Por que anda o dinheiro para ajudar vítimas de Pedrógão a ser usado no SNS?

CGD firmou um protocolo com a Gulbenkian para que esta instituição gerisse o fundo e, nele, estabeleceu-se mais um objectivo: reforçar a capacidade do SNS. Foi a Gulbenkian que identificou a necessidade.

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Conta foi criada para ajudar vítimas de Pedrógão Grande Adriano Miranda

A denúncia de que parte do dinheiro angariado pela Caixa Geral de Depósitos (CGD), para ajudar as vítimas de Pedrogão Grande, estaria a ser indevidamente usada no Serviço Nacional de Saúde (SNS) partiu da Frente Cívica, liderada por Paulo de Morais. Mas as duas instituições envolvidas no processo de recolha e gestão daquele montante, CGD e Fundação Calouste Gulbenkian, esclarecem que o objectivo de reforçar a “capacidade de resposta do SNS na emergência e pós emergência” foi acrescentado, a posteriori, no protocolo celebrado.

Num comunicado enviado às redacções, a Frente Cívica questiona a razão pela qual o presidente da CGD, Paulo Macedo, instruiu a Gulbenkian a usar 500 mil (de um total de 2,6 milhões de euros) no “reforço dos meios de assistência” no Centro Hospital da Universidade de Coimbra, quando esse objectivo não era um dos quatro definidos quando foi criada a conta-solidariedade. Esses eram “a reconstrução e reabilitação e reabilitação das primeiras habitações”; “a reconstrução ou reabilitação de anexos agrícolas”; “a recuperação dos meios de subsistência das famílias mais gravemente afectadas”; “o apoio às associações de apicultores com alimentação sólida para as abelhas”.

 “Há patentemente um desvio de fins”, lê-se no comunicado no qual a associação cívica defende que não se pode confundir o “o SNS e os meios que o Estado lhe deve proporcionar para bem cumprir, em qualquer circunstância, a sua missão” e os “dinheiros que deveriam ser canalizados directa e exclusivamente para as vítimas, promiscuamente desviados para serviços directa ou reflexamente implicados na assistência aos que dela carecem”. Por isso, a associação vai escrever a Paulo Macedo e ao Ministro da Finanças: “Vai instar a CGD a que reponha os valores abusivamente distraídos das suas finalidades e o Ministro das Finanças, que a tutela, para que force a mão à CGD a bem cumprir o mandato implícito que os doadores lhe cometeram”.

Outra versão da história

Mas a CGD e a Gulbenkian têm uma justificação para o uso daqueles 500 mil euros no reforço de equipamentos da unidade de queimados dos CHUC e em centros de saúde (não serão transferidas quaisquer verbas, serão doados os equipamentos). Acontece que, quando o protocolo entre a CGD e Gulbenkian foi firmado, ficando esta instituição com a gestão do fundo, foi acrescentado um quinto objectivo: o “reforço da capacidade de resposta do SNS na emergência e pós-emergência”. O protocolo foi firmado depois de a conta-solidariedade ter sido criada e depois de a Gulbenkian ter ido para o terreno identificar as necessidades, tendo sido esta na área da Saúde uma das que identificou, junto das “próprias unidades” e da “associação das vítimas”, explica a Gulbenkian. O bolo que gere não se fica, aliás, pelo dinheiro angariado pela CGD, mas junta verbas de outras entidades privadas e vai até aos 3,6 milhões de euros.

“Os equipamentos que estão a ser adquiridos pela Fundação e que irão ser doados a diferentes unidades de saúde das regiões em causa correspondem a necessidades e solicitações que foram manifestadas pelas próprias unidades e pela associação das vítimas e que pretendem sobretudo aumentar a capacidade de atendimento das populações em situações de emergência e pós-emergência, como o transporte de doentes, tendo em conta o isolamento dos concelhos afectados”, começa por explicar a assessoria da Gulbenkian, acrescentando que “uma das falhas apontadas pelas vítimas e pelas estruturas locais é a falta de meios para transportar tantos doentes que precisam de ser acompanhados depois da catástrofe e que vivem em pontos mais isolados, sem meios próprios de transporte (muitas vezes idosos e pessoas sozinhas)”.

“Além desta necessidade foi-nos também comunicada a insuficiência de equipamentos na unidade de queimados que respondem a situações normais do quotidiano, mas não conseguem dar cabal resposta em situações de emergência como foi a de Pedrógão e dos últimos incêndios deste mês”, lê-se ainda na resposta da Gulbenkian, sublinhando que se tenta “com esta doação de equipamentos criar condições para que os feridos sejam atendidos mais rápida e eficazmente, e evitar que engrossem o número de vítimas mortais que infelizmente tem vindo a aumentar”.

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