Acordo sobre contribuições para o orçamento europeu está distante

Países do Norte não querem pagar mais para preencher a perda de receitas do "Brexit", os do Sul insistem em manter os montantes da agricultura e coesão.

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António Costa em Bruxelas com Alexis Tsipras, o primeiro-ministro grego JULIEN WARNAND/EPA

As palavras de circunstância na cimeira informal de chefes de Estado e Governo dos países da União Europeia desta sexta-feira em Bruxelas sobre o “excelente ambiente de trabalho” não disfarçaram as dificuldades dos líderes dos 27 em chegaram a consenso sobre as formas de garantir o financiamento do próximo quadro plurianual 2021-27, depois da perda das verbas provenientes do Reino Unido com o “Brexit”.

A Comissão Europeia pressiona os dirigentes nacionais a entenderem-se para evitar a incerteza e instabilidade na vida dos cidadãos e dos agentes económicos, e o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, alerta que é crucial conhecer o rascunho de orçamento antes das eleições europeias de Maio de 2019. Mas ficou claro que a mensagem de que o tempo urge não foi escutada por todos os líderes.

“É muito importante que haja um grande esforço para que tudo se resolva nesta legislatura, porque um problema difícil não fica mais fácil se for adiada a sua solução”, afirmou António Costa, contrariando a visão dos líderes mais liberais (como o Presidente francês, Emmanuel Macron), que querem que seja o próximo Parlamento Europeu (PE) a decidir sobre o quadro financeiro plurianual 2021-27.

Segundo o primeiro-ministro português, o adiamento da decisão para depois de Maio de 2019 “contaminaria o debate das eleições europeias” com as questões orçamentais. Pelo contrário, explicou, uma clarificação daria a cada Estado-membro a possibilidade de “planear com calma e profundidade o melhor aproveitamento dos fundos comunitários”.

O primeiro-ministro português apresentou-se em Bruxelas do lado dos defensores do aumento das contribuições nacionais para o orçamento comunitário. A ideia é que os países aceitem subir o actual tecto de 1% do Rendimento Nacional Bruto, para 1,2% ou até 1,3%, como pretendem os eurodeputados, complementado com a adopção de “novas taxas alinhadas com políticas da UE” — caso das transacções financeiras, da poluição dos plásticos ou ainda das actividades comerciais das multinacionais do digital, que António Costa está disposto a aplicar.

Evitar cortes na PAC e coesão

Para Portugal, como para outros países do Sul e do Leste que compõem o grupo dos beneficiários líquidos do orçamento, é fundamental que pelo menos se mantenha o actual envelope financeiro. Querem evitar que a expansão das responsabilidades da Comissão com a defesa e segurança se faça à custa de cortes nos programas da Política Agrícola Comum (PAC) e na política de  Coesão.

“São políticas que fazem parte da identidade da UE”, notou Costa, que associou a PAC à segurança alimentar e ao combate às alterações climáticas, e insistiu no papel da Política de Coesão na diminuição das assimetrias. “É muito importante que essas políticas se mantenham, e ao mesmo tempo sejamos capazes de responder as novos desafios”, afirmou.

Esse não é, contudo, o entendimento de países como a Áustria, Dinamarca, Holanda, Finlândia ou Suécia, que são contra a ideia de pagar mais. O líder luxemburguês, Xavier Bettel, avisou que “se for preciso pagar mais, também será preciso rever algumas das despesas”. Charles Michel, da Bélgica, disse que ainda era cedo para se pronunciar sobre o orçamento. “Não é apenas uma questão de números, temos de pensar no que queremos fazer”, disse.

Já o primeiro-ministro holandês, Mark Rutte, admitiu pela primeira vez  uma redução do orçamento comunitário. “Não podemos ignorar que o Reino Unido vai deixar a UE, portanto temos que trabalhar com um orçamento diminuído”, vincou.

O presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, tinha admitido que a discussão seria difícil. “Os orçamentos são sempre complicados”, observou.

Não ao Spitzenkandidaten

Uma discussão que não correu como Juncker gostaria teve a ver com o processo de selecção do seu sucessor no cargo. O presidente da Comissão está alinhado com o PE na defesa do sistema dos Spitzenkandidaten, ou seja, cabeças de lista indicados pelas diferentes famílias políticas antes das eleições. Os eurodeputados e Juncker só vêem virtudes democráticas e de transparência na manutenção do sistema, usado pela primeira vez na sua eleição.

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Emmanuel Macron com Jean-Claude Juncker: divergem quanto à forma de escolha do próximo presidente da Comissão Yves Herman/REUTERS

Mas os líderes querem conservar a  prerrogativa de nomeação do líder do executivo europeu. Nessa questão, Costa e Macron estão do mesmo lado. “É um poder do Conselho escolher o candidato a presidente da Comissão, obviamente tendo em conta os resultados e a posição do PE”, sublinhou o primeiro-ministro. “Os partidos europeus são livres de designarem candidatos à Comissão”, observou, dizendo que no final, a escolha dos líderes pode ir noutro sentido. “Pode ser ou não [um dos spitzenkandidaten], isso depende muito dos resultados. Da última vez foi possível, mas pode não acontecer desta vez.”

Certo é que Costa não vislumbra que surja um candidato a presidente da Comissão apoiado por uma “geringonça” no PE. “Toda a União Europeia é muito mais sofisticada do que a geringonça”, comparou.

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