Um vinho sentimental e da velha Bairrada

Regateiro Vinha d’Anita 2015 é um vinho dedicado à mãe de Casimiro Gomes, um dos fundadores da Dão Sul.

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Ana Ganhoto e Casimiro Gomes DR

Casimiro Gomes, um dos fundadores da Dão Sul, actual Global Wines, é uma espécie de Marcelo Rebelo de Sousa dos vinhos. Não pelos beijos e abraços que dá, mas por dormir pouco e mostrar uma energia no trabalho que os colaboradores mais novos têm dificuldade em acompanhar. Depois de sair da antiga Dão Sul, criou, juntamente com um grupo de antigos colaboradores, a Lusovini, uma distribuidora também com marcas próprias, e, em menos de dez anos, ergueu uma empresa que já se estendeu a Angola, Moçambique, Brasil e Estados Unidos e que se aproxima a passos largos da dimensão da Global Wines.

Das muitas marcas que a Lusovini comercializa, há uma que tem um significado especial para Casimiro Gomes. Chama-se Regateiro e é o seu projecto pessoal na Bairrada, pensado para homenagear a família. Regateiro era o sobrenome do avô, um industrial que também esteve ligado ao mundo do vinho. O primeiro Regateiro (Baga e Touriga Nacional) foi da colheita de 2009, ainda o pai era vivo.

Recentemente, Casimiro Gomes juntou os familiares mais próximos no restaurante Casa Vidal, em Aguada de Cima, Águeda, para apresentar um novo vinho, o Regateiro Vinha D’Anita 2015, desta vez dedicado à mãe, Ana Ganhoto (ainda viva), que, segundo o filho, “sempre preferiu os tintos, bebendo-os para acompanhar os pratos típicos da Bairrada como a chanfana, o arroz de galinha velha e o leitão”. Dado a provar às cegas a um bairradino, a sua resposta foi: “Faz-me lembrar um vinho da Bairrada de antigamente.” E é mesmo. É um Baga muito tributário da velha Bairrada, do tempo em que os vinhos se faziam para se beber. Vinhos muito frescos e com álcool baixo.

Este Vinha d’Anita tem apenas 12,5% graus. Por opção própria e não porque o ano tenha sido difícil. Pelo contrário, 2015 foi um ano excelente para a Baga, uma casta que, se não amadurecer bem, tende a originar vinhos muito rústicos. Mas, na Bairrada, madureza não implica, necessariamente, álcool alto. Uma boa desfolha na fase da maturação pode ser suficiente para conseguir o equilíbrio certo.

Parece ter sido o caso, porque o vinho, sendo muito contido de álcool, não tem nada de verde ou de amargo; e, apesar da sua juventude, apresenta uma civilidade tânica surpreendente. Tem tanino, claro, mas tanino bom, sólido e afilado que dá raça, amplitude e vigor ao vinho. Os receios de Casimiro Gomes, de que o vinho pode estar ainda um pouco duro, não se justificam. Quem gosta dos Bairrada clássicos, mais extraídos e potentes, pode até achar o vinho demasiado elegante. Mas este é um estilo com cada vez mais apreciadores e que se assemelha muito a vinhos como o Aliás, de João Soares e Nuno do Ó, ou o Vadio, de Luís Patrão. Tintos gastronómicos, muito cá da terra, como diria se fosse bairradino, e que nos deixam a salivar. 

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