"Rui Moreira lidera um executivo incapaz de agir"

Álvaro Almeida, candidato do PSD à Câmara do Porto, avança para as eleições em protesto contra um executivo “que não fez nada”, que deixou agravar as condições económicas e de segurança da cidade e que alimentou uma cultura de “falta de transparência”.

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Adriano Miranda
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Economista com folha de serviço no FMI, ex-presidente da Entidade Reguladora da Saúde e professor na Universidade do Porto, Álvaro Almeida faz uma leitura negra do mandato de Rui Moreira – excepto a gestão do dossier da TAP, nada se salva na sua análise. Seguro nas críticas, modesto nas propostas, derrapa na análise da herança do PSD-Porto ou na discussão sobre o seu posicionamento ideológico. Calmo, guarda alguns segundos de silêncio antes de responder às perguntas mais incómodas. Na última semana, foi alimentando uma expectativa que gere com cuidado: o PSD pode ganhar novamente o Porto, pensa sem o dizer taxativamente.

Não tem experiência política, não tem experiência partidária nem um passado conhecido de empenhamento nos grandes debates sobre o Porto. O que o leva a candidatar-se?
Ter um passado relevante em relação às causas do Porto, especificamente, de facto, não tenho. Mas eu sou um cidadão do Porto, nasci no Porto vivi no Porto a maior parte da vinha vida, quero que os meus filhos vivam no Porto – aliás foi por isso que regressei dos EUA, para que eles pudessem crescer no Porto. Portanto, sou alguém como os outros 200 mil portuenses directamente interessados naquilo que é o futuro da cidade. Por outro lado, tenho uma experiência longa de políticas públicas…

Refere-se à sua passagem pela Entidade Reguladora da Saúde (ERS)?
Na ERS, na Administração Regional de Saúde do Norte (ARSN), como economista do FMI (Fundo Monetário Internacional) – é disso que se trata. Tenho uma experiência longa de gestão na área das políticas públicas, de preocupação com a coisa pública, de empenhamento nas causas públicas e sou um cidadão do Porto. As duas coisas cruzaram-se, quando constatei que a Câmara Municipal do Porto (CMP) estava a ser mal gerida e achei que era preciso intervir para mudar o rumo.

Candidata-se por um partido que no último mandado não existiu como oposição. Houve até vereadores do PSD que estiveram firmemente ao lado de Rui Moreira. Que créditos tem o PSD para merecer a confiança dos cidadãos do Porto?
Não é verdade que o PSD tenha apoiado Rui Moreira durante estes quatro anos…

Dois dos seus vereadores estiveram praticamente alinhados com Rui Moreira.
Há um vereador que foi eleito nas listas do Porto Forte, mas não é do PSD, Ricardo Valente. Depois, há de facto um vereador que teve problemas com o PSD exactamente pelas posições que tomou na CMP. E há outro vereador que não apoiou Rui Moreira, e esse é que representa o PSD.

Mas em três vereadores, está a falar de um.
Sim, essa é a situação. O vereador que representa o PSD na CMP não apoiou Rui Moreira.

Esse registo não é muito empolgante para si como candidato. É uma menos-valia.
Se tivesse havido um apoio do vereador que representa o PSD na CMP a Rui Moreira, um apoio activo, certamente seria um problema. Não foi o caso.

Amorim Pereira representava o PSD.
Foi-lhe retirada a confiança. Não representa o PSD. O vereador que representa o PSD não apoiou Rui Moreira.

Ser independente é uma vantagem para enfrentar Rui Moreira.
Não sei se é uma vantagem. É uma característica minha. Candidato-me não por causa disso, mas há uma coisa que é clara: mesmo sendo independente, isso não impediu o PSD de considerar que seria um bom candidato à CMP e isso, na minha opinião, representa uma abertura do PSD à cidade e à sociedade civil que é digna de registo.

Qual vai ser o principal foco da sua campanha?
Vai ser a apresentação do nosso projecto “O Porto para as famílias”. A essência do que nós queremos? Queremos um Porto onde seja mais agradável viver, onde, dos avós aos netos, as pessoas encontrem melhores condições, mais qualidade de vida e gostem de viver no Porto. O Porto tem um problema sério, que infelizmente esta câmara ignorou, que é o facto de perder de três a quatro mil residentes por ano. Nós temos de criar condições para que isso não aconteça ou, pelo menos, para que o ritmo seja muito menor. O Porto é uma cidade fantástica, as pessoas do Porto gostam de viver no Porto e se saem é por que são obrigadas a isso. É obrigação da câmara criar condições para que as pessoas não tenham de sair do Porto.

