O ódio ao professor Passos Coelho

Não há qualquer espanto nisto. As faculdades de ciências sociais viraram muito à esquerda.

Louvo a paciência a tanta gente estimável que saiu em defesa de Pedro Passos Coelho com argumentos razoáveis e académicos, procurando demonstrar como é importante que políticos com a sua experiência voltem à universidade para transmitir aos outros aquilo que aprenderam à frente do país. Não será óbvio – argumentam as estimáveis pessoas – que um primeiro-ministro que governou na era da troika tem muito a ensinar a alunos de mestrado e doutoramento em Administração Pública? Claro que é óbvio. Claro que é óptimo para a universidade portuguesa que Passos opte por dar aulas em vez de ir para a Goldman Sachs. E claro que isso não interessa nada a quem se opõe à sua contratação.

Apesar de eu valorizar a honestidade intelectual dos que defendem Passos Coelho e concordar com os seus argumentos, temo bem que eles sejam inúteis perante aquilo que verdadeiramente está em causa. A polémica nada tem a ver com questões académicas. Ela tem tudo a ver com questões ideológicas. Os professores universitários, e seus simpatizantes, que se têm oposto ao ingresso do antigo primeiro-ministro no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP) fazem-no por uma razão muito simples: todos eles, sem excepção, odeiam aquilo que Passos representa politicamente. O problema deles não é com o professor Passos Coelho. É mesmo com o político Passos Coelho.

Eles até podem não usar esse argumento – mas é a motivação que os leva a usar outros argumentos. No início da polémica está um post no Facebook de Rui Bebiano, professor em Coimbra, investigador no inevitável CES e colaborador regular do Esquerda.net. Bebiano admite em abstracto que um não-académico possa ocupar um lugar de destaque na academia, mas a Passos Coelho falta, logo por azar, “formação”, “mérito” e “reconhecimento”, pelo que a sua contratação não passa de “nepotismo” (isto porque o convite terá partido de Manuel Meirinho, actual presidente do ISCSP e deputado do PSD entre 2011 e 2015). Raquel Varela, outra professora conhecida pelo seu amor à direita liberal, teve a vantagem de ser mais clara: “[Passos Coelho] acaba a dar aulas numa universidade pública, paga por nós, onde vai ensinar a outros como continuar a destruir serviços públicos.” Isto, sim, é um resumo evoluído daquilo que aconteceu em Portugal entre 2011 e 2015.

Não há qualquer espanto nisto. As faculdades de ciências sociais viraram muito à esquerda, e o ressentimento de professores e alunos, em vez de se dirigir àqueles que transformaram a universidade num coio de amiguismo e endogamia, apontou antes para o famoso “neoliberalismo português”, o peluche político da esquerda nacional, que ocupa um lugar bonito ao lado das fadas e dos unicórnios. Não admira que surjam abaixo-assinados de alunos, e que outros declarem (Sérgio Lavos, candidato do Livre, no Twitter): “Se a maioria dos alunos do ISCSP decidir que não quer Passos como professor, a direcção do instituto só tem de acatar a decisão.”

As grandoladas, como se vê, continuam, e a pergunta que importa fazer é esta: de onde vem tanto ódio a Passos Coelho? É um corrupto? Afundou o país? Impôs sacrifícios inúteis? Falhou a saída limpa? Tentou controlar a justiça? Silenciou a comunicação social? Não, ele não fez nada disso. Mas fez pior: refreou o Estado gargantuesco e propôs mais liberdade aos cidadãos. Tudo ideias tão perigosas para certa esquerda que a simples visão de Passos a ensinar numa universidade pública é mais do que aquilo que conseguem suportar.

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