Finanças detectam dívida da Administração Regional de Saúde de Lisboa subavaliada em 183 milhões de euros

A Inspecção-Geral de Finanças detectou irregularidades nas contas de 2016 apresentadas pelas administrações regionais de saúde do Norte, Centro e Lisboa e Vale do Tejo. Esta última era na altura presidida pela actual secretária de Estado da Saúde, Rosa Matos.

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A análise é feita às contas de 2016 quando a agora secretária de Estado da Saúde, Rosa Matos, era presidente da ARS de Lisboa e Vale do Tejo Daniel Rocha

Segundo a Inspecção-Geral de Finanças (IGF), as contas de três das cinco administrações regionais de saúde (ARS) — Lisboa e Vale do Tejo, Norte e Centro — relativas ao exercício de 2016 apresentavam irregularidades. Houve casos de subavaliação de dívidas a terceiros e, noutra situação, falta de informação sobre valores a pagar e a receber, lê-se nas sínteses das auditorias ontem publicadas.

No caso da ARS de Lisboa e Vale do Tejo, a IGF detectou uma dívida a terceiros subavaliada em 183 milhões de euros. “Apesar de o valor estar suportado documentalmente em facturas ou documentos equivalentes, foi registado indevidamente como acréscimo de custos e, consequentemente, omitido nos reportes de dívida efectuados à Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS) e à Direcção-Geral do Orçamento (DGO)”, conclui a inspecção.

A análise é feita às contas de 2016 quando a agora secretária de Estado da Saúde, Rosa Matos, era presidente na ARS de Lisboa e Vale do Tejo, cargo que tinha assumido no final de Janeiro daquele ano. Rosa Matos remeteu para a ARS de Lisboa e Vale do Tejo quaisquer esclarecimentos sobre os resultados da auditoria.

A ARS contesta a crítica, referindo que informou a IGF de que “os montantes contabilizados em acréscimos de custos resultam, na sua maioria, de facturação dos dois últimos meses de 2016, que ainda não se encontra recebida e/ou validada a 31/12/2016”. Por esta razão, “o seu registo orçamental é efectuado correctamente” em 2017, “que corresponde ao ano em que a facturação vai ser paga”.

A IGF acrescenta que o reporte de 2016 “evidenciava diferenças materialmente relevantes (39 milhões de euros de custos e 37 milhões de euros de proveitos) face aos valores constantes dos documentos de prestação de contas finais”, destacando a subvalorização dos saldos das contas de custos, de proveitos e de acréscimos de custos, “em resultado da não-relevação dos custos com parcerias público-privadas e outros fornecimentos e serviços externos”.

A ARS não concorda com a conclusão. “Não se podem comparar diferentes períodos contabilísticos”, diz, referindo que “cumpriu e cumpre os normativos legais ao nível da prestação de contas”.

A inspecção considerou ainda haver indícios de “gestão pouco eficiente” de stocks de materiais de consumo administrativo e clínico. O que a levou a recomendar a definição de mecanismos de reavaliação dos parâmetros de gestão dos mesmos.

Vacinas por “empréstimo”

A ARS adianta ter implementado no final de 2016 um projecto de armazéns avançados, com a criação de 413 armazéns que permitem uma gestão mais adequada dos stocks.

Também nas contas de 2016 da ARS Norte houve “subavaliação dos custos (35 milhões de euros), dos proveitos (28 milhões de euros) e das existências (2 milhões de euros), bem como das dívidas a terceiros (9 milhões de euros)”.

A IGF destaca o recurso a “operações atípicas de aquisição de vacinas, denominadas de ‘empréstimos’ junto dos fornecedores”. Além de não terem sido cumpridos os aspectos formais da contratação pública, as aquisições foram incorrectamente contabilizadas, “introduzindo distorções relevantes nas demonstrações financeiras, situação entretanto regularizada”.

Foi recomendado à ARS Norte — o presidente Pimenta Marinho assumiu o cargo em Fevereiro de 2016 — que assegurasse que, quando é preciso fazer uma aquisição imediata de bens antes da conclusão da compra centralizada, “a mesma seja precedida de procedimento contratual previsto no Código dos Contratos Públicos”.

Diz ainda que a entidade deve criar mecanismos de gestão de stocks e promover adopção de “procedimentos contabilísticos que assegurem o cumprimento dos referenciais em vigor”.

“Estamos a cumprir com as recomendações sugeridas, tal como é nossa obrigação”, respondeu a ARS Norte ao PÚBLICO.

Na auditoria da ARS Centro, a IGF encontrou uma “subavaliação dos custos (2 milhões de euros), dos proveitos (10 milhões de euros) e das existências (2 milhões de euros)” e uma “sobrevalorização das dívidas a terceiros (14,8 milhões de euros)”.

Refere ainda que o sistema de informação contabilístico não é fiável, com diferença entre saldos e sem “informação validada que permita conhecer os montantes em dívida e a receber”. Acrescenta que faltam procedimentos regulares de confirmação de saldos de terceiros, levando ao desconhecimento dos exactos valores em dívida e a receber.

O PÚBLICO fez um pedido de comentário ao resultado da auditoria, mas não obteve resposta da ARS Centro.

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