Novas drogas já conseguiram entrar nas cadeias

Quantidade de novas substâncias diminuiu, mas o perigo não desapareceu. Novos opióides, por exemplo, são considerados “uma séria ameaça para a saúde individual e pública”. Relatório Europeu sobre Drogas 2017 é apresentado nesta terça-feira, em Bruxelas.

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Nuno Ferreira Santos

Está a abrandar o ritmo de descoberta de novas substâncias psicoactivas. No ano passado, o Sistema de Alerta Rápido da União Europeia (UE) detectou, em média, uma por semana. Só que estão mais disponíveis do que nunca no mercado europeu e já conseguem entrar até nos sítios mais difíceis de penetrar, como as cadeias, alerta o Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência (OEDT), no relatório anual que apresenta no final da manhã desta terça-feira em Bruxelas.

A ligeira redução de novas drogas detectadas — de 98, em 2015, para 66, em 2016 — não descansa as autoridades. A disponibilidade de substâncias psicoactivas no mercado europeu continua elevada. No final do ano passado, o OEDT contava 620 novas. Três anos antes, não ia além das 350. 

Só em 2015, os 28 países da UE, a Noruega e a Turquia fizeram, no conjunto, cerca de 80 mil apreensões. São valores tidos como mínimos, uma vez que não existem sistemas de monitorização, apenas o que resulta de factores como “o conhecimento de novas substâncias, a alteração do seu estatuto legal, as capacidades e prioridades de aplicação da lei e as práticas de notificação das autoridades”.

Há, nalguns Estados-Membros, “um enquadramento jurídico mais restritivo, que torna mais difícil aos produtores envolverem-se num ‘jogo do gato e rato’ com os reguladores”. E as medidas de controlo reservadas aos laboratórios que fabricam novas substâncias na China “também podem estar a contribuir” para a redução. Afinal, é de lá que vem grande parte das novas drogas que entram na Europa, “onde são transformadas em produtos, embaladas e vendidas”.

A par do Relatório Europeu sobre Drogas 2017: tendências e evoluções, o OEDT apresenta nesta terça-feira o caderno sobre Consumo de drogas de alto risco. Debruça-se sobre o consumo problemático em grupos considerados vulneráveis, como utilizadores pela via injectável, reclusos, pessoas em situação de sem abrigo.  

Um problema sério em algumas prisões

O uso de novas drogas nas prisões é recente, mas está a crescer depressa. Há indícios de que já se tornou um problema sério nas prisões do Reino Unido, que já é um problema nas da Hungria, da Letónia, da Polónia, da Eslovénia e da Suécia e que já aparece nas da Bulgária, da Croácia, da República Checa, da Alemanha, da Irlanda, da Finlândia, da França, de Portugal e da Roménia.

As estimativas de prevalência nos países que forneceram dados sobre este aspecto oscilam entre menos de 2% em Portugal a mais de 30% em algumas prisões do Reino Unido. “Há indícios de que o uso de novas substâncias psicoactivas pode ser mais elevado nas prisões dos homens do que em mulheres, superior nas prisões preventivas e inferior em prisões de alta segurança”, relata o caderno sobre Consumo de drogas de alto risco.

Que novas substâncias psicoactivas são estas que estão a conquistar adeptos um pouco por toda a Europa? Sobretudo canabinóides sintéticos, que se apresentam como uma alternativa à cannabis (mais de 160 detectadas, 11 das quais em 2016). Desde 2008, produtores europeus importam pós e “misturam-nos com matéria vegetal seca, a fim de criar centenas de ‘drogas legais’”. Com o tempo, começaram a comercializar esta droga também em pó, comprimidos e líquidos.

“Séria ameaça para a saúde”

De acordo com o estudo, os canabinóides sintéticos chegam a grupos de alto risco, incluindo reclusos, em dois terços dos países analisados (Portugal, Bélgica, Bulgária, Croácia, República Checa, Finlândia, França, Alemanha, Grécia, Hungria, Irlanda, Itália, Letónia, Polónia, Roménia, Eslovénia, Suécia, Reino Unido).

Na lista de novas drogas, seguem-se as catinonas sintéticas (mais de 100, 14 das quais detectadas em 2016). Esta substância está relacionada com a catinona, “um estimulante que ocorre na planta khat”, e tem efeitos semelhantes às drogas estimulantes, como a cocaína. Desde 2008, vendem-se em lojas presenciais e online como sais de banho e alimento para plantas.

O Sistema de Alerta Rápido da EU também registou 25 novos opióides — nove no ano passado. “Este total inclui 18 fentanis, dos quais oito foram notificados pela primeira vez em 2016”, indica o relatório anual. Representam uma pequena parcela do mercado europeu de drogas, mas “são substâncias muito potentes que constituem uma séria ameaça para a saúde individual e pública”.

Velhas drogas, novas drogas

Estas substâncias, da família dos analgésicos, apareceram em 2009. Podem ser vendidos como heroína a consumidores incautos. E têm aparecido em análises forenses (convulsões e óbitos) feitas em Bélgica, Bulgária, Croácia, Chipre, Estónia, Finlândia, França, Alemanha, Hungria, Irlanda, Letónia, Luxemburgo, Noruega, Polónia, Portugal, Eslováquia, Espanha, Suécia, Reino Unido.

Não há uma estimativa europeia de prevalência de novas drogas entre consumidores de alto risco. Mas dois factores emergem. Primeiro, as novas drogas tendem a ser combinadas com outras drogas (opiáceos, estimulantes, benzodiazepinas ou álcool). Segundo, com frequência não são a primeira, mas a segunda ou terceira droga de uso.

O OEDT alerta ainda para a troca de velhas drogas, em particular a heroína e as anfetaminas, por novas drogas. Já se viu, por exemplo, no Reino Unido, quando houve uma falha na distribuição de heroína, como isso pode ser problemático. “Fraca disponibilidade, baixa pureza e preços elevados podem desempenhar um papel aqui”, indica.

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