Chegam ajudas para os prejuízos dos agricultores, falta reforço para a prevenção contra incêndios

Governo destinou 97,7 milhões de euros de fundos europeus e oito milhões de crédito para os prejuízos agrícolas dos últimos quatro meses de incêndios, mas ainda não fechou a reprogramação das verbas para os agricultores aumentarem a resiliência da floresta. Pedrógão não esgotou verbas.

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Maior fatia dos fundos europeus para compensar os prejuízos na agricultura vai para os incêndios de Outubro ADRIANO MIRANDA

Em Pedrógão, os apoios aos agricultores “estão longe de esgotar”. Em Vila Nova de Poiares, a entrega de rações aos animais é a face mais visível dos primeiros apoios que começaram a chegar esta semana aos da zona Centro. Mas o que vai marcar a resposta do Ministério da Agricultura aos incêndios florestais deste ano será a dimensão e o ritmo a que as verbas para os agricultores aumentarem a defesa da floresta contra incêndios serão colocadas no terreno.

O assunto mereceu referência específica do ministro das Finanças, Mário Centeno, na Comissão Parlamentar de Orçamento, Finanças e Modernização Administrativa sobre a proposta do Orçamento do Estado para 2018 (OE2018), há quatro dias. "Há um défice crónico da implementação do PDR [Programa de Desenvolvimento Rural] nas florestas", uma situação que levou o Governo a "alterar a estratégia de implementação dos fundos" europeus, através de uma reprogramação.

O défice de que Centeno falou teve origem numa decisão do Ministério da Agricultura, então liderado por Assunção Cristas, que, à beira das eleições de 2015, bloqueou as candidaturas de projectos de prevenção de fogos. Cristas é acusada de ter aberto um concurso de 210 milhões de euros para projectos de prevenção contra fogos, quando, algum tempo antes, tinha reduzido a respectiva dotação financeira para 26 milhões de euros. A Inspecção-Geral da Agricultura, Mar, Ambiente e Ordenamento do Território (IGAMAOT) chumbou o concurso, já depois das eleições de 2015, e o processo reiniciou.

O ministro da Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural, Capoulas Santos, demorou mais de um ano a resolvê-lo. O porta-voz do ministério disse ao PÚBLICO que são processos “que têm uma dinâmica e um tempo” e defende que, pelo caminho, o ministério deu resposta a cerca de 30 mil candidaturas com um reforço de 19 milhões de euros para esta medida. Estão neste momento a serem pagos - mas em montante insuficiente para responder às necessidades. Só depois do incêndio de Pedrógão e com a entrada do novo secretário de Estado das Florestas e do Desenvolvimento Rural, na remodelação a meio de Julho, avançou o trabalho de fundo, que é reprogramar as verbas do PDR de modo a resolver este bloqueio.

O Bloco de Esquerda já questionara o Governo sobre este tema crítico, e com outras frentes, perante queixas recebidas e candidaturas desde 2014 à espera.

O ministério não avança, para já, com o montante com que vai reforçar esta medida. “A reprogramação do PDR florestal está a ter lugar agora”, refere a mesma fonte.

Mais de 100 milhões de euros

Definidos estão os apoios para a estabilização de emergência para situações pós-incêndio, que visam melhorar as condições de resposta da floresta, por exemplo, às chuvas, e para o restabelecimento do potencial produtivo, abrangendo instalações, equipamentos, culturas e animais. O ministério de Capoulas Santos repartiu as verbas em três frentes: incêndios de Pedrogão e Góis; os restantes de Julho, Agosto e Setembro; e, por fim, os de Outubro. Os fundos europeus somam 97,7 milhões de euros, dos quais 30 milhões para os incêndios que começaram no passado dia 15, a que acrescem duas linhas de crédito, no valor de 8 milhões de euros.

Uma linha de crédito de três milhões de euros foi decidida no Conselho de Ministros de há uma semana, a segunda, de cinco, na quarta-feira.

No caso de Pedrogão, o balanço já é possível. Os apoios disponíveis para os agricultores que viram os seus campos e animais atingidos pelos incêndios de Junho deste ano “estão longe de esgotar”, devido à forte presença de agricultura familiar na região, diz porta-voz do Ministério da Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural.

Para aceder aos apoios do Governo e da União Europeia, os agricultores têm de ter actividade declarada, uma prática que não existe na agricultura familiar. Por outro lado, o montante de prejuízos declarado por cada uma destas pequenas explorações era “tão baixo para os níveis do Programa de Desenvolvimento Regional que se encontrou um mecanismo simplificado ao abrigo do Revita”. Através deste fundo de cerca de dois milhões de euros, constituído com donativos de empresas e de particulares, têm sido pagos “prejuízos até 5000 euros” a quem tem pequenas explorações familiares e também a quem é profissional “mas com prejuízos mais baixos”.

Fundos europeus

Quatro meses depois da tragédia de Pedrógão Grande, ainda se espera pela decisão sobre a abertura do Fundo de Solidariedade, já que o Governo decidiu “reformular a candidatura, tendo em conta os prejuízos ocorridos na mesma região (Centro), nos meses subsequentes”, responde o Ministério do Planeamento e Infra-estruturas ao PÚBLICO. O objectivo é que o montante de prejuízos elegíveis atinja ou ultrapasse os 500 milhões de euros, patamar que as regras comunitárias impõem para que o Fundo seja aplicável. A Comissão Europeia promete para breve uma resposta.

Quanto à recuperação das empresas da região, através de fundos europeus, faz-se a um ritmo lento. O concurso lançado no âmbito do Portugal 2020 para o efeito, com uma dotação de 25 milhões de euros, conta até agora com 21 candidaturas aprovadas, de um total de 25 recebidas, envolvendo um incentivo dos fundos de 4,8 milhões de euros, para um investimento elegível de 6,7 milhões. Os dados são do Ministério do Planeamento e Infra-estruturas (MPI), que tutela a gestão do pacote de fundos europeus até 2020.

Para tornar as empresas da região elegíveis para os apoios dos fundos europeus, “mais tradicionais”, o Governo teve luz verde para reprogramar parte do Programa Operacional do Centro, o que fez para Pedrógão. Mas até agora não precisou de o fazer em relação às empresas afectadas pelos incêndios deste mês, por terem características que encaixam nas regras do Portugal 2020. “As fontes de financiamento, assim como os montantes exactos, dependem do apuramento rigoroso dos prejuízos, que ainda decorre”, sublinha o MPI.

Os últimos dados do Portugal 2020 indicam que o plano de 25,7 mil milhões de euros de fundos comunitários para o país para o período 2014-2020 estava com uma taxa de execução de 15 por cento no final de Junho deste ano, o que significa que tinham sido efectivamente pagos até essa data 3,8 mil milhões.

Os programas operacionais regionais tendem a ter uma execução mais lenta que os restantes. No final de Junho passado - a três anos e meio do fim do Portugal 2020 -, Norte, Centro, Alentejo, Lisboa e Algarve tinham uma taxa média de 6%. O Centro estava com o melhor valor (7%) e o Alentejo e Lisboa com o mais baixo (4%).

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