Portugal está no "pelotão da frente" nas taxas de sobrevivência a cancros

Sobrevivência ao fim de cinco anos do diagnóstico melhorou na maior parte dos tumores malignos, mas piorou ligeiramente nos cancros do cólon, recto e estômago

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rui Gaudencio

As taxas de sobrevivência à maior parte dos cancros estão a aumentar em Portugal. Nos tipos de tumores malignos mais frequentes, mama e próstata, Portugal apresenta mesmo percentagens de sobrevivência (ao fim de cinco anos após o diagnóstico) que o colocam no grupo dos países europeus com melhores resultados. Mas se a tendência geral nos casos diagnosticados entre 2010 e 2014 foi de melhoria, nos cancros do cólon, do recto e do estômago a situação piorou ligeiramente face ao quinquénio anterior.

Incluídos no último retrato da situação a nível mundial traçado no Concord-3, um vasto estudo do Global Survival Cancer publicado esta semana na revista Lancet (e que compara registos de 37,5 milhões de doentes diagnosticados com tumores entre 2000 e 2014 em 71 países), estes resultados deixam o director do Programa Nacional para as Doenças Oncológicas, Nuno Miranda, satisfeito mas não descansado. “São dados que já conhecíamos. Estamos no pelotão da frente, no núcleo de países com maiores taxas de sobrevivência, mas isto não é motivo para adormecermos à sombra da bananeira. A mortalidade no cancro colo-rectal é um pouco maior do que gostaríamos”, admite.

Para este estudo coordenado por uma equipa da London School of Hygiene & Tropical Medicine foram considerados quase 387 mil doentes portugueses inscritos em quatro registos oncológicos (Norte, Centro, Sul e Açores). Os dados indicam que nos cancros do cólon e do recto e também do estômago as taxas de sobrevivência diminuíram um pouco no período compreendido entre 2010-14 face ao quinquénio anterior (2005-09). No cólon passou-se de uma sobrevivência de 60,9% no período entre 2005 e 2009 para 60,3% entre 2010-14. Nos tumores do recto a taxa baixou também ligeiramente e o mesmo aconteceu no caso do cancro de estômago (de 32,4 para 32,2%).

De resto, a situação melhorou nos cancros de mama (no último quinquénio considerado 87,6% das doentes estavam vivas cinco anos após o diagnóstico), da próstata (90,9%), do pulmão (15,7%), do fígado (18,7%), do pâncreas (10,7%) e do melanoma (83,7%).

Nuno Miranda admite estar particularmente preocupado com o cancro que mais mata em Portugal, o do pulmão, em que cerca de 90% dos casos “seriam evitáveis, uma vez que estão associados ao tabaco”. Quanto ao cancro de mama, numa altura em que surgem cerca de seis mil novos casos por ano, a situação está cada vez melhor, mas ainda há cerca de 1600 mortes por ano, enfatiza.

Grandes assimetrias

O que este estudo internacional permite perceber é que são grandes as assimetrias entre os países. Para a maior parte dos 18 cancros ou grupo de cancros considerados, as mais elevadas taxas de sobrevivência continuam a observar-se nos Estados Unidos, Canadá, Austrália, Nova Zelândia, Finlândia, Islândia, Noruega e Suécia, sublinham os cordenadores da investigação. O fosso entre os vários países é evidente: no cancro de mama, exemplificam, se na Austrália e nos EUA a sobrevivência é superior a 90%, na Índia é de apenas 66,1%.

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Aumentar

“Há de facto grandes assimetrias entre os vários países, tanto na mortalidade como no tipo de neoplasias. Mas, se antes olhávamos para os cancros como doenças de países ricos, agora percebemos que também nos outros países [este fenómeno] está a aumentar, à medida que aumenta a esperança de vida”, frisa Nuno Miranda. Para combater o problema, a receita já é conhecida - prevenção. “É preciso apostar não só nos rastreios, mas também na alteração dos estilos de vida e dos hábitos alimentares”, sublinha o médico.

“Apesar do subfinanciamento crónico, e o cancro ainda é um parente pobre em Portugal, temos bons resultados, o que diz muito da capacidade dos profissionais”, acentua o presidente da Liga Portuguesa contra o Cancro, Vítor Veloso. Ainda assim, acredita que a situação poderia ser “seguramente melhor” se a implementação dos três rastreios oncológicos de base populacional (mama, colo do útero e colo-rectal) “fosse uma realidade a nível nacional”.

Nuno Miranda contrapõe que este esforço está a ser feito, apesar de persistirem algumas assimetrias a nível regional. E adianta que, se no rastreio do cancro de mama passou no final de 2017 a ser norma para todo o país que a vigilância de dois em dois anos se inicia aos 50 anos (em vez dos 45, como estava a ser feito no Norte, no Centro e no Alentejo), no rastreio do cancro do colo do útero a ideia é começar aos 25 anos também na região de Lisboa e Vale do Tejo (que ainda é parcialmente feito e agora se inicia aos 30 anos), harmonizando a situação em todo o país. Quanto ao rastreio do cancro do cólon e recto, este está “mais atrasado”, reconhece.

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