Dez escolhas de grandes colheitas

Um ano de provas e críticas é uma boa ferramenta para uma selecção. A que se propõe aqui não tem a pretensão de propor os melhores vinhos do ano. É apenas o resultado de uma escolha possível entre os vinhos que nos foram propostos para prova.

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Escolher grandes vinhos entre as cada vez mais exaltantes ofertas que o sector do vinho vai fazendo é uma tarefa cada vez mais difícil. Os vinhos nacionais continuam a melhorar, o nível de exigência dos produtores e das regiões está cada vez mais elevado e as últimas vindimas aqui consideradas, entre 2011 e 2015, permitiram a criação de vinhos de alta categoria. As escolhas são, por isso, mais difíceis. Ainda assim, a FUGAS arrisca e deixa aos seus leitores dez sugestões de grandes vinhos que passaram pelas suas páginas ao longo do ano. Não há aqui a pretensão de listar os dez melhores vinhos do ano. Mas, apenas, a vontade de partilhar dez magníficas experiências para que os leitores possam experimentar, confirmar as nossas opiniões ou, por que não, rejeitá-las liminarmente. Também por isso vale a pena o exercício.

Sidónio de Sousa Garrafeira Tinto 2011

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A família Sidónio de Sousa já tem três gerações ligadas ao vinho, mas só começou a engarrafar em nome próprio em 1990. O seu primeiro garrafeira, feito só de Baga, é de 1995 e é um dos grandes vinhos da história mais recente da Bairrada. O último a chegar ao mercado foi o 2009, também magnífico. Isto já diz tudo sobre a filosofia da casa. Até serem comercializados, os Baga Sidónio de Sousa afinam durante anos na penumbra da adega. O próximo a sair será o 2011 e promete fazer também história. É um tinto com a marca da casa: taninos poderosos, acidez vibrante e enorme complexidade. É enorme em tudo mas sem ser excessivo em nada- algo que distingue os grandes vinhos. Aromas muitos químicos e balsâmicos mas ainda com muita fruta preta, sabor amplo e cheio de frescura. Um vinho que nos agarra logo à primeira. Fantástico (27,50 €). P.G.

Herdade do Peso Ícone Tinto 2014

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Esta é apenas a segunda colheita de Ícone ( a primeira foi de 2007) e é a melhor. No aroma, até pode causar alguma dúvida: não tem muita fruta e algumas notas de natureza mais química e especiada entrelaçam-se com sugestões de barro (no lote entrou um pouco de vinho de talha). Na boca, é um monstro. Não de álcool ou extracção, mas sim de solidez tânica, de profundidade e frescura. Sim, imensa frescura, nervo, vivacidade. É um tinto arrebatador, com garra mas sem ser rústico, elegante mas sem ser maneirinho. Analiticamente, é quase perfeito: 14% de álcool, ph baixo, acidez alta. Tem tudo para durar muitos anos em grande forma. Extraordinário (85 €). P. G.

Quinta do Monte Xisto Tinto 2015

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O vinho é um lote de Touriga Nacional (60%), Touriga Francesa (35%) e Sousão (5%). As uvas foram vinificadas em lagar com pisa a pé, fermentando de forma espontânea, e o vinho estagiou depois 18 meses em pipas de 600 litros. Esta é a quinta colheita de Monte Xisto e, em comparação com a inaugural, de 2011, percebe-se um ajustamento no volume alcoólico, bem mais contido no 2015. É um registo mais fino e fresco. O primeiro Monte Xisto era um Douro clássico, mais concentrado, extraído e maduro. Este mostra outro refinamento e elegância. Não impressiona pela exuberância da fruta, nem pelo volume e vigor tânico, mas está lá tudo, de um forma sóbria e agradabilíssima. É um vinho cheio de pureza, vivacidade e profundidade que já começa a reflectir a forma orgânica como a vinha é trabalhada (65 €). P. G.

Muros de Magma Verdelho 2015

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Um branco da Ilha Terceira, da zona dos Biscoitos. Fermentou e estagiou durante um ano em barricas usadas. Na cor mostra já bastante oxidação (é típico da casta Verdelho quando apanha demasiado sol), mas está vivo e fresquíssimo. De aroma austero, também típico da casta, mostra na boca os dois lados do basalto: madureza (embora tenha só 12,5% de álcool) e frescura. A sua secura, salinidade e acidez são prodigiosas e deixam-nos a salivar. Um branco de “terroir”, tributário do mar e da lava (30 €). P.G.

Quinta das Bágeiras Garrafeira Branco 2015

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O novo Quinta das Bágeiras Garrafeira Branco 2015 é um vinho de outro nível e que merece ser conhecido, até porque é o primeiro branco da casa com origem numa vinha de solo calcário. Lote de Bical e Maria Gomes, é um branco maduro, gordo e rugoso, de grande complexidade e em que a calidez fosforada do calcário, bem sopesada pela frescura bairradina, acrescenta aos aromas frutados uma outra dimensão sensorial. Um branco para beber de joelhos daqui a alguns anos (17 €). P.G.

