Pensar num problema do futuro, baseando-se nas tendências do presente, e desenvolver uma solução. Foi esse o desafio proposto pela Beam Me Up, Scotty!, uma competição inserida na Feira de Design de Helsínquia, que Fernanda Torre venceu com o projecto Life Bits.

Este é um projecto de cubos interactivos que podem conter, por exemplo, vídeos e sons, para que no ano de 2030 se contem as experiências de hoje. A vitória na competição Beam Me Up, Scotty!, organizada pelo +Studio e pela Diagonal, valeu à designer um prémio de 2.500 euros. "É sempre uma surpresa quando se consegue alcançar os objectivos", afirma a criadora portuguesa. No entanto, acrescenta: "Quando trabalhamos para esses objectivos, é uma sensação de justiça por sermos reconhecidos  pelo nosso trabalho". 

Curiosamente, Fernanda Torre esteve na Feira de Design de Helsínquia a representar a Suécia em Beam Me Up, Scotty!". A feira faz parte da Helsínquia, Capital Mundial do Design 2012 e o concurso pedia aos participantes que, considerando as tendências de hoje, tentassem imaginar os problemas que existirão no mundo em 2030. O objectivo final era desenhar uma solução para o futuro.

Esta portuguesa de 29 anos formou-se em Design de Comunicação, na Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto, e partiu para Estocolmo em 2009, ao abrigo do programa INOV-Art. Decidiu continuar na capital sueca para frequentar o mestrado em Design de Experiências, uma disciplina que se focaliza mais em experiências do que em objectos. "Por exemplo, em vez de se redesenhar um lata, redesenha-se uma ida ao médico: como ser tratado, a forma de passar a informação", explica Fernanda Torre.

Uma biblioteca de memórias

O desenvolvimento do projecto deveria ser feito entre um designer júnior e um designer mentor com mais experiência. Fernanda Torre, a quem a ideia de poder "influenciar o futuro com o presente" agrada,  trabalhou com o islandês Hrafnkell Birgisson.

Os criadores identificaram duas megatendências: o Envelhecimento e a Prosperidade. "A Prosperidade dos países emergentes", realça Fernanda Torre. "Fartei-me de fazer chamadas de Skype a amigos do Brasil e da Índia", conta, para ouvir opiniões sobre o futuro.  A designer percebeu que o ocidente influenciava esses países, que a economia afectava os valores dessas nações. "Senti que existia um esvaziamento a nível cultural e etnográfico nos países emergentes".

Assim, surgiu a vontade de dar "palco" às vozes daqueles que hoje têm 40 e 50 anos e que "serão os idosos em 2030". "Essas pessoas têm um conhecimento mais profundo da história do país e estão a viver esse desenvolvimento económico", justifica a designer.

Life Bits será a materialização dessa vontade, em forma de cubos interactivos. Os "pedaços de vida" de cada um podem ser arquivados em cubos com vídeo, som ou fotografia, por exemplo, para que, daqui a 18 anos, se conheçam essas histórias e experiências, "provocando o diálogo entre gerações".

O grande objectivo seria guardar todas essas memórias numa biblioteca. Fernanda Torre fala, também, do esvaziamento das bibliotecas provocado pelos "ebooks", "kindles" e dispositivos semelhantes. Assim, com a introdução destes sistemas modulares personalizáveis "existiria uma partilha de conhecimento, não através do livro, mas através do diálogo", acredita.

Life Bits desenvolvido através do Skype

A designer júnior portuguesa e o designer mentor islandês conheceram-se pessoalmente apenas no primeiro dia da apresentação. O conceito e a forma do "Life Bits" foi , sobretudo, desenvolvido através da Internet, o que até permitiu acrescentar algo ao projecto. "É uma relação de trabalho bastante privada, porque, por vezes, o Hrafnkell Birgisson estava com o filho a falar via Skype", conta Fernanda Torre. "Acho que isso deu uma dimensão mais humana ao projecto", revela.  

A apresentação do "Life Bits" aconteceu entre 12 e 16 de Setembro na Feira de Design de Helsínquia, com objectos pessoais de Hrafnkell Birgisson.