Mas esse é um objectivo muito programático. Em concreto, o que é que isso quer dizer?
É criar condições para melhorar a qualidade de vida. Posso apresentar propostas. Para os mais velhos, temos que aumentar a mobilidade e aquilo que vamos propor é um sistema de mobilidade fina, para aquelas áreas onde não há transportes públicos, para ligar da porta de casa à paragem do transporte público mais próximo.

Um sistema de transporte público?
Sim, um sistema público, uma rede mais fina.

Uma espécie de STCP (Sociedade de Transportes Públicos do Porto) paralela?
Não é paralela. É integrada com a rede que existe. Para muitas pessoas, fazer 200 metros é um grande esforço. Se houver um sistema que faça estes 200 metros, um pequeno veículo que leve essas pessoas até á paragem…

É um sistema de transporte a pedido?
Sim.

Gratuito?
Sim.

Tem a ideia de quanto é que isso vai custar?
Não vamos lançar logo o projecto para a cidade toda. Vai haver projectos-piloto, nas zonas mais carenciadas, onde exista uma maior percentagem de pessoas idosas, onde a distância face aos transportes públicos seja maior. Mas temos outras propostas. Para a segurança, por exemplo. O problema da insegurança é sério. Nas nossas visitas temos encontrado muita gente que nos diz que as pessoas não saem de casa porque têm medo.

Acha que esse medo é justificado ou resulta de uma percepção errada? Os indicadores de criminalidade no Porto são baixos.
Não. O crime no Porto tem vindo a aumentar, num contexto em que em todo o país tem vindo a diminuir. Os crimes contra o património aumentaram 9% no Porto entre 2012 e 1015, enquanto no resto do país caíram 11%. Há um problema de criminalidade efectiva no Porto. É um sentimento de insegurança que tem base em dados objectivos. Temos também como prioridade a habitação e o emprego. No caso da habitação, a nossa grande proposta é o alargamento a toda a cidade das áreas de reabilitação urbana, com as respectivas vantagens fiscais e não só, contrariamente ao que se passa agora, em que essas vantagens estão limitadas à Baixa, No domínio do emprego, para além de uma série de questões ligadas ao funcionamento da câmara – torná-la mais ágil para facilitar a vida às empresas ­-­­, queremos criar condições para que o Porto possa receber grandes empresas.

Quer isso dizer que está de acordo com o investimento que esta câmara fez na InvestPorto?
Mas, quais foram os resultados concretos?

Há uma série de empresas que investiram no Porto e que dizem ter sido atraídas por esse organismo, principalmente na área dos serviços tecnológicos.
É preciso saber se foi a InvestPorto ou se essas empresas já viriam ou não viriam. Independentemente disso, e para além das campanhas de marketing, eu gosto de ver dados gerais e não casos pontuais escolhidos a dedo.

A InvestPorto é um caso de marketing?
Não. O que são casos de marketing são os investimentos pontuais que eles anunciam com grandes parangonas. Porque aquilo que os dados objectivos nos dizem, as estatísticas do INE, é que o emprego no Porto fora da área do turismo diminuiu. Mesmo que tenha havido – e houve certamente – novas empresas a vir para o Porto, o número das que saíram ou desapareceram é maior. Em termos líquidos, o emprego fora do turismo caiu de 2013 em diante, num período de crescimento do emprego no país. Portanto, nós precisamos de reverter o foco exclusivo no turismo deste executivo. Para este executivo, o turismo é tudo, nada mais importa. Não é verdade.

