Quem semeia Ciência colhe crescimento?

Será que o aumento de investimento em I&D, por si só, alavancará o crescimento? Dificilmente.

A influência do desenvolvimento cientifico-tecnológico no crescimento económico não é uma questão recente no debate público. Um dos modelos mais famosos em economia, assinado por Robert Solow, introduz o avanço tecnológico como um fator explicativo que não é determinado pelas escolhas das pessoas e empresas. Isto significa que o avanço tecnológico deveria surgir fora do sistema económico.

Contudo, o progresso tecnológico foi, mais tarde, entendido como algo intrínseco ao processo de decisão na economia. Acredita-se assim que não se pode gerar crescimento dissociando essas decisões da produtividade e da evolução tecnológica.

Para muitos (incluindo eu), a Ciência, Inovação e Tecnologia têm um papel catalisador na regeneração da dinâmica económica — a conhecida “destruição criativa” de Schumpeter.

De forma similar à “seleção natural” de Darwin, o processo de criação e incorporação de novo conhecimento reorganiza a balança de poder competitivo entre países, setores e empresas, gerando preços e custos de produção mais baixos.

Porém, a realidade nem sempre traduz esta dinâmica. A relação causal entre Investigação & Desenvolvimento e produtividade não é tão evidente hoje como no passado. Em várias sociedades modernas, verificamos que, apesar do elevado e rápido progresso científico-tecnológico, a economia não é capaz de traduzir esse avanço em ganhos de produtividade — algo que muitos apelidam de “paradoxo da produtividade”.

Como podemos comprovar, então, um impacto positivo no crescimento e produtividade e concretizá-lo em larga escala? Depende dos indicadores que escolhermos. Depende do valor que procurarmos criar. 

O início de uma política de Ciência em Portugal remonta ao final dos anos 60, tendo sido, em muito, estimulada pela OCDE e pela adesão à CEE. Ao longo do tempo, Portugal tem-se aproximado da média comunitária naquele que muitos consideram o indicador-chave: o investimento global em I&D (em % do PIB). Em 2015, este correspondia a 1,2%, estando a 0,7 pontos percentuais da média das congéneres europeias.

O FMI, por sua vez, crê que “semear verde para colher maduro” é a forma mais eficaz de garantir que o paradoxo da produtividade é quebrado. A instituição prevê que se as empresas portuguesas aumentassem de 0,6% para 0,8% aquilo que investem em I&D, o PIB luso poderia crescer cinco pontos percentuais, combatendo a célebre “armadilha do baixo crescimento”.

Todavia, um relatório publicado pela OCDE, em Maio, sobre o impacto das reformas estruturais na produtividade alerta que as medidas que estimulam a inovação são verdadeiramente benéficas apenas para empresas num nível produtivo mais elevado (0,1% do universo empresarial).

Portanto, será que o aumento de investimento em I&D, por si só, alavancará o crescimento? Dificilmente.

O European Innovation Scorecard, criado pela Comissão Europeia, analisa diversos indicadores e orienta como deve cada país apostar no setor científico-tecnológico. Ainda que integre o lote de “inovadores moderados”, Portugal precisa de patentear mais produtos. Carece de sinergias para aumentar o número de trabalhos para co-publicação científica de investigação público-privada. Tem falta de capital para desenvolver o seu tecido empreendedor.

Que solução temos então para alavancar o impacto no crescimento? A meu ver, o rigor científico não pode ser exclusivo de um laboratório ou de uma revista internacional. Temos, por isso, de maximizar o valor acrescentado da Ciência e Tecnologia em duas vertentes.

Em primeiro lugar, enquanto ferramenta para a construção de políticas públicas adequadas. Por exemplo, a nível europeu, foi criado o Mecanismo de Aconselhamento Científico. Este painel tem orientado os decisores políticos na conceção de medidas mais eficazes em temas vitais como a cibersegurança ou as emissões de CO2. Na Estónia, o conceito de “e-residência” ilustrou como o setor público também se pode posicionar estrategicamente e inovar, gerando eficiência e prosperidade.

Por outro lado, na afirmação da chamada "diplomacia científica". Casos como os programas SESAME e PRIMA demonstram como o propósito e valores da Ciência não são reféns de variáveis económicas ou geopolíticas e aproximam nações no âmbito de desafios comuns. Cientistas e inovadores podem e devem, portanto, definir o futuro como só eles sabem: usando evidência científica de ponta, mobilizando novas vontades políticas. Porém, a responsabilidade de alcançar esta massa crítica deve partir, sobretudo, das instituições.

Apesar da dificuldade em medir os custos e benefícios associados a políticas públicas de Ciência, bem como o seu alcance geográfico e temporal, a verdade é que minimizar a distância à fronteira tecnológica e construir uma verdadeira sociedade baseada no conhecimento não é apenas uma questão de infraestrutura ou capital. É, maioritariamente, uma questão de motivação política.

Dizia Shimon Peres que “o valor de um país não é, nem nunca será, medido pelos m2 de território, mas pelo número de cientistas por m2”. Uma visão necessária para que se procure cada vez mais semear Ciência — na esperança de colher crescimento.

O autor escreve segundo as normas do novo Acordo Ortográfico

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