Quinta da Manoella Vinhas Velhas 2014

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Origem: uma vinha velha (104 anos), do Douro, onde coexistem 30 castas; autores: os enólogos Jorge Serôdio Borges e Sandra Tavares da Silva. As condições à partida são ideais para a criação de um grande vinho. Mas este vinho desta vinha vai mais além. Trabalho notável com a madeira, nariz de grande classe, com a madurez da fruta a produzir aromas muito definidos e ausentes de notas delicodoces da compota, tensão e estrutura, na qual o tanino impõe uma leve rugosidade, e, acima de tudo, uma enorme originalidade que denuncia o lugar de origem – o vale do Pinhão. Um vinho que cresce em ondas na boca, mostrando a excelência da fruta do Douro, uma profundidade e uma acidez que tornam o seu final interminável e delicioso, é uma experiência sensorial única, pura e grandiosa. (69.50 €). M.C.

Chryseia 2015

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Os grandes vinhos valem pelo seu conjunto, mas há vinhos que se apresentam e apresentam a sua classe apenas pela classe dos seus aromas. O Chryseia de 2015 é um desses vinhos que apetece inalar o dia inteiro. O tempero da esteva e das notas florais claramente inspirado pela Touriga Nacional são o testemunho da graciosidade e elegância. A marca de sugestões de especiaria e das notas balsâmicas sugerem-nos sofisticação e complexidade. Mas, à imagem do enorme Chryseia de 2012, esta edição é de uma harmonia notável. A sua estrutura é imponente, mastigável até, com tanino vívido, ainda com leve adstringência vegetal, a criar uma textura macia sem cair na fatalidade dos vinhos planos e aborrecidos. É sobre este alicerce que depois se instalam notas de framboesa, esteva e violeta, especiaria, sugestões de tabaco, num conjunto profundamente duriense. Um grande vinho. (69 €) M.C.

Quanta Terra Branco 2007

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Num país que regra geral despreza o valor do tempo na maturação do vinho, lançar um branco com 10 anos de vida é um acto de coragem. Só por isso, a ousadia de Jorge Alves e Celso Pereira mereciam ser distinguidos. Mas são-no principalmente porque este branco está numa fase fantástica. É um vinho exótico, complexo e cheio de subtilezas, como se exige a um vinho com anos de garrafa. Notas cítricas, num conjunto aromático muito original, com sugestões de mel, amêndoa amarga e querosene a denunciar a marca do envelhecimento. Boa cremosidade, intensidade e delicadeza com um final de boca longo e memorável. Um vinho com uma soberba textura, elegância e harmonia, que dá muito prazer beber. Ideal para queijos, massas e carne branca. (35 €)

Villa Oliveira tinto 2014 Edição 125 anos

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Um vinho que nos faz recuar mais de 100 anos e deixa perceber de que matéria eram feitos os grandes Bairrada/Dão de há quatro ou cinco décadas. Alguns ainda por ai andam e são uma lição de vida para a enologia. Nascida no século XIX, antes ainda da criação da região do Dão (1908), a Quinta da Passarella lançou o seu primeiro vinho há 125 anos, com o rótulo Villa Oliveira. Paulo Nunes, o enólogo actual, não se limitou a recuperar o rótulo e a garrafa de então, mas quis também fazer um vinho com as mesmas características e castas. Predominam Baga e Jaen, mas há também Tinta Carvalha, Tinta Amarela e Alvarilhão, tudo de velhas cepas que perduram na propriedade. O vinho, lançado este ano, é um portento de equilíbrio, frescura e concentração. E a capacidade de evolução quase infinita. Tanta que o enólogo só deixa vender por ano 200 das duas mil garrafas da produção. As últimas chegarão ao mercado daqui a dez anos (90€). J.A.M.

Carlos Lucas Família

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Todos os anos Carlos Lucas identifica aqueles que considera os melhores lotes e cria vinhos especiais que entende mostrarem “as coisas mesmo boas” da sua produção. Da colheita de 2014, engarrafou 3 mil garrafas (mais 50 magnum e 20 double magnum) com o rótulo Carlos Lucas Família, uma vez que o lote foi sendo afinado à mesa de casa com a mulher, Cristina, e os filhos, Carolina e Diogo.Com Touriga Nacional, Alfrocheiro e Tinto Cão, o vinho estagiou 18 meses em barricas usadas e o resultado é um vinho profundo, fresco e concentrado. Aromas de frutos silvestres, alguma especiaria e baunilha, mas com tanino vigoroso e saboroso e um manto de frescura que destaca o final longo e sedoso. Um Dão moderno e de excelência (60€). J.A.M.

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