Que áreas gostava de reforçar?
Gostava de atrair sedes de grandes instituições ou empresas, que era essa a tradição do Porto. O Porto há 30 ou 40 anos atrás era isso. Era uma cidade onde se localizavam as sedes de grandes empresas, de grandes instituições, dos bancos, das companhias de seguros. Porque é que a Agência Europeia de Medicamentos não há-de vir para o Porto? O Porto tem o melhor aeroporto da Europa, de acordo com um prémio anunciado há uns 15 dias, tem a melhor universidade do país, capaz de formar os quadros todos de que a agência precisar, tem escolas internacionais em inglês, francês e alemão… Tem todas as condições para receber uma agência dessas. Porque é que o Governo decidiu promover Lisboa como sede da agência, quando Lisboa já é a sede de duas agências europeias? Porque não vir para o Porto? É esse tipo de oportunidades que temos de aproveitar. É preciso que haja condições para reunir no mesmo local, 500, mil, duas mil pessoas, com estacionamento, com acessibilidades e o Porto tem uma zona, a zona Oriental, onde se pode criar um centro de negócios de grande dimensão capaz de atrair cinco mil empregos.

Uma das prioridades políticas de Rui Moreira foi dobrar a aposta na zona Oriental do Porto. Está portanto de acordo com ele?
Eu não estou de acordo com Rui Moreira, porque ele não fez nada. Eu sei que no manifesto dele, das 22 promessas, três ou quatro eram para Campanhã: era o interface rodoviário, era o pólo logístico… Não fez nenhum. Anunciou uma série de coisas. Coisas concretas? Nada em quatro anos. Aliás, Rui Moreira vai ter uma campanha barata, porque, se quiser fazer um programa, é só mudar a data do de 2013. De tudo o que disse que ia fazer não fez nada. É pegar nas mesmas coisas e dizer que as vai fazer agora. Se me pergunta: 'Concorda que é preciso apostar em Campanhã?' Concordo. A diferença é que eu vou desenvolver Campanhã e ele promete desenvolver. Esteve lá quatro anos e continua a prometer.

Vai orientar as suas intervenções à luz do que foi o Porto no consulado de Rui Rio?
O Porto no consulado de Rui Rio teve uma evolução muito positiva, cujo legado queremos continuar. Agora, o Porto de hoje não é o que era em 2001, quando Rui Rio começou. O que temos de fazer agora não é o que ele fez. Mas o que ele fez foi muito bom para o Porto.

Para si ele é um modelo de autarca?
O Porto foi muito bem governado quando Rui Rio foi presidente da Câmara. Agora falar em modelo… Somos pessoas diferentes, temos estilos diferentes.

Subscreve as políticas dele para a cultura?
Quando falo com as pessoas e quando pergunto o que fez este executivo, começam sempre a dizer que a Cultura mudou muito. E, de facto, mudou. É verdade. Aquilo que era a cultura no tempo de Rui Rio era uma coisa, o que foi a cultura neste mandato, sobretudo nos primeiros anos deste executivo, é outra coisa diferente. Eu diria quanto a isso que a minha política para a cultura nem é a de Rui Rio nem de Rui Moreira. É a política de Álvaro Almeida, que se distingue das anteriores, sobretudo da de Rui Moreira, pelo seguinte: eu acho que a intervenção pública na área da cultura deve ser sobretudo orientada para a formação de públicos. Deve permitir que aqueles que não conhecem a cultura, que não a sabem apreciar, passem a apreciar as actividades culturais. Portanto, a minha intervenção será sempre uma intervenção pública que vise fazer chegar a cultura aos jovens e a alguns públicos mais velhos que não têm acesso a essa cultura.

Pensa reverter o processo do Rivoli?
Não, o Rivoli está muito bem.

Não faria como Rui Rio, que decidiu concessioná-lo?
A câmara deve ter espaços culturais que disponibilize para actividades. Deve ser esse o seu contributo, aliás, o grande contributo. Se me pergunta se ia privatizar o Rivoli, não, não iria. O Rivoli como Teatro Municipal está bem. Mas poderia ter uma preocupação, uma programação diferente. Seria muito mais aberto a que grupos de vários tipos, de teatro, dança, música, da cidade pudessem fazer lá os seus espectáculos, mais do que importar espectáculos de outros lados.

Que apoio espera de Rui Rio na sua campanha?
Espero o apoio que ele já demonstrou na sessão de apresentação da minha candidatura.

Espera que ele participe em acções de campanha?
Naturalmente que eu não vou rejeitar apoios de ninguém, muito menos de alguém com a importância que Rui Rio tem na cidade. Se quiser apoiar-me da forma que entender, será sempre bem-vindo.

Se Rui Rio se candidatasse à liderança do PSD, apoiá-lo-ia?
Não sou militante do PSD. É uma questão que não me diz respeito. Numa questão interna, não sendo militante, não vou intervir.

