Sai Spicer, entra o falcão Scaramucci, disposto a tudo para defender Trump

Novo director de comunicação da Casa Branca não tem experiência mas aproximou-se do Presidente enquanto angariava dinheiro na campanha. Entretanto, tornou-se um dos seus maiores defensores nos talk-shows.

Fotogaleria
Spicer tinha a seu cargo os briefings diários na Casa Branca Kevin Lamarque/Reuters
Fotogaleria
Scaramucci vem de Nova Iorque e é muito próximo da família Trump Ruben Sprich/Reuters

Aceitou mentir, foi sucessivas vezes desmentido no Twitter e enganado, mentindo sem saber que o fazia, resumiu Brianna Keilar, jornalista da CNN. Seis meses atribulados que acabaram de forma algo surpreendente: o porta-voz da Casa Branca, Sean Spicer, demitiu-se por discordar com a escolha de Donald Trump para seu superior, o novo director de comunicação, Anthony Scaramucci, um investidor de Wall Street sem qualquer experiência em… comunicação.

A manhã foi de caos, mas como notaram muitos observadores, “caos” é uma palavra que define bem o que tem sido a vida na Casa Branca de Trump. Às 10h (15h em Portugal continental), Anthony Scaramucci era convidado pelo Presidente para um cargo deixado vazio em Maio. O convite, prontamente aceite, foi feito à frente do chefe de gabinete de Trump, Reince Priebus, e do próprio Spicer. Segundo a imprensa americana, ambos já tinham deixado claro discordar desta escolha.

Depois dos parabéns e abraços da praxe ao recém-nomeado, Spicer relembrou Trump que “discorda veementemente” desta escolha e apresentou a sua demissão. O Presidente, que muitas vezes se disse estar prestes a despedir Spicer, desta feita pediu-lhe que ficasse. Oficialmente, o veterano porta-voz do Comité Nacional Republicano quis permitir “um começo limpo” ao gabinete de comunicação desta Administração.

“Adoro o Presidente” ("I love the Presidente") foi a frase mais repetida por Scaramucci quando finalmente se apresentou na sala de imprensa da Casa Branca, onde dezenas e dezenas de jornalistas esperavam por ver alguém atrás do pódio. Primeiro, anunciou que a “número dois” de Spicer, Sarah Sanders, substitui Spicer como porta-voz. Depois, Scaramucci respondeu a perguntas de quase todos os correspondentes presentes, tratando-os pelo primeiro nome e demonstrando estar o mais à vontade possível.

Um homem de Nova Iorque, como Trump, sem experiência política, Scaramucci defendeu que tudo o que fez na vida tem a ver com comunicação, pelo que se sente pronto para assumir estas importantes funções – desde Maio, quando o veterano estratega republicano Mike Dubke se demitiu que Spicer acumulava o cargo de porta-voz com o de director de copmunicação.

Mais importante, disse Scaramucci, está habituado a “lidar com fricções”, “crises” ou “mudanças”. “Sou um empresário”, lembrou várias vezes. E acima de tudo, “o Presidente é fenomenal com a imprensa” e “tem realmente um bom karma”, afirmou o homem que se descreve como “super-optimista”. “Adoro o Presidente, adoro o meu país. Adoro esta equipa.” Vai correr tudo bem.

Crises e mais crises

Quando Mike Dubke se demitiu, “por razões pessoas”, tinha Trump acabado de cumprir três meses de presidência e o momento já era descrito como de “sucessão de crises”, como a aberta pela demissão de James Comey de director do FBI ou de Michael Flynn, que deixou o cargo de conselheiro de segurança do Presidente por ter dado "informações incompletas" sobre as suas conversas com o embaixador russo.

Agora, sai Spicer quando a Administração prepara um contra-ataque para conseguir lidar com vários inquéritos sobre uma alegada conspiração entre a campanha de Trump e Moscovo destinada a prejudicar as hipóteses da candidata democrata, Hillary Clinton.

Outra demissão, enterrada em notas de rodapé pela saída de Spicer, ocorreu apenas horas antes, quando Mark Corallo deixou as funções de porta-voz da equipa legal de Trump. Isto logo depois de o chefe de Estado ter substituído o seu advogado pessoal de décadas, Marc Kasowitz, por John M. Dowd, ex-procurador em Washington que se especializou em crime de colarinho branco.

Independentemente do ambiente que se vive na Casa Branca – segundo o New York Times e o Washington Post – a Administração tenta agora por todos os meios minar o trabalho do conselheiro especial Robert Muller, nomeado para investigar possíveis interferências russas nas eleições de Novembro, a saída de Spicer e a entrada de Scaramucci reforça o lado “pessoal” da Administração. À espera de um cargo desde a campanha, Scaramucci passou os últimos seis meses a defender Trump nos programas de televisão e aproximou-se tanto do Presidente como da sua filha, Ivanka, e genro (e principal conselheiro do Presidente), Jared Kushner.

Scaramucci, de 53 anos, é um “guerreiro”, “killer”, como Trump o descreve, um falcão que conhece as posições de Trump porque se especializou em defendê-las. Trump queria-o por perto: inicialmente, chegou a pensar-se que seria nomeado para liderar o Gabinete de Assuntos Intergovernamentais; desistiu por possíveis conflitos de interesses. Para além de trabalhar na campanha, colaborou também na transição.

É provavelmente verdade

“Se o Presidente o disse é provavelmente verdade”, respondeu Scaramucci quando interrogado sobre a alegação de que milhões de pessoas sem documentos votaram em Hillary Clinton, uma frase repetida à exaustão por Trump. Não foi um bom começo para quem valoriza a verdade e o rigor, dir-se-ia. Foi um óptimo arranque na Administração de um Presidente que detesta ser contrariado e adora ser elogiado.

Depois de um primeiro momento de surpresa, a maioria dos comentadores e analistas americanos admitiu que nunca acreditou que Spicer durasse tanto tempo. “Devia ter-se despedido no primeiro dia”, quando o Presidente lhe encomendou um sermão aos jornalistas sobre o que devem cobrir e o tamanho da multidão que se reuniu em Washington para a sua tomada de posse, defendeu Jennifer Palmieri, ex-directora de comunicação de Barack Obama.

A substituta de Spicer, Sanders, leu um breve comunicado de Trump: “Estou grato ao Sean pelo seu trabalho em defesa da minha Administração e do povo americano. Desejo-lhe sucesso em novas oportunidades. Reparem só nas suas audiências televisivas”. De facto, graças à insistência de Spicer em defender o Presidente, por mais absurda que fosse qualquer das suas posições, os seus briefings diários tornaram-se recordistas de audiências – ao mesmo tempo que a personagem que lhe foi dedicada no programa Saturday Night Live (interpretada por Melissa McCarthy) somava fãs

 

 

 

 

 

Sugerir correcção
Ler 13 comentários