O frio é sempre novo

O frio é sempre novo, sempre surpreendente, sempre excessivo. Todos os anos caímos na esparrela.

O palavrão é tão brutal que tem de ser escrito assim f***. É uma four letter word tão feia que feia pode escrever-se com todas as letras mas f*** não.

Durante o dia até está calor. Mas aqueles graus de sol que nos aquecem as pernas pagam-se caros. Estão a condicionar-nos para o f***. Tiramos a camisola para mais avidamente ir à procura dela, mal o sol começa a cair de tão gasto, lá para as cinco da tarde, quando o f*** acorda para nos enregelar o corpo e a vida e a própria esperança.

O IPMA já rogou uma praga amarela — só a vermelha é mais temida — aos distritos de Bragança, Vila Real, Guarda e Aveiro. Aveiro, sim, leu bem. Nada celebra as últimas semanas do Outono como um banhinho de meia-noite nas águas cálidas da Costa de Prata.

Em Bragança, onde os extremos só dançam uns com os outros, o f*** cobra quatro graus negativos pela música. Até em Leiria-a-Soalheira, onde os termómetros ascendem à loucura mercurial dos 13 centígrados, a amplitude morde com 14 dentinhos de gelo, rematando com um grau negativo para a hora em que escolhe despir-se para ir para a cama.

O f*** é sempre novo, sempre surpreendente, sempre excessivo. Todos os anos caímos na esparrela, feita para apanhar moscas e pássaros. Nunca estamos preparados. O calor do Verão faz-nos um reset aos miolos: julgamos como se, de facto, tivéssemos nascido ontem.

E sabemos que batemos no fundo quando pedimos ao Senhor que chova, a ver se isto aquece um bocadinho. Bem nos avisou o Eduardo Prado Coelho que odiava o f*** português.

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