E como cidadão, gostaria de ver Rui Rio a liderar o PSD.
Como cidadão, eu gostaria de ver um PSD forte.

Sendo independente, situa-se melhor na área esquerda do PSD ou mais próximo da área de Pedro Passos Coelho?
Não sei o que é isso de área esquerda e área direita.

De outra forma: entre Silva Peneda e Pedro Passos Coelho, qual é o PSD com o qual mais se identifica?
Silva Peneda, com quem compartilhei muitos debates na Rádio Renascença, vá ver os debates…

Não acha isso importante, para que os cidadãos saibam qual é o seu posicionamento ideológico?
É importante que as pessoas conheçam o meu posicionamento, e esse é conhecido. O conceito direita-esquerda não faz hoje sentido. Para mim, entre Marine Le Pen, que é catalogada de direita, e a Mariana Mortágua, que é catalogada de esquerda, não há grande diferença. Não me identifico com nenhuma.

Então vamos colocar a pergunta de acordo com o dualismo que Emannuel Macron formulou: considera-se um progressista ou um conservador?
Se não me engano, a questão relevante que Macron colocou, e sobre essa questão não tenho dúvidas nenhumas, é a diferença entre os europeístas e os não europeístas, entre os nacionalistas que querem uma economia fechada e os que querem uma economia aberta. E aí eu estou ao lado dos europeístas e dos que querem uma economia aberta. Estou ao lado de Macron contra o senhor Tsipras.

O que vai fazer para que o eleitorado tradicional do PSD vote em si e não no candidato independente que também se situa no espaço do centro-direita?
Vou mostrar-lhe as nossas propostas e mostrar que o actual executivo de Rui Moreira e do PS foi um mau executivo, porque nada fez de relevante para melhorar a cidade do Porto.

O divórcio entre o PS e Rui Moreira foi uma dádiva para si?
Não sei. Não muda nada de fundamental. Nós estávamos contra uma candidatura de continuidade e agora vamos estar contra duas candidaturas de continuidade.

Acredita que o PSD pode ganhar depois dessa cisão? Pode capitalizar com essa cisão?

Gostava muito de ser analista político e fui, durante muito tempo. Não vou fazer análise política. Agora, do ponto de vista da mensagem, não muda nada. A nossa mensagem de base é que Rui Moreira e o PS governaram mal a CMP. Isso é válido para Rui Moreira e é válido para o PS.

Isso é uma análise política.
Não é análise política, é a mensagem desta candidatura. Eu candidato-me porque acho que a câmara está a ser mal gerida. Se me envolvo é porque tenho a consciência de que não está tudo bem, que este executivo é um mau executivo. Tinha acabado de sair da ARSN e tive de lidar com a Câmara do Porto e percebi que esta tem um presidente que não se preocupa com os problemas dos cidadãos e que a gestão corrente estava entregue aos vereadores do PS. Foi isso que me motivou a candidatar-me e a estar aqui. É preciso mudar este estado de coisas.

Considera que a câmara é gerida pelo PS. O presidente é um verbo-de-encher?
Verbo-de-encher no sentido de não se preocupar com os assuntos? Dou-lhe um exemplo: Rui Moreira, em entrevista ao PÚBLICO, disse que não me conhecia, mas há cerca de dois anos teve uma reunião comigo, na qualidade de presidente da ARSN, para resolver dois ou três problemas relativos a centros de saúde do Porto. Se ele não se lembra disso, é sinal da importância que dá aos assuntos relativos ao Porto. Se ele acha isso conversa de circunstância, é prova que ele não liga aos assuntos to Porto. Ou alguém do Porto acha que melhorar os centros de saúde é conversa de circunstância? Para ele pode ser.  

O Porto vive uma fase de grande dinamismo no turismo, mas há os custos indirectos deste surto no sector que dividem, de alguma forma, a cidade entre aqueles que dizem que temos de viver com essas dores de crescimento e os que advogam que está na hora de começar a regular o turismo, mesmo que se trave o seu crescimento. Em que posição se coloca?

