Reforma do euro: Norte e Sul divididos, Alemanha ainda sem decisão

Reforma do euro não terá avanços decisivos na cimeira que agora se inicia. Nos últimos meses, as diversas capitais aproveitaram para delinear as suas linhas vermelhas.

Foto
Emanuel Macron e Angela Merkel desempenham papel decisivo na reforma da zona euro LUSA/LUDOVIC MARIN / POOL

Já passaram três dos seis meses definidos em Dezembro pelos líderes europeus para aprovar uma reforma da zona euro, mas para já apenas uma coisa é certa: da cimeira reservada aos países do euro que se irá realizar sexta-feira nenhuma decisão relevante irá ser tomada sobre esta matéria.

Durante este período de três meses, que coincidiu quase inteiramente com o mandato de Mário Centeno como presidente do Eurogrupo, aquilo a que se assistiu não foi, como alguns teriam esperança, a uma convergência de posições entre os diversos governos em questões como a criação de uma capacidade orçamental para a zona euro ou a conclusão da união bancária, mas antes a uma clarificação por diversas capitais sobre qual é o seu lado da barricada nestas discussões. E chegar a um entendimento, nesta fase, parece ainda uma tarefa muito difícil.

A proposta muito ambiciosa do Presidente francês Emanuel Macron – que defende a conclusão da união bancária com mais partilha de riscos, a existência de um ministro das Finanças da zona euro e a criação de uma capacidade orçamental para resposta a situações de crise – marcou o lançamento do debate. A determinado momento, com o acordo de coligação governamental na Alemanha a abrir a porta a algumas destas ideias, criou-se a expectativa que Paris e Berlim iriam conseguir chegar a um entendimento, que acabaria por ser aceite pelos outros países. Mas agora, não há tanto optimismo.

Se a Sul, em países como Portugal, a proposta francesa é vista com bons olhos (tentando-se ainda que o orçamento da zona euro sirva também para apoiar a convergência dos países mais pobres), a Norte assistiu-se a uma união de forças entre aqueles para quem qualquer passo em frente na partilha de riscos só pode ser dado depois de cada um dos países ter resolvido por si os problemas que têm na economia e no sistema bancário.

Holanda, Estónia, Finlândia, Irlanda, Letónia, Lituânia, Dinamarca e Suécia emitiram um comunicado conjunto em que defenderam que, em vez de orçamentos conjuntos, aquilo que a zona euro precisa para ser mais forte é de “acções decisivas a nível nacional e um cumprimento total com as regras comuns”. E em relação à união bancária, embora mostrando-se favoráveis à sua finalização, salientaram que tal apenas pode acontecer se entretanto os países com sistemas financeiros mais frágeis (como a Itália e Portugal) tiverem reduzido os seus riscos.

Estas são preocupações expressas muitas vezes na Alemanha. E, entre os apoiantes das propostas de Macron, teme-se que a incerteza política que se vive actualmente em Itália, faça com que Berlim seja ainda mais prudente nestas matérias, alinhando com os seus parceiros do Norte.

Maria João Rodrigues, deputada do parlamento europeu que já assistiu e participou em diversas negociações europeias reconhece que “o risco de estarmos perante outra oportunidade perdida para renovar a zona euro existe”, traçando um paralelo com a situação vivida em 2014, em que, com a crise do euro muito fresca mas umas eleições europeias à porta, os líderes europeus optaram por não avançar para mudanças significativas na zona euro.

Ainda assim, a deputada dá alguns motivos para se estar agora mais optimista em relação à possibilidade de se avançar para uma reforma: “Um Presidente francês mais ofensivo, Angela Merkel numa coligação em que o acordo sobre as questões europeias vai mais longe, a realização de uma cimeira do euro em formato mais restrito e um presidente do eurogrupo que percebe melhor a necessidade de uma reforma da zona euro”.

“A questão fulcral é saber se a Alemanha vai ficar enredada nesse clube mais nórdico como nos últimos anos ou se vai decidir juntar-se mais a Paris”, afirma a deputada.

Na agenda definida pelo presidente do conselho, Donald Tusk, para esta cimeira, assinala-se que, ao nível da reforma do euro, a prioridade deve ser dada à finalização da união bancária e às mudanças no Mecanismo de Estabilidade Europeu, mas pede-se que se debatam também a criação de uma capacidade orçamental na zona euro e a forma de melhorar as políticas económicas definidas pelos países. Não haverá conclusões escritas sobre estas matérias. É verdade que, nunca foi objectivo declarado desta cimeira chegar a um acordo, mas a três meses da cimeira de Junho, que foi declarada como decisiva, o tempo para um entendimento pode começar a escassear.

Sugerir correcção
Ler 3 comentários