Tribunal de Justiça da UE contraria fisco português em processo de dedução do IVA

O tribunal europeu considera que o prazo para dedução de IVA de documentos rectificativos de facturas conta da data em que estes são emitidos e não da factura original.

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Sebastião Almeida

O Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) deliberou que o prazo para dedução de IVA de documentos rectificativos de facturas conta da data em que estes são emitidos e não da factura original, contrariando a Autoridade Tributária portuguesa.

De acordo com um acórdão proferido no passado dia 12, e a que a agência Lusa teve acesso nesta segunda-feira, "os artigos 63.°, 167.°, 168.°, 178.° a 180.°, 182.° e 219.° da Directiva IVA, bem como o princípio da neutralidade fiscal, devem ser interpretados no sentido de que se opõem à legislação de um Estado-Membro nos termos da qual [...] o benefício do direito à dedução do IVA é recusado com o fundamento de que o prazo previsto na referida legislação para o exercício deste direito se conta a partir da data de emissão das referidas facturas iniciais e expirou".

Segundo explicou à agência Lusa António Gaspar, associado coordenador da sociedade de advogados TELLES (representante de uma das empresas envolvidas no processo que foi agora objecto do acórdão do TJUE), até esta decisão a Autoridade Tributária Portuguesa não permitia ao adquirente a dedução do IVA de notas de débito ou crédito emitidas mais de quatro anos após a emissão da factura original.

Uma situação que, sustenta, "constituiu um entrave à realização de negócios, ao limitar a duração de qualquer negócio a quatro anos" e "constitui uma violação do princípio comunitário da neutralidade do IVA".

Este entendimento foi agora corroborado pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, numa decisão que, segundo salienta António Gaspar, fará agora jurisprudência para casos futuros, deixando de impor um limite de quatro anos para a emissão de notas de débito ou crédito.

Este acórdão do TJUE veio responder ao pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Supremo Tribunal de Justiça português num processo que opõe duas empresas nacionais — uma de reciclagens, outra de pavimentos — relativamente à liquidação de IVA de um negócio no valor global de 664.538,77 euros.

Segundo se lê no acórdão, esta venda foi feita facturando IVA à taxa reduzida de 5%, mas numa inspecção tributária realizada em 2011, relativa aos exercícios de 2008 a 2010, a administração fiscal portuguesa considerou que devia ter sido aplicada a taxa normal de IVA de 21% e procedeu a liquidações adicionais de IVA de 100.906,50 euros.

A empresa vendedora liquidou este montante e solicitou o respectivo reembolso à empresa compradora, que "recusou pagar este acréscimo de IVA por, nomeadamente, não poder proceder à sua dedução, uma vez que o prazo de quatro anos previsto no artigo 98.°, n.° 2, do CIVA [Código do IVA] tinha expirado [...] e porque não lhe incumbia suportar as consequências de um erro que é apenas da responsabilidade" da vendedora.

Na sequência desta recusa, a vendedora intentou uma acção com o objectivo de obter a condenação da compradora no reembolso do montante que tinha pago, acrescido de juros de mora", sendo que tanto o tribunal de primeira instância como o tribunal de recurso "consideraram que, não obstante existir uma obrigação de repercutir o IVA, o sujeito passivo adquirente dos bens só pode ser obrigado a pagar o referido imposto se as facturas ou documentos equivalentes forem emitidos a tempo de lhe permitir exercer a respectiva dedução".

A empresa vendedora interpôs então recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, que levantou a questão de "saber se os artigos 63.°, 167.°, 168.°, 178.° a 180.° e 182.° da Directiva IVA, bem como o princípio da neutralidade fiscal, se opõem a uma legislação nacional da qual resulte que, em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal, o prazo para o adquirente deduzir o acréscimo de IVA se conta a partir da emissão das facturas iniciais e não da emissão ou da recepção dos documentos rectificativos".

Esta questão foi agora positivamente respondida no acórdão do TJUE, que considera que a legislação nacional contraria, de facto, o que está previsto na directiva comunitária do IVA, assim como o princípio da neutralidade fiscal.

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