Em nenhuma, estou numa terceira via. Sou daqueles que acham que o turismo é importante. O turismo tem sido a única fonte de crescimento do Porto nos últimos anos, o que é mau – mas, se não fosse o turismo, ainda estávamos pior. Não acho que se deva travar o turismo, impedir o turismo ou dificultar o turismo, mas também não acho que se deva ignorar que o turismo tem impacto na vida das pessoas. O que a câmara tem de fazer é actuar de forma a tentar minimizar o impacto do turismo na vida dos portuenses.

Isso implica novas regras para os operadores turísticos?
Não necessariamente. Um dos impactos que o turismo teve foi no trânsito. A circulação na cidade do Porto está claramente pior. Há dois meses saíram dois estudos internacionais – não sei qual é a sua credibilidade, só sei que não foi o PSD que os encomendou – que dizem que o trânsito no Porto piorou significativamente de 2015 para 2016. Se o trânsito está pior por causa do turismo, a câmara tem que actuar, não pode ignorar esse problema. Há três coisas que este executivo fez que não ajudaram a resolver o problema. Primeiro, acabou com a Divisão Municipal da Via Pública, que era quem estava encarregada destes problemas. Segundo, a expansão dos parquímetros por todo o lado. Há sítios em que os parquímetros fazem sentido, há outros em que não fazem. Há muitos cidadãos que preferem estacionar ilegalmente, perturbando o trânsito fora dos paquímetros, do que estacionar neles, porque o sistema de controlo é muito mais apertado nos parquímetros do que fora. Terceiro, há um problema de fundo que acho que é exemplificativo da inoperância deste executivo e até de alguma incoerência: Rui Moreira foi o cidadão do Porto que mais defendeu a linha do metro do Campo Alegre, a ligar a Baixa do Porto à Foz, passando pelo Parque da Cidade. Defendeu activamente essa solução há dez anos, por achar que era essencial para a mobilidade, mas agora aceitou que essa linha desaparecesse dos planos do metro. É inadmissível! Ele não pode aceitar agora que isto seja ignorado pelo Governo.

Disse numa entrevista recente que a sua primeira prioridade é resolução dos problemas do “trânsito caótico”. Acha mesmo que essa é a principal carência da cidade. Não lhe parece uma promessa eleitoral pouco ambiciosa?
Como portuense, a primeira preocupação é essa, e o que os tais estudos diziam é que o número de minutos que os portuenses perdem no trânsito têm vindo a aumentar. O trânsito é uma preocupação, mas isso não quer dizer que o meu programa se esgote aí.

Comparando o problema do trânsito com os problemas de integração social que existem nos bairros da zona oriental da cidade, não lhe parece que esses problemas requerem uma atenção mais premente?
A diferença é esta: o problema do trânsito é um problema que se agravou agora, que resulta da inacção do actual executivo e, portanto, é mais fácil de actuar. Os problemas da habitação são importantes, mas são mais estruturais. A proposta de criar um centro de negócios para grandes empresas na zona oriental é também uma forma de integrar alguns desses bairros na malha urbana da cidade.

O que é que pode fazer para garantir que as pessoas regressam no centro da cidade?
Eu não disse centro da cidade, falei na cidade do Porto. É preciso não confundirmos o Porto com a Baixa – esse é um dos erros deste executivo. Um dos erros deste executivo é pensar que o Porto começa na Avenida dos Aliados e vai até ao rio e não é. O Porto é muito mais do que isso e a minha preocupação é com o Porto todo. Vou retirar o foco da Baixa e espalhá-lo pelo Porto todo. O trânsito é a área onde este executivo pior fez pela sua inacção e também pela sua acção.

Como pretende estimular a economia no Porto?
Criando o centro de negócios e reduzindo os tempos de resposta às solicitações das empresas. Durante este mandato, a CMP tem vindo a aumentar os tempos de resposta às solicitações das empresas – é o que os empresários nos têm dito. Temos de ter uma câmara que seja capaz de responder, que não cause dificuldades.

Se for eleito mantém o projecto de Rui Moreira para o Bolhão?
O Bolhão é mais um exemplo daquilo que Rui Moreira não fez. Nas promessas de campanha – isso é facilmente de ver, porque os panfletos existem – dizia que ia reabilitar o mercado do Bolhão num ano. Já passaram quatro…

Foi preciso reformular o projecto.
Porquê? Então ele não conhecia o projecto em 2013 quando fez a campanha? Das duas, uma: ou não conhecia o projecto e aí não tem nada que estar a prometer coisas sem saber do que está a falar; ou, se conhecia o projecto e achava que podia fazê-lo num ano, porque é que mudou?

