Instituição suspende funcionárias que denunciaram maus tratos

Petição pública que exigia afastamento de suspeitos de maltratar acolhidos na Casa dos Rapazes de Viana do Castelo recolheu 1023 assinaturas. Suspeitos terão pedido à direcção para serem afastados.

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ADRIANO MIRANDA

A direcção da Casa dos Rapazes de Viana do Castelo decidiu suspender as duas funcionárias que denunciaram maus tratos no lar de infância e juventude, uma estrutura destinada a acolher crianças e jovens em situação de perigo, e manter ao serviço os cinco arguidos. Os suspeitos é que terão pedido para ser afastados – e foram.

Ao que o PÚBLICO apurou, as duas funcionárias foram suspensas no final de Outubro. Acusam-nas de não cumprirem ordens e instruções, de provocarem conflitos e desentendimentos dentro dos órgãos directivos e de não guardarem lealdade ao empregador, prejudicando a sua imagem e bom nome.

O caso foi noticiado pela primeira vez no dia 8 de Outubro. Ao PÚBLICO chegaram vídeos, fotografias e relatos que indicavam que a violência verbal, emocional ou mesmo física se teriam tornado num modo de lidar com a experimentação sexual dos rapazes e com outros comportamentos considerados desviantes.

Em Abril, o Ministério Público recebeu um alerta de um cidadão. Havia um zunzum na cidade. Cartas anónimas chegaram às mãos de diversas entidades. Pelo menos a Comissão de Protecção de Crianças e Jovens remeteu-a para o Ministério Público e para o centro distrital da Segurança Social. Já em Junho, as duas educadoras apresentaram uma denúncia, anexando cerca de 40 documentos, incluindo vídeos e fotografias.

“Práticas de contenção comportamental”

O mal-estar ter-se-á instalado antes ainda da notícia dessa denúncia. As duas educadoras ter-e-ão manifestado contra “práticas de contenção comportamental” que envolvessem violência psicológica ou física. E terão dito aos rapazes supostamente agredidos que o que lhes acontecera nunca deveria ter acontecido. E isso terá desagradado os superiores hierárquicos. 

As denúncias não caíram em saco roto. O Instituto da Segurança Social, a entidade tutelar do acolhimento residencial, em articulação com o centro distrital, nomeou uma equipa de acompanhamento. Quatro rapazes foram transferidos. Cinco funcionários foram constituídos arguidos e sujeitos a interrogatório judicial.

As notícias, avançadas pelo PÚBLICO e replicadas por outros órgãos de comunicação social, aumentaram a tensão dentro da instituição fundada em 1952 pelo cónego Constantino Macedo de Sousa e por um grupo de fiéis. A pressão exercida sobre as funcionárias aumentou. Os médicos de família concederam-lhes baixa médica.

Lá fora, pelo menos parte da cidade não ficou indiferente. A 20 de Outubro começou a circular na Internet uma petição a pedir o “afastamento imediato” dos suspeitos. No texto, dirigido ao presidente do Instituto da Segurança Social, Rui Fiolhais, os signatários alegavam que afastar as crianças em causa, colocando-as noutros sítios, não era suficiente, já que todas as outras continuavam “em risco dentro de uma instituição”.

Conforme explicou a primeira signatária, Carolina Enes, a ideia era recolher pelo menos mil assinaturas até 20 de Novembro, Dia Universal dos Direitos da Criança. E o grupo de cidadãos que encabeçava a iniciativa dispunha-se a tomar outras medidas, incluindo organizar uma manifestação numa das principais praças da cidade.

A petição fechou na segunda-feira da semana passada com 1023 assinaturas. Segue no início desta semana para Rui Fiolhais, mas os cinco suspeitos já não estão na Casa dos Rapazes.

Segurança Social terá pressionado a instituição

O Instituto da Segurança Social, que saberia desde o início de Novembro que as funcionárias tinham sido suspensas, terá pressionado a instituição a afastar os arguidos. No dia 16 de Novembro, a Casa dos Rapazes enviou uma nota à agência Lusa a dizer que os cinco funcionários pediram para serem afastados e que os seus pedidos foram analisados e aprovados pela direcção.

“Os pedidos de afastamento foram feitos para que o inquérito em curso no Ministério Público decorra com a necessária normalidade e transparência e para que a instituição não continue a ser pressionada”, esclarecia na já referida nota citada pela agência noticiosa. Não fazia menção às funcionárias que denunciaram o caso. 

O PÚBLICO tentou diversas vezes, sem sucesso, ao longo dos últimos dias obter por telefone uma reacção do presidente da direcção, Luís Brito. O Instituto da Segurança Social escusou-se a comentar a situação. “Até à data mantêm-se as visitas de acompanhamento técnico regular à instituição”, referiu, por email. “Reiteramos que este caso se encontra em segredo de justiça, não habilitando este instituto a fornecer informações adicionais sobre o processo.”

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