Guarda de filhos: queixas contra psicólogos preocupam Ordem

Francisco Miranda Rodrigues diz que é preciso "prevenir práticas que possam não ser as mais adequadas" como aquelas em que os psicólogos tomam o partido de uma mãe ou de um pai num divórcio litigioso.

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"Essencialmente preocupa-nos prevenir práticas que possam não ser as mais adequadas", diz Miranda Rodrigues. Francisco Miranda Rodrigues

Em 2016, houve 110 processos instruídos na Ordem dos Psicólogos, isto é, queixas contra profissionais que chegaram e não foram liminarmente arquivadas. Muitas dizem respeito a situações em que os psicólogos, em processos de divórcio litigiosos, fazem pareceres que o tribunal utiliza para decidir a quem atribuir a guarda dos filhos.

Há novos desafios para os psicólogos com mudanças na família tradicional e o debate sobre o género ou a mudança de sexo?
Sim, precisamente. E vão surgir outros, com as questões da morte assistida. Há muitas situações que colocam dilemas éticos. São as transformações sociais ou são situações com que os profissionais sempre lidaram, mas que não eram faladas nem mediatizadas e agora passaram a ser. Hoje em dia as redes sociais permitem que tudo seja publicitado, o que cria novos desafios, até para a forma como se comunica.

A maioria das queixas relativas a psicólogos continua a ser em situações de disputa pela guarda dos filhos?
Continua a ser 25% das queixas [que chegam à Ordem dos Psicólogos].

Existem situações em que um pai ou uma mãe instrumentaliza os psicólogos em disputas pela guarda dos filhos?
Sim.

Em Janeiro do ano passado a Ordem emitiu um parecer com orientações para lidar com estes casos. É suficiente?
Em Setembro vamos avançar com formação nessa área, disponível para todos os psicólogos a nível nacional, para garantirmos uma melhoria gradual das competências dos psicólogos. O parecer é um documento que os psicólogos devem ler e seguir, mas não é algo que seja trabalhado com os psicólogos e, por isso, avançámos com esta formação em larga escala.

Houve necessidade de fazer mais alguma coisa?
Sim. Há qualquer coisa que não está bem entre os profissionais para haver tantas queixas relacionadas com isto. Há sempre coisas a melhorar, se há um indicador destes [tantas queixas ligadas a processos de regulação do poder paternal], há que melhorar. Essencialmente preocupa-nos prevenir práticas que possam não ser as mais adequadas.

E perante uma criança ou um jovem que queira mudar de sexo, o que deve o psicólogo fazer?
O papel do psicólogo será sempre de promover o autoconhecimento e a reflexão sobre o seu desenvolvimento, de modo a que à medida que as tarefas psicossociais do estádio em que se encontram se vão realizando haja um compromisso entre [o que são] objectivos realistas e [o] sentir-se ele ou ela próprio/a no meio e contextos onde se insere. Paralelamente, é necessário que se avalie a relevância e o significado, se clínico, do sofrimento associado à incongruência de sexo de nascença (o atribuído) e a identidade de género. Esta também é a posição defendida, por exemplo, pela American Psychological Association.

Com que idade é que o jovem deve poder tomar a decisão sozinho [em Portugal a lei só permite mudanças de sexo após os 18 anos]?
A idade legal, seja ela qual for, não é sinónimo absoluto de maturidade emocional e de identidade consolidada. Em todas as idades poderá colocar-se esta questão. Na adolescência constrói-se a identidade, nomeadamente a sexual. Daqui pode decorrer mais sofrimento, caso a afirmação dessa identidade não seja possível seja em que idade for.

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