O que lhe parece?
A minha resposta é: mudou, porque não tem capacidade de execução. Aqui, como nas outras áreas, este executivo não foi capaz de fazer nada. É um executivo bloqueado, incapaz de agir. Agora, para responder à questão sobre o Bolhão... Depois de tanto tempo perdido, seria um erro voltar a colocar tudo no início. O Bolhão precisa de uma solução. Há uma solução que já está no terreno, não vamos perder mais quatro anos.

Uma ideia inovadora e ousada do seu programa?
A mobilidade e o centro de serviços em Campanhã. São duas ideias novas que são capazes de mudar a vida na cidade.

Tem mais propostas?
Propostas concretas sim, originais e ousadas não. O alagamento da reabilitação urbana à cidade toda, não é uma proposta ousada, mas é uma proposta transformadora do mercado de habitação no Porto. Se conseguirmos reabilitar muitos dos edifícios antigos e transformá-los em habitação de qualidade, certamente que conseguiremos diminuir a pressão do turismo. Temos que reagir e minorar os seus efeitos e um dos efeitos é a especulação imobiliária. Se aumentarmos a oferta imobiliária, minoramos esse efeito. Se há habitações que estão a ser usadas para alojamento local, se criarmos novas habitações a partir de edifícios reabilitados, estamos a compensar e mantêm-se a oferta como estava antes.

Disse que “não tem negócios na cidade”. Ter negócios na cidade é um problema ou está a fazer uma referência negativa ao “caso Selminho”?
Ter negócios na cidade pode gerar conflitos de interesses. Ter negócios na cidade pode pôr os responsáveis políticos em situações de conflito em que têm de escolher entre defender os interesses da cidade e os interesses pessoais. Se se puder evitar essas situações, é preferível. No meu caso, não estarei sujeito a situações de conflito, porque não tenho esse conflito de interesses.

É isso que está a acontecer no “caso Selminho”?
Que há um conflito de interesses é óbvio, porque temos a CMP por um lado e temos uma empresa do presidente da câmara do outro. Aliás, é tão óbvio que, na entrevista que deu ao PÚBLICO, Rui Moreira anunciou que ia mudar os termos do acordo - não sei se mudou, mas anunciou que ia mudar. Se ele anuncia que vai mudar, é porque percebeu que alguma coisa estava errada, que havia ali um conflito de interesses.

Está-se a referir à intenção da Câmara do Porto de pedir a nomeação de um juiz para o Tribunal Arbitral?
Na história de ter um elemento nomeado pela câmara presidida pelo Rui Moreira, um elemento nomeado pela Selminho, que é propriedade de Rui Moreira, e um terceiro nomeado pelos dois, há um conflito de interesses óbvio. Quando Rui Moreira reparou que havia um conflito de interesses decidiu que ia alterar alguma coisa, pelo menos anunciou que ia alterar. Se Rui Moreira anunciou que ia mudar alguma coisa, se mudou alguma coisa, é porque alguma coisa estava errada. Senão, não precisava de mudar.

A alteração na composição do Tribunal Arbitral é suficiente para que o processo seja completamente transparente?
Não conheço os termos em que isso vai ser feito, não sei quais são as contrapartidas que a Selminho vai exigir para alterar os termos do acordo, não faço a mínima ideia de nada quanto a isso e, portanto, não posso comentar. Agora há uma coisa que é essencial: é essencial que em tudo na câmara haja transparência e, neste caso, faltou transparência como, aliás, falta na Câmara do Porto. Há um índice de transparência municipal que é publicado todos os anos que classifica as câmaras de acordo com o seu grau de transparência e de abertura ao público.

Refere-se ao índice de transparência municipal?
A Câmara do Porto ocupava o 26.º lugar em 2013. Em 2016 passou para o 141.º lugar. Essa falta de transparência é inadmissível. A câmara tem que responder perante o público. Na Entidade Reguladora da Saúde nós explicávamos tudo, porque as instituições públicas têm que prestar contas ao público. Até há muito pouco tempo Rui Moreira dizia que tinha umas contas muito boas – por acaso, agora já não acontece, fui lá hoje [sexta-feira] e vi que não era assim. Mas até há muito pouco tempo as contas da câmara não estavam no site da câmara. Tinha lá uma página que dizia: ‘elementos económicos e financeiros’. Carregava-se e aparecia a morada e a composição da divisão do orçamento. Não tinha contas. Hoje já lá estão, mas não estavam. Uma coisa tão básica como o relatório e contas da câmara tem que ser público, tem que estar disponível para toda a gente e durante muito tempo não esteve.

