Morreu John G. Avildsen, o homem que fez de Stallone Rocky

Realizador de Rocky e O Momento da Verdade, interessado em filmes sobre gente normal apanhadas em circunstâncias excepcionais, morreu em Los Angeles, aos 81 anos de idade.

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Rocky valeu a Avildsen o Óscar de melhor realizador em 1977 DR
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Sylvester Stallone foi argumentista e protagonista de Rocky DR

A notícia da morte do realizador John G. Avildsen, aos 81 anos de idade, surge num momento em que a sua carreira era celebrada por um documentário com um título que a resume na perfeição: King of the Underdogs (“O Rei dos Fracos e Oprimidos”). Ao longo de um percurso iniciado como assistente de realização para Arthur Penn ou Otto Preminger, Avildsen foi regularmente atraído por histórias de gente que sonhava mais alto, corria riscos, triunfava contra todas as expectativas. E nenhum filme resume isso melhor do que o que lhe deu o Óscar de melhor realizador em 1977: Rocky, a história da ascensão do boxeur de Filadélfia escrita e interpretada por Sylvester Stallone.

A United Artists pensara em atribuir o papel principal de Rocky a uma vedeta como Robert Redford ou Burt Reynolds, mas Stallone, que escrevera o guião – e que mais tarde disse que nunca se perdoaria se o filme tivesse sido um sucesso com outro actor –, suplicou que lhe dessem uma oportunidade. Feito com um pequeno orçamento e sem nomes de peso no elenco, Rocky tornou-se num êxito, venceu três Óscares (melhor filme, realizador e montagem) e lançou o actor para uma carreira que ainda hoje continua. Stallone fez questão, aliás, de agradecer a Avildsen em comunicado de imprensa: “Mudou a minha vida, e estarei sempre em dívida para com ele”.

A personagem de Rocky Balboa tornar-se-ia numa das mais populares do cinema americano, regressando posteriormente em seis outros filmes. Mas Avildsen, como revelou numa entrevista de 2016 ao jornal Baltimore Sun, inicialmente não mostrou grande interesse – “foi um amigo que me enviou o guião e eu disse-lhe que não tinha especial interesse em boxe, mas ele tanto insistiu que acabei por o ler. E à terceira página, quando Rocky está a falar com as tartarugas, fiquei encantado. E disse que sim.”

Foi, para citar o título português de outro dos seus filmes, o “momento da verdade” para o realizador, que tinha até aí uma carreira discreta mas marcada pelo seu interesse em histórias banais da América real, e pelo seu à-vontade com os actores, iniciada em pleno ponto alto da contra-cultura jovem.

Peter Boyle tivera um dos seus papéis mais importantes em Joe (1970), pequena sensação independente, sobre um operário reaccionário tornado em justiceiro por conta própria, onde Susan Sarandon teve igualmente um dos seus primeiros papéis; e Jack Lemmon vencera o Óscar como um homem de negócios numa encruzilhada moral em Sonhos do Passado (1974). Mas Avildsen passou ao lado de dois outros filmes-chave dos anos 1970: foi substituído por Sidney Lumet aos comandos de Serpico (1973) e por John Badham na realização de Febre de Sábado à Noite (1977), em ambos os casos por desentendimentos com os produtores.

Avildsen nunca se libertou da sombra de Rocky e os filmes que dirigiu em seguida ficaram aquém das expectativas: Um Amor em Nova York (1978), um melodrama realista com Paul Sorvino; A Fórmula (1980), policial com (o então já recluso) Marlon Brando, George C. Scott e John Gielgud; e Mas que Vizinhos (1981), comédia negra com John Belushi e Dan Aykroyd.

De certo modo, foi Rocky que o voltou a salvar, já que The Karate Kid, em português O Momento da Verdade (1984), foi descrito pelo próprio realizador como “The KaRocky Kid”: um jovem humilhado pelos novos colegas de liceu (Ralph Macchio) aprende artes marciais com um jardineiro japonês (Pat Morita). Avildsen assinaria as duas sequelas do filme, em 1986 e 1989, e regressou também ao boxeur de Filadélfia realizando Rocky V (1990), mostrando-se no entanto desiludido com a pressão do estúdio para mudar o final. (No guião original de Stallone, Rocky morria no fim, mas a MGM recusou, alegando que gente como Rocky, James Bond ou Batman “nunca morre”. “Rocky não morreu, mas o filme afundou-se.”)

Progressivamente mais afastado de uma Hollywood que parecia apostar menos nas pequenas histórias de personagens realistas em que se especializou, Avildsen terminou ingloriamente carreira dirigindo Jean-Claude van Damme em O Uivo do Coiote (1999), onde retirou o seu nome do genérico. Mas conseguiu ainda assinar alguns filmes que remetiam para os anos 1970 que o celebrizaram, como Confia em Mim (1991), a história verídica de um professor que dá a volta a uma escola de um bairro negligenciado, que foi um dos primeiros grandes papéis de Morgan Freeman, ou 8 Seconds (1994), biografia do cowboy profissional Lane Frost.

Embora já não filmasse há mais de 15 anos, Avildsen não abandonara a esperança de voltar a dirigir. Morreu na sexta-feira, aos 81 anos de idade, de cancro pancreático.  

 

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