Em dois anos, medicamento à base de cannabis só foi prescrito 21 vezes

Produto está autorizado desde 2012 e é indicado para aliviar sintomas em doentes com esclerose múltipla.

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Infarmed desconhece limitações no acesso ao medicamento RUI FARINHA

Entre 2016 e 2017, o Centro Hospitalar Lisboa Central dispensou 21 unidades de Sativex, o único medicamento até agora autorizado em Portugal contendo extracto de cannabis — a Comissão Parlamentar de Saúde está actualmente a avaliar projectos de lei sobre legalização da planta de cannabis para fins medicinais.

O produto está autorizado desde 2012 e o seu uso está indicado para a melhoria de sintomas de espasmos e rigidez muscular em doentes com esclerose múltipla.

A informação consta de uma resposta do Ministério da Saúde enviada ao PCP, na sequência de perguntas colocadas sobre o uso terapêutico da cannabis em Portugal. De acordo com o Infarmed, autoridade nacional do medicamento que o ministério consultou para dar as respostas, “em meio ambulatório não existe qualquer registo de dispensa deste medicamento”. E em meio hospitalar, o único que existe diz respeito ao pedido feito pelo Centro Hospitalar Lisboa Central, que inclui o Hospital São José e mais cinco unidades.

Neste caso, existe reporte de consumo em 2016 e 2017, “num total de 21 unidades”. O medicamento exige uma receita médica especial, não é comparticipado e tem um custo a rondar os 500 euros.

O Infarmed diz ainda que “não tem conhecimento de qualquer situação de impedimento ou condicionamento no acesso ao referido medicamento”.

O Sativex está indicado como tratamento para a melhoria de sintomas de espasticidade moderada a grave em doentes com esclerose múltipla, que não responderam a outra medicação e que tenham mostrado uma “melhoria clinicamente significativa dos sintomas durante um ensaio inicial da terapêutica”, explica o Infarmed na resposta dada ao PCP.

De acordo com o folheto informativo, o doente tem de fazer um ensaio de quatro semanas durante Em dois anos, medicamento à base de cannabis só foi prescrito 21 vezes o qual o médico avalia se este pode continuar a fazer a medicação. O seu uso está contra-indicado em doentes que tenham alergia aos extractos de cannabis e também a quem tenha familiares directos com problemas de saúde mental, como esquizofrenia ou psicoses. É usado na fórmula de vaporizador oral.

Sem ensaios clínicos

O partido questionou ainda a existência de ensaios clínicos em Portugal e novos estudos sobre o uso terapêutico da cannabis. O Infarmed nunca recebeu pedidos de autorização para ensaios no país de medicamentos derivados da cannabis e indicou, citando informação da Agência Europeia do Medicamento, que existem estudos em curso para a esclerose, fibrose quística e para algumas doenças raras como a síndrome de Dravet (uma forma grave de epilepsia).

As questões foram colocadas pelo PCP — que apresentou entretanto um projecto de resolução a recomendar ao Governo que pondere a utilização mais adequada de cannabis no Serviço Nacional de Saúde — no final do ano passado, quando se reiniciou a discussão sobre a legalização do uso da planta de cannabis para fins medicinais.

Bloco de Esquerda e PAN apresentaram projectos de lei para a legalização da cannabis para fins medicinais, propostas que baixaram à Comissão Parlamentar de Saúde sem votação em plenário e que estão a ser discutidas neste momento num grupo criado para o efeito.

A Ordem dos Médicos já tinha emitido um parecer em que se mostrava favorável ao uso para fins medicinais, nunca na forma fumada e apenas em algumas doenças em que há maior evidência científica sobre os benefícios do seu uso.

Já a Ordem dos Farmacêuticos opõe-se à iniciativa, considerando que “não existe evidência científica que comprove a eficácia e segurança” do uso da planta.

Na quarta-feira, o GAT— Grupo de Activistas em Tratamentos defendeu o uso da planta da cannabis e os seus derivados para fins terapêuticos e pediu aos deputados uma discussão alargada sobre a legalização do consumo.

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