma “boa parte” de estudantes que nem na cantina consegue comer. “Vê-se imensa gente com ‘tupperware’, é poupar até ao limite”.

Os oito manifestantes fizeram tudo “como devia ser”: inscreveram-se no seminário, entraram ordenadamente. “Quando o primeiro-ministro começou a falar levantamo-nos. Os seguranças disseram-no que tínhamos de sair, mas continuamos. Dissemos que não estávamos a ir contra a lei”, contou Filipa Gonçalves.

Foi também nesse momento que se ouviu Passos Coelho dizer aos seguranças para não interferirem no processo (“Pedia ao Serra [um dos elementos da sua segurança] que deixasse os senhores ostentarem o cartaz sem nenhum problema, porque vivemos, felizmente, numa situação de boa saúde da nossa democracia”, terá dito o primeiro-ministro).

No fim do seminário, Passos Coelho disse aos jornalistas não ter sido “difícil” continuar o seu discurso apesar do protesto. “Mostra a arrogância e o descaramento perante o país, uma desconsideração por quem está a passar dificuldades”, lamenta Mariana Pinho.

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