Imigrantes chegam com melhor saúde do que quem já vive em Portugal

Estado de saúde tende a piorar com a permanência em Portugal, indicam os estudos do Instituto de Higiene e Medicina Tropical que serão apresentados nesta quinta-feira na Gulbenkian.

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Os níveis de educação têm influência no estado de saúde dos migrantes, segundo os estudos do Instituto de Higiene e Medicina Tropical DAVID CLIFFORD/ARQUIVO

Os imigrantes que chegam a Portugal reportam um melhor estado de saúde do que quem já cá vive. No entanto, com o passar do tempo, a tendência é aproximarem-se dos níveis de saúde dos portugueses. Estas são duas das principais conclusões de vários estudos desenvolvidos pelo Instituto de Higiene e Medicina Tropical (IHMT) da Universidade Nova de Lisboa e que vão ser divulgados nesta quinta-feira, em Lisboa, no âmbito do Seminário Migração e Saúde.

A investigadora do IHMT responsável por estes trabalhos que serão apresentados na Fundação Calouste Gulbenkian, Sónia Dias, explica ao PÚBLICO que estes dados “contrariam a ideia socialmente concebida de que os migrantes são uma ameaça à saúde das populações, que trazem doenças e que são um peso para os serviços de saúde”.

Cerca de 65% dos migrantes que vivem em Portugal dizem ter um bom estado de saúde. Nos portugueses este valor cai para 43%. A especialista diz que estes dados não são inéditos e que se integram num conceito a que têm chamado de “efeito do migrante saudável”. “A decisão de migrar para um país desconhecido e procurar um novo emprego é uma aventura ambiciosa e normalmente são as pessoas saudáveis e com características de empreendedorismo que migram”, acrescenta.

Estudo sem dados dos refugiados

Sónia Dias ressalva que estes trabalhos incluem dados de migrantes dos países africanos de língua portuguesa, do Brasil e da Europa de Leste, mas não incluem ainda avaliações dos movimentos mais recentes de refugiados. As investigações têm permitido perceber que, à semelhança do que acontece com os portugueses, há uma relação clara entre o estado de saúde e alguns indicadores, como o rendimento, a educação, o emprego e as condições de habitação. Foram avaliados dados referentes a 20 anos e a várias faixas etárias. Em todas há uma tendência de aproximação do estado de saúde com que chegam – e que é melhor – ao dos portugueses, que é pior.

“Há duas vezes mais probabilidade de um migrante com educação superior ou maior rendimento reportar um bom estado de saúde”, diz a professora do IHMT, reforçando que “não é a condição de ser migrante que influencia o estado de saúde mas muito mais as questões relacionadas com a pobreza”. Por isso, alerta que é muito importante “apostar em medidas políticas de integração” destas populações. Um trabalho recentemente apresentado, que se focava nas questões do VIH/sida nos migrantes e que o PÚBLICO noticiou, já indicava que o problema da infecção era superior nas populações desfavorecidas.

Sónia Dias destaca outros dados que merecem atenção. Por exemplo, 23% dos imigrantes nunca acederam aos serviços de saúde em Portugal. Esta barreira existe sobretudo entre os indocumentados e demonstra que é necessário dar mais informação a este tipo de população. Por outro lado, os migrantes reportam problemas semelhantes aos referidos pelos portugueses: tempos de espera elevados e demasiados procedimentos burocráticos. Mas a investigadora também considera que há quem não aceda precisamente porque chega com um bom nível de saúde “e porque nesta fase de mudança as prioridades podem ser outras”. A pouca protecção laboral também explica a dificuldade em articular o trabalho com a ida ao médico.

Os trabalhos do IHMT também se debruçaram sobre os profissionais de saúde. As principais conclusões mostram que estes profissionais sentem que tem poucos conhecimentos e competências para lidar com pessoas com uma diversidade cultural tão distinta e defendem a necessidade de receberem uma formação específica.

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