“Não estou disponível para qualquer cargo dentro do partido”

António Capucho, 73 anos. O ex-autarca, ex-deputado, ex-ministro e ex-secretário-geral do PSD diz que a sua carreira política terminou, a bem, no poder local. Não quer mais cargos públicos nem partidários.

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Nuno Ferreira Santos
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Passou pelo Governo, pela Assembleia da República, pelo Parlamento Europeu e pelas autarquias. Foi quase tudo o que havia para ser no PSD, de secretário-geral a presidente da bancada. Só nunca foi líder, mas trabalhou com vários, desde Sá Carneiro. Há cinco anos, viu a sua militância no PSD suspensa por um acórdão que afastou outros 80 militantes de Sintra. Agora, quer regressar, mantendo a antiguidade e o cartão com o número 326. É só isso que quer. Voltar à política activa, com cargos executivos, está fora de questão.

Esteve cinco anos afastado do PSD. O que é que isso lhe ensinou?
Pude apreciar a política de palanque, com maior independência, mas ao mesmo tempo mantive uma ligação à política local, em Cascais e em Sintra. Deu-me abertura de espírito e independência.

O seu olhar em relação aos partidos mudou alguma coisa?
Os partidos estão anquilosados e afastados das bases - não estou a referir-me aos partidos da esquerda radical, PCP e BE, porque esses têm uma tradição e maior necessidade de estarem junto das bases. As sedes estão desertas, já não são pontos de confluência, quando há reuniões é em hotéis e há muito poucas.

As candidaturas independentes recuperaram um pouco essa ligação ao eleitorado?
Embora grande parte delas resulte de dissidências internas inexplicáveis, no sentido em que os partidos cometeram erros crassos, não há dúvida de que as candidaturas independentes trouxeram maior participação, maior activismo e maior interesse por parte dos eleitores e já representam uma fatia interessante.

Está num processo de regresso ao PSD. Teria regressado com Passos Coelho?
Não. Eu disse que regressaria apenas se o partido desse sinais de se poder democratizar internamente e de se aproximar ou reaproximar da matriz social-democrata. Sobre a primeira, a experiência que Rui Rio já demonstrou penso que será decisiva para acabar com certos métodos que existem nalguns partidos democráticos, incluindo no PSD, e que são de repudiar liminarmente. Mas também tem de fazer a aproximação às bases. Não estando no Parlamento, Rio vai ter de desenvolver esse trabalho muito importante durante um ano e meio. E depois há a aproximação à matriz social-democrata do PSD, que faz parte do seu ser. Conheci-o bem quando presidi ao grupo parlamentar.

O Governo de Passos Coelho costumava dizer que ia ficar na História. Concorda?
Sim, nos dois sentidos. Ele tem o mérito de ter conseguido com muita dificuldade aguentar-se durante quatro anos, herdando uma situação calamitosa, enfrentando dificuldades internas assinaláveis, nomeadamente aquela birra de Paulo Portas, em que ele teve uma atitude corajosa, enfrentando-o. Mas depois, de facto, exagerou com a adopção de medidas excessivas. Foi mais troikista do que a troika.

Chegou a falar-se no seu nome para presidente da Assembleia da República, em 2011, depois de ter saído da câmara. Alguma vez foi convidado para isso?
Nunca. Isso são os meus adversários que dizem que fiz uma birra. Quando Passos indigitou Fernando Nobre para presidente da Assembleia da República (PAR) eu disse-lhe: “Nesse caso, eu não sou candidato a deputado. Isso [indigitar o presidente da Assembleia] é uma competência do Parlamento, não é sua”.

Como assim?
Ele telefonou-me da Madeira a dizer: “António Capucho, você é cabeça de lista a Lisboa. Não se importa de ir para outro distrito, já que eu gostava que o Nobre fosse cabeça de lista a Lisboa?” Eu respondi que não me importava. Isto passou-se à hora do almoço. À tarde cheguei a casa, liguei a televisão e ouvi Passos dizer que Nobre foi convidado para deputado, cabeça de lista a Lisboa, e para candidato à presidência da Assembleia da República. Telefonei-lhe e disse: “Já não sou candidato a deputado, passe bem. Porque acho que isto está a começar mal.”

