O momento do desporto

Em 2017 há a oportunidade de uma reforma profunda do desporto.

Urge a reforma do desporto de ataque à inactividade física da população e da juventude. A literacia desportiva nacional está amarrada a cem anos de atraso em relação à Europa. O nível do desporto português é mais elevado do que era no século XX; porém, os outros países europeus, alguns menos ricos que Portugal, conseguem realizar mais e bater-se pelo centro da produtividade desportiva europeia.

No desporto fazem-se medidas avulsas. No início dos anos 90, houve a excepção do ex-ministro da Educação, Roberto Carneiro, ao aceitar propostas do ex-director-geral dos Desportos, Mirandela da Costa. Foi criada a Lei de Bases do Sistema Desportivo e o Programa Integrado de Desenvolvimento Desportivo. Depois, o programa foi atropelado pelos fundos comunitários e a lei de bases diluiu-se ao futebol, que lhe chamou sua e brinca sozinho. No final dessa década o país candidatou-se ao Campeonato Europeu de Futebol de 2004 e organizou-o com inesquecível sucesso. Nessa altura a geração de Luís Figo passou o testemunho à geração de Cristiano Ronaldo, a qual ganhou o Euro2016. O futebol do pequeno-país surfou as “ondas da Nazaré” e, em mares encrespados, as outras modalidades estão incomodadas e dizem-se defraudadas.

A desgovernação nacional é patente na comparação com organizações internacionais. A federação mundial de râguebi financia as ilhas Fiji, que têm 860.000 habitantes e classificam-se entre as principais do râguebi mundial. Há alguns anos, a direcção da federação de Fiji endividou-se e houve a ameaça de suspensão dos apoios mundiais. O râguebi das Fiji corrigiu o seu comportamento conforme indicado pelo râguebi mundial. Aqui ao lado, a federação de râguebi apresentou resultados medíocres e a política apontada pelo Conselho Superior do Desporto de Espanha foi a saída da direcção da federação, sob pena de retirada do apoio público. A federação mudou a direcção e participou nos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro em 2016.

A administração pública do desporto foi falindo, faliu. Os partidos são os responsáveis. Há líderes que se dizem oriundos de organizações (cujo nome não se pode dizer) que criam uma aura aos nomeados. A norma é que a nulidade de criação de valor desportivo pelo nomeado arrasta o brilho da insigne organização na água do banho e o desporto segue o seu calvário.

Portugal tem uma má política de desporto. Os governos destroem oportunidades legislativas, esta vai a meio, e a oposição aborda a violência no futebol para mostrar trabalho-apressado-a-pedido-do-Canelas-fute. Cada ano, o Estado actua com o orçamento mais barato e o país mantém a divergência desportiva da Europa.

Em 2017 há a oportunidade de uma reforma profunda do desporto, principalmente se houver o golpe de asa de nomear um líder notável quanto ao currículo, à capacidade de liderança e à disponibilidade para galvanizar o país pela reforma do desporto. Caberia a esse líder criar, até ao fim da legislatura, pelo menos três projectos visando a convergência nacional com a média da produtividade desportiva europeia.

O primeiro projecto seria fundir numa única as organizações da administração pública central dedicadas ao desporto, como o Instituto Português do Desporto e da Juventude, a Fundação do Desporto, a parte desportiva da Fundação Inatel, o Desporto Escolar e o Conselho Nacional de Desporto. A nova organização pública combateria a fragmentação da política desportiva, ganharia presença nacional e contribuiria para o consenso entre os parceiros para a visão, os objectivos e as metas do desporto nacional.

O segundo projecto promoveria, ao nível do associativismo desportivo, a agregação do Comité Olímpico de Portugal, da Confederação do Desporto de Portugal e do Comité Paralímpico de Portugal enquanto futura organização de regulação privada do mercado do desporto. O terceiro projecto resolveria o fracasso do financiamento público ao desporto nacional. Numa próxima oportunidade tratarei da origem da crise e da necessidade de características inovadoras do financiamento ao desporto.

Os governos passam nus e altivos. Não têm arte para que a sua legislatura marque o século desportivo. Se há sector onde há reformas profundas e complexas para fazer, esse sector chama-se desporto. É um trabalho da mais pura filigrana e de respeito pelos portugueses.

 

Sugerir correcção
Comentar