Acordo entre May e os unionistas irlandeses quase pronto mas já alvo de críticas

Primeira-ministra britânica pressionada para definir o que quer o Reino Unido no processo de negociação com a União Europeia.

Foto
Macron e May em Paris PHILIPPE WOJAZER/Reuters

O calendário tinha sido feito para que tudo corresse sobre rodas: Theresa May iria a Paris encontrar-se com Emmanuel Macron, ela reeleita, ele recém-eleito, antes do início das negociações da saída do Reino Unido da União Europeia, a 19 de Junho. A ida de May a Paris seria o ponto alto do dia de terça-feira.

Mas as eleições que a primeira-ministra britânica convocou e que lhe retiraram a maioria parlamentar deixaram tudo ao contrário: a reunião dos dois líderes acabou por ser um episódio lateral num dia em que as atenções se concentraram no encontro, de manhã, da primeira-ministra com a líder do DUP, Partido Democrático Unionista da Irlanda do Norte, Arlene Foster – esperava-se um acordo em que o DUP prometesse apoio ao governo minoritário dos conservadores.

Pressionada em termos de tempo por ter de estar presente numa sessão para a eleição do speaker da Câmara dos Comuns, May saiu do encontro com Foster após duas horas sem prestar declarações.

Já a líder do DUP declarou no Twitter: “As conversações com o governo estão a correr bem e esperamos chegar com sucesso a uma conclusão em breve”. O DUP deverá apoiar um governo minoritário de May e segundo a BBC “não há questões pendentes” que possam impedir a finalização do acordo.

A editora de política da BBC, Laura Kuenssberg, notava que no Parlamento deputados brincavam dizendo que o acordo com o DUP estava conseguido desde o fim-de-semana passado, mas que o partido da Irlanda do Norte estava a viver o seu momento debaixo dos holofotes. As negociações continuaram entre equipas dos dois partidos, e a BBC dizia que o acordo deverá ser assinado esta quarta-feira.

A falta de acordo fez com que o Discurso da Rainha, em que são lidas as prioridades do Governo, tivesse de ser adiado: deveria ser na próxima segunda-feira e não tem ainda data marcada.

A par da pressão interna também a União Europeia quer definição, quando a primeira reunião para o processo de saída está marcada para segunda-feira.

O responsável do Parlamento Europeu para as negociações do “Brexit”, o liberal belga Guy Verhofstadt, afirmou no Twitter que os responsáveis europeus “esperam com impaciência a posição negocial do Governo do Reino Unido". Concluiu: “A actual incerteza não pode continuar”.

O tipo de “Brexit” que o novo Executivo vai defender em negociações ainda não é claro. Há quem diga que com esta votação May perdeu o mandato para um hard Brexit, mas há quem veja sinais diferentes nas várias nomeações desta terça-feira.

Entre algumas promoções para a nova equipa de governo estavam defensores da manutenção do Reino Unido na União Europeia, aponta a BBC, o que fez esperar mais um passo na direcção de uma saída que seja menos focada na decisão de abandonar o mercado único e a união aduaneira (como contrapartida para o controlo da imigração) e mais na manutenção de uma relação económica com a UE.

Já a nomeação esta terça-feira de um acérrimo defensor da saída, Steve Baker, para secretário de Estado para o “Brexit” foi vista com interpretações contrárias. Enquanto os Liberais Democratas a criticaram como um passo na direcção de “uma saída radical”, o diário The Guardian defendia que “é tão provável, ou mais, que May tenha nomeado Baker na esperança de que este consiga convencer os seus colegas radicais das cedências que terão provavelmente de ser feitas”.

Major diz que acordo é perigoso

A sessão da Câmara dos Comuns foi palco para mais um ataque do líder trabalhista Jeremy Corbyn, que disse esperar com expectativa o Discurso da Rainha quando estiver pronta a “coligação do caos”, referindo-se ao acordo com o DUP. Corbyn terminou o seu discurso com uma boutade: se os conservadores não conseguirem formar governo, o Partido Trabalhista poderá providenciar um executivo “forte e estável” (a expressão foi o mantra eleitoral de May).

O acordo com o DUP foi criticado por John Major, o antigo primeiro-ministro conservador. Primeiro, argumentou Major, um acordo não seria necessário porque seria já muito pouco provável que este  partido fizesse cair o Governo. Segundo, outras partes do Reino Unido não vão gostar se a Irlanda do Norte conseguir mais financiamento no âmbito do acordo.

Mas a principal razão é, para Major, o potencial efeito no processo de paz na Irlanda do Norte, onde o acordo que acabou com a violência já tem 30 anos e onde de momento não há um executivo a funcionar. “A paz não é um dado adquirido”, avisou Major.

Pouco depois, o partido nacionalista irlandês Sinn Féin classificou o acordo com Foster como “muito perturbador”: “As pessoas estão preocupadas com o tipo de promessas que o DUP pode conseguir de Theresa May”, disse a deputada Michelle Gildernew.

Sugerir correcção
Comentar