"É expectável que se agravem as dificuldades de recrutamento das empresas"

Miguel Cabrita, secretário de Estado do Emprego, reconhece que a taxa de desemprego jovem em Portugal "ainda é elevada" e que é preciso repensar a eficácia da formação ao nível sectorial, para evitar um esvaziamento de competências.

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Miguel Cabrita diz que aumento mensal do desemprego é sazonal e não representa uma tendência consolidada Enric Vives-Rubio

Apesar de na comparação homóloga o desemprego jovem estar a diminuir, os dados mais recentes apontam para um aumento da taxa do segundo para o terceiro trimestre de 2017, em contraciclo com a redução global. Por que é que isto está a acontecer?
Tenho alguma dificuldade em acompanhar a leitura de que o desemprego jovem esteja a evoluir em contraciclo com a evolução global do mercado de emprego. Se olharmos para os últimos dois anos tínhamos uma taxa de desemprego jovem que estava acima dos 30% e no terceiro trimestre de 2017 tínhamos 24,2%, em linha com a evolução da taxa de desemprego mais global. Houve nalguns meses, em termos de evolução em cadeia, uma evolução positiva, mas é normal que aconteça.

A subida em cadeia entre Setembro e Outubro não é preocupante?
Não vejo nesses aumentos uma tendência consolidada, pelo contrário, a tendência de longo prazo é de melhoria clara da situação de desemprego dos jovens, em linha com o que se passa no mercado de trabalho em geral. Mas dito isto, a nossa taxa de desemprego jovem ainda é elevada e é uma preocupação. Os jovens pagam o preço dos custos da entrada no mercado de trabalho, ou seja, não têm ainda currículos muito preenchidos e não têm experiência profissional relevante.

Há alguma relação entre o elevado desemprego jovem e a diminuição do número de estágios apoiados pelo Estado?
Pode haver várias causas. Não nos parece que tenha a ver com a questão dos estágios. Onde pode haver alguma diferença - e aí é mais difícil separar os jovens de outros públicos – é nos fluxos entre as categorias de empregados, desempregados e inactivos. Tem havido um movimento geral em direcção ao emprego, mas também há uma redução global dos inactivos desencorajados que voltam a procurar emprego e entram nas estatísticas como desempregados. Não quero com isto desvalorizar o problema, mas parece-nos uma explicação mais plausível.

Um dos entraves identificados pelos empregadores em alguns sectores tem a ver com a desadequação entre a formação dos jovens e as necessidades das empresas. Como é que este problema pode ser “atacado”?
No contexto que atravessamos, de progressiva diminuição do desemprego, e tendo em conta o défice estrutural do nosso país em matéria de qualificações nas gerações mais velhas e num quadro onde a mão-de-obra jovem e altamente qualificada é cada vez mais escassa, há uma expectativa muito real de, no curto prazo, se agravarem as dificuldades de recrutamento das empresas. Por exemplo, no sector industrial, onde o emprego tem um perfil etário mais envelhecido, mais dependente de uma geração de trabalhadores formados nas antigas escolas industriais e que hoje se aproximam da idade da reforma, há um desafio de fundo que passa por garantir que a renovação geracional não leve a um esvaziamento de competências. É por isso que a aposta na formação e capacitação das gerações futuras de profissionais (e também na reconversão das gerações de trabalhadores mais velhos) é tão importante para estes sectores.

Atravessamos um momento decisivo para a formação sectorial, não só do ponto de vista da programação financeira para o pós-2020, mas de um ponto de vista mais estrutural. Precisamos de promover uma reflexão de fundo sobre a eficácia da formação sectorial, sobre o seu potencial de antecipação de necessidades. 

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