Queria ser presidente?
Não. Eu nem sabia se alguns ex-primeiros-ministros iriam ser candidatos a deputados e, se fossem, teriam precedência sobre mim. Por acaso, depois, até poderia ter hipótese de ser candidato, em termos de hierarquização dos deputados, mas eu não sabia, entre mim ou o Mota Amaral, por exemplo, qual dos dois teria o apoio do grupo parlamentar. Portanto, a minha candidatura era uma hipótese muito remota.

O PSD tem vindo a perder intenções de voto. Para si, o que justifica isso?
Os portugueses fartaram-se daquela conversa do PSD e de Passos a dizer “eu é que ganhei, eu é que devia estar ali”. A oposição que ele fez foi absolutamente fracassada, como a generalidade dos observadores políticos reconhece.

A aproximação Rio-Costa é “preocupante para a 'geringonça'”, como diz Jerónimo?
Claro que é. Está à vista.

O PSD quer ganhar as eleições?
Claro que quer. Quem não quer é a oposição interna. Mas no quadro actual, só é possível ficar em primeiro em coligação com o CDS. 

A coligação com o CDS não prejudicaria eleitoralmente o PSD? 
Não. Mantenho a opinião desde 1979, embora o mundo e o país tenham mudado muito. Na altura tivemos de explicar aos militantes e aos eleitores que uma aliança com o CDS pode fazer perder alguns eleitores à esquerda do centro, mas faz ganhar um número mais significativo de eleitores vindos da abstenção e do centro do espectro político. O CDS tem uma direcção estável e é um parceiro fiável, não tenho nenhum problema numa coligação. Nas eleições europeias, até para aferirem a sua representatividade, não há drama nenhum que possam apresentar-se separadamente. 

Nesse caso Rio devia estar a dialogar com o PS ou com o CDS?
Deve dialogar com os dois, mas a matéria do diálogo neste momento é com o Governo e indirectamente com o PS. É urgente. Podia primeiro ter tido uma conversa ou um almoço com Assunção Cristas, mas não acho isso relevante, não sei mesmo se não foi um sinal que ele quis dar: “Calma, primeiro estão os interesses do país, que passam pelo acordo que estamos a pretender celebrar em duas áreas fundamentais.”

Disse que estão a fazer a cama a Rio. Quem? Para quê? 
Não quero ser acusado de estar a fazer um processo de intenções, mas basta olhar para a realidade política para vermos que há alguns elementos da oposição a Rui Rio - e não me refiro aos elementos mais próximos de Pedro Santana Lopes, mas àqueles que estão no Parlamento enquistados – que parecem estar a apostar no quanto pior melhor. Ao porem a fasquia acima do recorde do mundo para o líder parlamentar poder sair-se bem no frente-a-frente com o primeiro-ministro parece que queriam que ele se espalhasse. Para quê? Não apresentaram nem candidatura ao grupo parlamentar nem contra o Rui Rio. Apoiaram Santana Lopes. Como sabem que é difícil bater o António Costa daqui a um ano e meio, seguem a estratégia de deixar o Rui Rio ir arrefecendo para mais tarde assumirem o poder dentro do partido e quatro anos depois tentarem reassumir o Governo.

O que pode Rio fazer para o evitar?
Pode fazer oposição, é o que ele pode fazer. E organizar o partido e tentar convencer os eleitores.

Está disposto a colaborar com Rui Rio, se ele lhe pedir algum contributo? 
Esporadicamente e pontualmente, claro que sim. Não tenho nenhuma apetência nem estou disponível para qualquer cargo dentro do partido, seja a que nível for, no Estado ou no Governo, se ele vier a ser primeiro-ministro. Não estou disponível. 