O “caso Selminho” vai ser um ângulo de abordagem na estratégia de campanha do PSD?
Na minha estratégia de campanha não.

A tradição política do Porto alimenta-se muito do combate ao centralismo. Como se situa nesta questão?
O Porto, e a região Norte, tem sido vítima desse centralismo. Demiti-me da ARSN exactamente por causa disso, porque a região Norte, no caso da saúde, tem sido historicamente prejudicada na distribuição dos fundos. A despesa per capita na região para a área da saúde é 11% inferior à média nacional e eu insurgi-me contra isso. E disse ao ministro da Saúde [Adalberto Campos Fernandes] que o orçamento que estava a atribuir à região não era suficiente e, quando ele não atendeu aos meus pedidos de aumento de orçamento, demiti-me. O Norte tem sido prejudicado e uma das razões para isso é o ter perdido poder político. Por isso eu sou um acérrimo defensor da regionalização. É preciso que a região tenha um poder político efectivo que complete o poder municipal.

Por que defende a regionalização?
É preciso um órgão intermédio. Já existem as comissões de coordenação e as áreas metropolitanas, mas que têm de ter poder político. Um órgão desses não pode ser uma repartição ou um departamento do ministério central em Lisboa: tem de ser um órgão que represente as pessoas da região e, portanto, tem que haver uma regionalização. Por regionalização entenda-se apenas isto: os órgãos regionais devem ser eleitos.

A decisão da TAP de encerrar rotas internacionais a partir do Porto é uma “manifestação do centralismo?”
Em primeiro lugar, é uma manifestação de má gestão de uma empresa que é parcialmente pública e, desse ponto de vista, devemos insurgir-nos contra essa decisão enquanto contribuintes.

Nesta matéria subscreve a estratégia do presidente da Câmara do Porto?
Neste caso em concreto, em termos de princípio, acho que sim, que está bem.

O Porto deve ser a cidade liderante do Norte na relação com o poder central?
Deve ser, pelo menos, uma referência importante. O Porto não pode ser a Lisboa da região. Isto é, nós não podemos substituir o centralismo nacional pelo centralismo regional e, portanto, o Porto não pode ser o dono da região. Mas pela importância que a cidade tem em termos históricos, económicos e sociais tem que ser uma referência importante. Mas tem que ser uma referência importante de mão dada com os outros municípios da região. Não pode ser é uma cidade que ignora os outros municípios.

Não tendo maioria, admite participar em coligações com outras forças políticas?
Se ganharmos?

Se ganhar sem maioria ou se perder?
Se ganharmos sem maioria absoluta, certamente temos que encontrar uma solução de governação da câmara, com os vereadores que forem eleitos; se não ganharmos – hipótese meramente para discussão –, é porque ganhou o PS ou ganhou Rui Moreira. O PS e Rui Moreira governaram a câmara juntos durante quatro anos. Mesmo depois da zanga, Rui Moreira continuou a refirmar que Manuel Pizarro foi um excelente vereador e que o iria convidar em qualquer dos casos. Então, se Manuel Pizarro foi, na opinião de Rui Moreira, um vereador tão bom, não acham natural que seja a primeira pessoa de quem ele fala para convidar para a câmara?

É isso que vai acontecer?
Se os resultados o permitissem, acho que era isso que ia acontecer, porque eles estão tão alinhados politicamente. A discussão na última semana foi sobre quem é que rompeu. Quem é que disse o quê? Não há uma crítica em termos de actuação do executivo. Não faz sentido nenhum que duas pessoas que se deram tão bem durante quatro anos se zanguem por uma questão de lugares. Mas quando a questão dos lugares for ultrapassada, e depois das eleições está ultrapassada, nada justifica que não se venham a entender outra vez.

Se não ganhar fica como vereador?
Assumirei o meu lugar de vereador, mas sem pelouro e na oposição.

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