Novos gestores deixam de ter responsabilidade pelo passado das empresas

Programa Capitalizar vai entrar numa nova fase com a aplicação de mais medidas, como o alargamento de vistos gold a quem injecte dinheiro em PME.

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Programa Capitalizar junto os ministros Economia e da Justiça, Manuel Caldeira Cabral e Francisca Van Dunem ANTÓNIO PEDRO SANTOS/LUSA

Os gestores que assumam os comandos de uma empresa em dificuldades vão deixar de ser responsáveis pelas más práticas dos anteriores responsáveis. A medida, incluída no programa Capitalizar, deverá entrar em vigor em Janeiro do próximo ano e foi uma das aprovadas ontem em Conselho de Ministros.

Em declarações ao PÚBLICO, o ministro da Economia, Manuel Caldeira Cabral, explicou que vai haver a inversão do ónus da prova. “A menos que se prove que também contribuíram para os problemas”, assegurou o ministro, os gestores “não serão responsabilizados por algo que não fizeram”. Com esta alteração, o Governo conta ter mais uma ferramenta para viabilizar processos de reestruturação de empresas.

Do ponto de vista da injecção de capitais, a grande novidade apresentada na conferência de imprensa de ontem, e onde esteve também a ministra da Justiça, Francisca Van Dunem (bem como vários secretários de Estado) foi o alargamento da atribuição dos visto gold a quem invista em empresas com dificuldades. De acordo com o Executivo, o regime das autorizações de residência para investimento (ARI) vai passar a contemplar três tipos de vistos gold para estrangeiros que invistam em PME.

Assim, terá direito a visto quem aplique 350 mil euros para a “criação de empresas portuguesas ou reforço do capital social”, desde que “criem ou mantenham cinco postos de trabalho permanentes”. O mesmo acontecerá a quem invista 200 mil euros em “empresas portuguesas em situação económica difícil e que estejam com um plano de recuperação”.

Por fim, terá também direito a visto gold quem aplicar 350 mil euros “em fundos destinados à capitalização das empresas portuguesas”. Este tipo de investimento, sublinha o Governo, “já existia”, mas “baixou-se o valor de 500 mil euros” para o tornar “mais atractivo”.

A ideia, afirmou Manuel Caldeira Cabral, é atrair “investidores para empresas em reestruturação”, afirmando ter recebido, nas viagens ao estrangeiro, manifestações de interesse nesse sentido. Apesar de existirem várias modalidades, tem sido o investimento em imobiliário (mais de 500 mil euros) a concentrar o dinheiro aplicado em troca de vistos gold (com destaque para chineses).

Dos 5003 vistos atribuídos desde Outubro de 2012, apenas sete estão ligados à criação directa de empregos (pelo menos 10 postos de trabalho). E, dos 3000 milhões de euros aplicados, 2700 milhões foram directos para o imobiliário.

Antes da conferência de imprensa conjunta, Francisca Van Dunem já realçara que o Executivo tinha “perfeita noção que 99% do investimento” via vistos gold “é canalizado única e exclusivamente para aquisição de imóveis”.

Salvar em vez de “matar”

Por parte de José António Barros, presidente da Estrutura de Missão para a Capitalização de Empresas, criada pelo Governo, o destaque foi para a possibilidade de converter crédito em capital. “A mesma maioria [de credores] que podia matar pode agora renovar”, afirmou.

De acordo com o que foi ontem anunciado, as empresas com capital próprio negativo podem ser reforçadas desde que “uma maioria de credores proponha uma conversão de créditos em capital”.

O regime, diz o Governo, é “rodeado de diversas cautelas por forma a assegurar que a aplicação é reservada para situações que objectivamente a justifiquem, comprovada por profissional idóneo independente”. A emissão de alertas precoces às empresas que podem vir a estar em dificuldades, uma medida que se espera que cheque ao terreno este ano, também mereceu atenções.

Juntando entidades como o IAPMEI e o Banco de Portugal (departamento de estatísticas), os responsáveis das empresas poderão receber informações financeiras com comparativos do sector, o que lhes dará uma percepção mais aprofundada da sua situação. E vai avançar a figura do mediador de recuperação de empresas, que pode ajudar à negociação dos empresários com os credores.

De resto, e como já tinha sido anunciado em Março (houve depois um período de consulta pública), o pacote de medidas implica acabar com o Sireve (Sistema de Recuperação de Empresas por Via Extrajudicial). No seu lugar surge o Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas (RERE), que permite a um devedor avançar com um acordo voluntário com credores.

Entre as várias medidas fica também estabelecido que no caso de incumprimento o bem da garantia passa para as mãos do credor (valor em excesso é restituído), através do regime da apropriação do bem empenhado no penhor mercantil.

Por fim, vão surgir os “certificados de dívida de curto prazo”, o que implica uma revisão do regime de valores mobiliário. O produto financeiro será “elegível para investimento” por fundos de investimento, acredita a tutela, o que ajuda a diversificar as fontes de financiamento das empresas.

O diploma que visa diversificar as formas de alavancagem das PME e reduzir a dependência bancária como fonte de financiamento de sociedades de menor dimensão inclui ainda a criação de Sociedades de Investimento para Fomento da Economia (SIFE).

Qualificado no documento do Ministério da Economia como “um subtipo de sociedade de investimento mobiliário”, com “ligação aos mercados regulamentados”, o novo instrumento “terá por vocação permitir o acesso indirecto ao mercado de capitais de empresas” que não consigam chegar a “uma base de alargada de investidores” por si só.

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