Em Nova Iorque, UE propõe pacto contra comércio de instrumentos de tortura

Apesar de 162 países terem ratificado a Convenção Contra a Tortura da ONU, a Amnistia Internacional documentou a prática de tortura em 140 países na última década.

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Reuters

A União Europeia vai lançar esta segunda-feira uma Aliança Internacional de países para acabar com o comércio de mercadorias e instrumentos utilizados para torturar ou executar pessoas. O lançamento decorre esta segunda-feira em Nova Iorque, na véspera da abertura da 72.ª Assembleia Geral das Nações Unidas e a UE espera que adiram cerca de 50 países dos vários continentes.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos (art. 5) e diversos tratados internacionais e regionais proíbem a prática da tortura. Ainda assim, continua a ser utilizada em diferentes regiões e os instrumentos que infligem morte, dor e sofrimento a ser comercializados por todo o mundo – desde bastões com picos, cintos que dão descargas eléctricas, dispositivos para electrocutar, produtos químicos para executar, sistemas de injecção forçada, cadeiras eléctricas, guilhotinas, forcas, entre outros.

Desconhece-se a dimensão exacta deste tipo de comércio. A Amnistia Internacional explica que é muito difícil distinguir estas mercadorias nas diferentes rubricas tarifárias já que muitas vezes se encontram juntamente com outros produtos “inocentes” e não relacionados.  

Se as estatísticas comerciais não oferecerem um quadro rigoroso, já os números sobre a tortura e a pena de morte no mundo são mais reveladores e demonstram práticas amplamente estabelecidas em muitos países. Nas últimas décadas muitos Estados têm aderido aos compromissos e protocolos internacionais para erradicar a tortura, os tratamentos inumanos e degradantes e a pena capital. Apesar de 162 países terem ratificado a Convenção Contra a Tortura da ONU, a Amnistia Internacional (AI) documentou a prática de tortura em 140 países na última década. Também o recurso à pena de morte continua a ser em larga escala: 134 Estados aboliram completamente ou na prática a pena de morte mas, só em 2014, foram executadas 607 pessoas em 22 países e pelo menos 2466 homens e mulheres condenados à morte, segundo um relatório publicado pela AI em 2015.

Outro dado: de acordo com o site da Coligação Mundial Contra a Pena de Morte, em 2017 foram executadas - até agora - 583 pessoas. Os países com maior número de execuções até ao momento foram o Irão (380), a Arábia Saudita (71) e a Paquistão (55).

A União Europeia proíbe desde 2005 as exportações de mercadorias utilizadas para aplicar a pena de morte ou infligir tortura ou tratamentos cruéis ou degradantes. O bloco comunitário tem uma lista de mercadorias proibidas e prevê um mecanismo célere, a fim de garantir que os novos produtos também possam ser banidos.

Os 28 têm vindo a restringir a legislação sobre esta matéria e ainda no ano passado aprovaram novas regras para o controlo das exportações e a proibição de publicidade destes produtos, incluindo novas cláusulas que limitam e impedem os serviços de assessoria, o trânsito pelo território e portos da UE, a corretagem e a promoção, como em feiras comerciais e exposições ou na Internet.

A legislação comunitária já permitiu obter resultados, garante a Comissão Europeia. Em parte devido a regras mais rigorosas da UE, as substâncias para as injecções letais tornaram-se mais difíceis de obter e são mais caras. O problema é que esta legislação só é aplicada na Europa. Ora, os produtores e comerciantes destas mercadorias tentam contornar a legislação europeia, pelo que quanto mais países se comprometerem a proibir a sua exportação, mais eficaz será a luta para acabar com este tipo de comércio.

A União Europeia quer continuar a ser referência na protecção dos direitos humanos e pretende alargar este combate. Por isso, lança esta segunda-feira a Aliança Internacional para o Comércio sem Tortura, juntamente com a Argentina e a Mongólia. O objectivo é torná-la a base para uma cooperação mais vasta no âmbito das Nações Unidas.

“Estes produtos só servem para infligir dores terríveis e matar seres humanos. Jamais deveríamos permitir que eles sejam comercializados como qualquer outra mercadoria. É tempo de tomar medidas concretas para pôr cobro a este comércio abominável", disse a comissária europeia do comércio Cecilia Malmström, quando anunciou a iniciativa.

Os países que aderirem à Aliança comprometem-se a tomar medidas para controlar e restringir as exportações das mercadorias para torturar e executar e a equipar as autoridades aduaneiras com ferramentas adequadas. Devem disponibilizar assistência técnica para ajudar a elaborar e aplicar leis que proíbam este comércio. A Aliança vai ainda criar uma plataforma para monitorizar os fluxos comerciais, trocar informações e identificar novos produtos.

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