Marcelo afirma em Luanda que não apoia susceptibilidades "de grupinhos"

O Presidente da República considerou legítimo que em democracia se goste e se desgoste de tudo, sublinhando que "é bom que seja assim", numa aparente alusão às críticas de alguns sectores portugueses às relações com Angola.

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LUSA/JOSÉ COELHO

O Presidente da República de Portugal afirmou esta terça-feira, em Luanda, que não se afastará da defesa do "interesse nacional" a favor "daquilo que seja em cada momento a susceptibilidade de grupos ou grupinhos", relativamente a Angola.

Marcelo Rebelo de Sousa esteve em Luanda para assistir à cerimónia de investidura do novo Presidente de Angola, João Lourenço, e ao final da tarde manteve um encontro com a comunidade portuguesa residente na capital angolana, antes de regressar a Portugal.

Na sua intervenção, o chefe de Estado português considerou legítimo que em democracia se goste e se desgoste de tudo, sublinhando que "é bom que seja assim", numa aparente alusão às críticas de alguns sectores portugueses às relações com Angola.

"Agora, eu não me afastarei um milímetro e tenho a certeza de que o Governo também não, daquilo que é essencial para o interesse nacional, em função daquilo que seja em cada momento a susceptibilidade de grupos ou grupinhos que não prossigam o interesse nacional", referiu.

A posição surge num momento de tensão nas relações entre Angola e Portugal, devido às investigações das autoridades portugueses a figuras do regime angolano, processos aos quais Marcelo Rebelo de Sousa nunca se referiu directamente durante os dois dias de visita a Luanda.

"Nós não temos de concordar com tudo aquilo que os povos irmãos pensam ou fazem, não temos de concordar com poderes políticos de povos irmãos uns com os outros, temos soluções diferentes, para problemas diferentes, com sistemas diferentes e com visões muitas vezes do mundo diversas. Mas isso é uma coisa e cada qual mantém a sua posição", disse ainda o chefe de Estado português.

Ainda assim Marcelo Rebelo de Sousa referiu que "outra coisa é fazer sobrepor aquilo que possa haver de diferente à busca das convergências possíveis".

"Para além dessas divergências, há um oceano de convergências possíveis para os povos, para as economias, para as sociedades, para as finanças, para a cultura e para tudo aquilo que faça vida das pessoas e devemos procurar essas convergências, aceitando o que há de divergências. Além de não haver cedências em relação àquilo que é a maneira de cada qual se organizar, se arrumar e se definir internamente", observou.

Marcelo Rebelo de Sousa defendeu ainda a necessidade de se saber separar a maneira portuguesa de assumir a soberania e aquilo que é corresponder ao apelo de dois povos irmãos para a convergência: "E nós precisamos de ter visão de Estado no domínio das relações internacionais, neste caso concreto no quadro da CPLP [Comunidade de Países de Língua Portuguesa] e no relacionamento com povos irmãos como são aqueles que a integram", salientou.

O estadista português elogiou ainda o Governo anterior pelo facto de, num momento complexo da vida do sistema bancário português, ter tomado a iniciativa de promover e apoiar a entrada de capital angolano numa entidade bancária importante em Portugal, por considerar que o ato correspondia à prossecução do interesse nacional e à convergência desejável entre os dois povos e as duas economias.

"Fica feito esse louvor, o que significa que sucedem-se os Governos com desafios diferentes e o actual Governo já teve de enfrentar desafios também neste mesmo quadro, sensíveis, que o Presidente da República acompanhou de perto, apoiando, mas para que se não dissesse que estava a referir-me à conjuntura e ao Governo em funções, eu referi-me ao Governo anterior", salientou.

A referência serviu, segundo Marcelo Rebelo de Sousa, para mostrar que o anterior Governo não teve "pruridos" com a urgência relativamente a um investimento angolano "muito significativo" no sistema bancário, na economia e na sociedade portuguesa.

Vaia? "Um ou outro português distraído"

Marcelo  lamentou também que haja "um ou outro português distraído" que tenha considerado como uma vaia a ovação que Portugal recebeu do povo angolano.

O chefe de Estado português, que chegou segunda-feira a Luanda, referiu ter confirmado durante a sua estada no país, "o calor inequívoco do povo angolano relativamente a Portugal e aos portugueses, que não tem a ver com a pessoa do Presidente".

"A ovação de hoje, claramente superior a todas às outras na cerimónia, não foi dirigida à pessoa do Presidente, fosse o Presidente qualquer um, teria sido dirigida à Portugal e aos portugueses e eu só estranho o facto de haver portugueses que não gostam de ser aplaudidos por povos irmãos", criticou.
Segundo Marcelo de Sousa, os aplausos poderiam não ter acontecido e até "ninguém esperaria que tivessem acontecido".

"Mas, tendo acontecido, é estranho que sejam os presidentes dos outros países, os diplomatas dos outros países, a notarem e a felicitarem como [os angolanos] gostam dos portugueses e haja um ou outro português distraído que entenda que aquilo que os povos consideraram um aplauso acabou por ser uma vaia", ironizou.

Marcelo Rebelo de Sousa aplaudiu ainda as relações de fraternidade entre os dois povos, que se apoiam mutuamente, em momentos difíceis. "Os povos português e angolano fizeram uma escolha, essa escolha tem a ver com a nossa história, com a nossa cultura, com a língua comum, com muito daquilo que uns e outros nos demos ao longo dos séculos, mas também tem a ver com hoje e com o amanhã", concluiu.

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