Na terra do mel, a assembleia de voto está debaixo de uma tenda

“Já me ensinaram que tenho de ir lá e colocar a cruz no partido que quero, sem dizer a ninguém. Estou nervoso, mas já sei em quem votar".

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LUSA/MANUEL DE ALMEIDA
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Virgílio Fiel da Graça, 19 anos, sai de casa para confirmar o seu nome no caderno eleitoral, afixado numa árvore em frente à aldeia do Lonundo, a meio caminho entre as capitais do Huambo e do Bié. Em pleno centro de Angola, o bairro tem cerca de 350 pessoas, das quais 138 em condições de votar e há ainda mais 17, com cartão de eleitor, que aguardam pela lista actualizada da Comissão Nacional Eleitoral (CNE).

Com o ensino primário concluído, há três anos que vive de subir às árvores para tirar o mel das colmeias tradicionais, ou "londe", feitas de cordas, capim e madeira, dos mais 87 apicultores locais. São oito e meia, e Virgílio confirma o nome na lista, podendo assim estrear-se a votar. “Foi emocionante para mim ler o meu nome na lista. É a primeira vez que vou votar”, conta.

Nasceu quatro anos antes de terminar a guerra civil, precisamente numa zona onde o conflito angolano mais se fez sentir e onde, contam os mais velhos da aldeia, "muita gente morreu". Hoje, vai votar. “Já me ensinaram que tenho de ir lá, pegar no boletim de voto e colocar a cruz no partido que quero, sem dizer a ninguém. Estou nervoso, mas acho que vai correr bem e já sei em quem votar", diz, enquanto arranja o gorro, ou não fosse o cacimbo de 2017 um dos mais rigorosos dos últimos anos, com temperaturas abaixo dos 10 graus centígrados no planalto central angolano. E talvez por ser novo, não perceba, como Domingos Jamba, 51 anos, a importância real da data.

Uma tarja colocada pela CNE, presa a uma árvore, assinala que no bairro do Lonundo, município do Cachiungo, estará nesta quarta-feira a assembleia de voto angolana n.º 4.475, improvisada numa tenda.

“É tudo a correr na paz. Estamos aqui a guardar o pano [a tarja da CNE], os mais novos não têm mais nada para fazer e à noite ficam por aqui”, explica Jamba, chefe dos apicultores do Lonundo, terra de mel, sustento de quase todas as famílias.

Numa aldeia de casas construídas em adobe, algumas adornadas com chapas para proteger da chuva, electricidade não há e água só do poço. Ainda assim, fome não se passa e cada família tem uma lavra nas traseiras da aldeia, em que pelo menos milho e verduras estão garantidos, juntamente com galinhas e outros animais. Depois há ainda o mel, vendido cada frasco de 1500 kwanzas (€7,50) pelas mulheres mais jovens da aldeia junto à estrada.

A Comissão Nacional Eleitoral de Angola constituiu 12,512 assembleias de voto, que incluem 25,873 mesas de voto, sobretudo a serem instaladas em escolas, mas também em tendas improvisadas, como em Lonundo. Há  9.317.294 eleitores em condições de votar.

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