Imagem negativa do download dificulta a luta do Partido Pirata

Em Portugal, iniciativas partidárias como as do Partido Pirata são reduzidas à “marginalização pelo ridículo”

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A chamada pirataria, ou descargas da Internet, ainda é vista em Portugal como o bicho papão Flickr/Nokton

Os suecos foram os primeiros a figurar nas páginas dos jornais, os alemães os que mais recentemente conseguiram o maior número de deputados de sempre e os portugueses estão na corrida para se legalizarem. Falamos dos partidos piratas nacionais, ramificações do Partido Pirata Internacional, fundado, oficialmente, em 2010, durante a Conferência de Bruxelas.

Sistemas políticos, como os dois primeiros, estão, de acordo com o politólogo Adelino Maltez, "habituados a ter safanões de partidos de protesto", como é o caso dos partidos piratas. O resultado do Partido Alemão é, para Maltez, o reflexo de "uma sociedade num ponto de evolução muito mais à frente da sociedade portuguesa, que ainda não atingiu sequer a capacidade de poder entrar numa sociedade pós-direitos de autor". Quando se fala de Portugal, o caso muda, assim, de figura.

"O sistema partidário português foi uma vez abalado por um partido presidencial e a única tentativa de mudança, gorada, foi a do Bloco de Esquerda", considera. "Fora disso, há uma predisposição dominante, provocada pelas subvenções públicas aos partidos, que não permite a chegada de novidades ao sistema português.”

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The Pirate Bay, criado em 2004, é um espaço de partilha de ficheiros que inspira movimentos anti-copyright

Adelino Maltez continua: “De certa maneira, há um partido com algumas semelhanças com esta vaga, a dos Ecologistas e dos Piratas, que será o PAN [Partido pelos Animais e pela Natureza], mas o sistema utiliza uma táctica costumeira de reduzi-los à marginalização pelo ridículo.”

Maltez recorda que o acesso à informação é também uma forma de poder - e esse poder, para já, é restrito

O papão dos "downloads"

Adelino Maltez diz que a luta do Partido Pirata assenta na contestação ao uso dos direitos de autor como bloqueio à criatividade

As reivindicações dos partidos piratas, que a Maltez parecem "justas", relacionam-se com a luta contra “aqueles que, a partir dos direitos de autor, criam blocos que impedem a criatividade”.

O politólogo sublinha a existência de um sistema de castas no universo do acesso à informação e ao conhecimento

“Em Portugal, os chamados artistas e homens de letras não podem ouvir falar de tal coisa, porque não têm capacidade de sobrevivência. A chamada pirataria, nomeadamente as descargas da Internet, são uma espécie de inimigo ou de papão.”

O Robin dos Bosques da Internet

A forma "pirata" tem, explica a linguista Marta Afonso, origem no latim "pirata", que por sua vez deriva do grego "peiratés ", mas terá entrado na língua portuguesa "por empréstimo do italiano". "A palavra aparece pela primeira vez atestada em português num documento do século XVI", refere.

Marta Afonso, do Centro de Linguística da Universidade do Porto, explica que, da "noção de aventureiro dos mares que pilha navios mercantes e povoações costeiras, o termo pirata adquiriu, por extensão semântica, a ideia de indivíduo que se apossa, ilegalmente e pela força, dos bens de outrem". É precisamente este valor que, segundo Marta Afonso, se aplica ao conceito moderno de "pirata informático", reforçado pela "utilização de outros termos marítimos aplicados à informática", como o "navegar".

Na opinião da linguista, o qualificativo "pirata" aplicado aos movimentos políticos europeus apela à ideia "de clandestinidade (clandestino também como ‘resistência’ ao poder instalado)". "A própria mitologia à volta da figura do pirata inspira esse tipo de leitura: o 'pirata' é o 'fora-da-lei bonzinho', na imaginação popular."

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