Vinho da Madeira: Excesso de produção leva Governo a comprar uvas a baixo preço

Executivo madeirense vai comprar uvas que não forem escoadas por valor abaixo do preço de mercado. Viticultores reclamam da solução, e questionam o destino final das uvas.

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LUSA/HOMEM DE GOUVEIA

No final de Agosto passado, com a vindima de 2017 à porta, o Governo Regional da Madeira acreditava que não seria necessário intervir para compensar os viticultores pela falta de escoamento das uvas. Humberto Vasconcelos, secretário regional da Agricultura e Pescas, dizia ao DN-Madeira, que o mercado - as adegas que produzem Vinho Madeira - iria absorver toda a produção, mas, menos de um mês depois, o executivo madeirense foi obrigado a intervir para evitar que cerca de 500 toneladas de uvas fossem para o lixo.

O optimismo de Humberto Vasconcelos, que estimava a vindima em quatro mil toneladas – o volume que é habitualmente absorvido pelos produtores – foi traído pelo ano excepcional, onde o clima quente e seco fez a produção aumentar e as uvas atingirem grau alcoólico suficiente para o Vinho Madeira.

Para já, o Governo recusa quantificar o valor da intervenção. Contactado pelo PÚBLICO, o secretário regional da tutela remeteu explicações para o final das vindimas, mas a despesa deverá rondar os dois milhões de euros.

A intervenção, tomada na semana passada pelo Funchal, começou por fixar em 50 cêntimos o preço por quilo, quando o valor pago pelas adegas chega a atingir os 1,10 euros. Já esta semana, a comparticipação foi revista em alta para 80 cêntimos, mas o valor continua aquém das expectativas dos produtores, que desconfiam que as uvas compradas através do Instituto do Vinho, Bordado e Artesanato da Madeira (IVBAM) possam depois ser revendidas a preços mais baixos a uma das sete casas que produzem Vinho Madeira.

Fonte do gabinete de Humberto Vasconcelos rejeita essa ideia, explicando que as uvas compradas pelo IVBAM serão transformadas em mosto e armazenadas, e que o aumento da indeminização por quilo está relacionada com o aumento da compra, nos últimos dias, de uvas pelas adegas. Como há menos uvas, disse a mesma fonte, o valor aumentou.

O executivo liderado por Miguel Albuquerque tabelou também o preço para os vinicultores que queiram comprar o mosto de volta. “Caso o viticultor deseje e expresse a vontade de adquirir o mosto correspondente às uvas entregues, aquando do documento de contratualização da compra das uvas, as mesmas podem ser devolvidas transformadas em mosto, sendo o valor a pagar de 0,4 euros por quilograma”, lê-se numa nota de imprensa emitida pelo Conselho de Governo madeirense.

No início da semana, Humberto Vasconcelos foi a São Vicente, um concelho no Norte da ilha onde se concentra muita da produção, tentar acalmar os produtores. Lembrou que a intervenção é na “defesa dos viticultores”, ao mesmo tempo que anunciava um reforço na equipa técnica do IVBAM no sentido de sensibilizarem os produtores para as necessidades de reconversão de castas tintas, que existem em excesso, para castas brancas tradicionais como o Sercial ou o Verdelho que estão a ter maior procura por parte dos consumidores.

As explicações não convenceram totalmente, e no pico da campanha eleitoral a oposição trouxe as vindimas para a agenda política. Por um lado, acusam o executivo de falta de planeamento no sector colocando em risco a sustentabilidade dos produtores e, no final, do próprio Vinho Madeira. Por outro, questionam se esta intervenção não está a ser discriminatória em relação aos restantes agricultores.

As autarquias de São Vicente e de Câmara de Lobos, onde se concentram a maior número de produtores de uvas para Vinho Madeira, apressaram-se também a intervir. A primeira, governada por um independente, agora apoiado pelo PSD que governa a região autónoma, vai assumir as despesas de transporte das uvas, e a segunda, também social-democrata, vai acrescentar 0,13 cêntimos ao preço pago pelo Governo aos viticultores do concelho.

Com uma área de vinha a rondar os 430 hectares, a esmagadora maioria da qual destinada a vinhos Madeira, o arquipélago produz anualmente mais de três milhões de litros de vinho. Quase todo é destinado à exportação, com o mercado comunitário a ser responsável pela maior fatia: cerca de 80%.

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