Porquê?
Porque não estou, por razões pessoais, porque tenho 73 anos, porque tenho netos, porque não me apetece ir a Lisboa. Já dei para aqueles peditórios todos e acho que estou numa fase diferente da minha vida. Não estou nada para aí virado. Nem sequer no Estado.

E no partido?
Não. Cargos no partido não aceito. Se vier a ser eleito daqui a dois anos para o conselho nacional, não me importo, mas isso não tem qualquer relevância. Cargos executivos no partido, no Estado, na Administração Pública, não.

“Não gosto de uma oposição trauliteira”

António Capucho faz um parênteses na entrevista (que é muito mais importante do que um parênteses) para considerar que a votação na bancada do PSD, nomeadamente a existência de votos nulos, foi “miserável”. “Não tem outro nome, porque voto certo era a abstenção”, assume.

Regionais na Madeira, Europeias… É obrigatório ganhar?
Não. Nem é obrigatório ganhar as próximas legislativas. É desejável, e é para isso que estamos a lutar. Nas eleições europeias, e nomeadamente se formos separados, não há drama nenhum. O que é preciso é ter um bom resultado, o que assentará muito na qualidade dos candidatos... que eu não serei, mas que o PSD tem.

Santana Lopes seria um bom cabeça de lista?
Em termos de imagem pública, sim. Em termos de dossiers europeus, ele está muito afastado dessa área. Mas não enjeito essa hipótese. Não seria inédito.

O PSD deve apoiar Marcelo nas próximas presidenciais?
É uma pergunta engraçada porque que alternativa tem? Não tem alternativa, obviamente. Ele vai continuar em alta e é alguém que é muito querido, não apenas nos militantes, mas também no resto do eleitorado. O português anónimo, em geral, adora o estilo de Marcelo. Neste momento, só se ele não quiser...

Onde vê o PSD em 2020? No Governo? 
Desejavelmente, mas não é obrigatório.

E se estiver na oposição, quem vê na liderança?
Rui Rio, a não ser que ele tenha um resultado calamitoso, mas não há razão para isso. É completamente diferente o Benfica ir à Suíça perder com um clube secundário por 5-0 ou perder em casa, com o Manchester City, por 0-1 e fazer uma boa exibição.

Da nova geração, que agora optou por fazer um compasso de espera de dois anos, quem acha que pode chegar à liderança do partido?
Desta nova geração, da linha mais à direita dentro do partido, pela experiência e pela capacidade política revelada, evidentemente que o Luís Montenegro é uma peça-chave. Na linha mais social-democrata, se assim se pode dizer sem menosprezo para os demais, veremos quem é que aparece.

Não vê ninguém?
Há vários, mas não quero...

É a linha que lhe é mas cara...
Se escrever que eu apoio alguém para a sucessão de Rui Rio, vão pressupor que eu quero que ele seja substituído e que estou a indigitar um delfim, que não quero.

Que conselho daria a Fernando Negrão para esta fase que se avizinha?
Não vou dar conselhos, mas ele disse uma coisa que me agradou. Vai mudar o estilo, ou seja, vai ter um estilo muito mais urbano, fazendo uma oposição rigorosa, construtiva, sem ser trauliteiro, porque ele não é.

Está a falar de Hugo Soares ou de Luís Montenegro?
Não estou a falar de Luís Montenegro. Estou a dizer que não gosto de uma oposição trauliteira.

Como a de Hugo Soares? 
Sim, é evidente. Hugo Soares exagerou, embora julgue que tem capacidade e que, se enterrar o machado de guerra, é um deputado com qualidade. À medida que nos vamos afastando do congresso e do momento em que alguns manifestaram o seu enfado através daquele voto miserável - não tem outro nome, porque voto certo era a abstenção ou então apresentavam um candidato, voto nulo é vergonhoso -, mas à medida que nos afastamos do congresso e nos aproximamos de eleições, passa a haver um maior cimento, uma maior tendência para a unidade.

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