Deve um maçon chegar a primeiro-ministro?

A minha resposta é só uma: não se justifica. Um maçon não deve chegar a primeiro-ministro.

Luís Montenegro nunca admitiu publicamente ser maçon, tal como nunca admitiu estar na linha da frente para substituir Pedro Passos Coelho como líder do PSD. Mas, da mesma forma que todos sabemos que ele está a ser empurrado por Miguel Relvas, Marco António Costa e até mesmo, com maior ou menor empenho, por Marcelo Rebelo de Sousa e Luís Marques Mendes, também quase toda a gente sabe que Luís Montenegro pertence (ou, pelo menos, pertenceu) à famosa Loja Mozart, cujos insignes membros eram uma mistura explosiva de altos quadros da Ongoing e dos serviços secretos portugueses.

Esta afirmação não é um diz-que-disse, mas a reprodução de várias notícias e uma dedução elementar efectuada a partir da postura que Luís Montenegro adoptou quando, em 2012, foi confrontado com a sua filiação maçónica. O PÚBLICO noticiou no início desse ano ter tido acesso a uma lista de participantes num encontro da loja Mozart49 onde constava o nome de Montenegro, tal como os nomes dos dois mais altos quadros da Ongoing de então (Nuno Vasconcelos e Rafael Mora), do famoso espião Jorge Silva Carvalho, e ainda de Agostinho Branquinho, ex-deputado do PSD. Um quinteto de luxo. Questionado repetidamente pelos jornalistas acerca da sua obediência a uma loja maçónica, Montenegro nunca a confirmou nem desmentiu, limitando-se a afirmar que “nenhum interesse particular” poderia pôr alguma vez em causa a sua “submissão primeira e única ao interesse nacional”.

Muito bonito, mas a questão persiste: faz ou não sentido, em 2017, uma figura pública com ambições de chegar a primeiro-ministro fazer parte da maçonaria? O caso não diz respeito apenas a Montenegro. Um dos principais críticos de Passos Coelho dentro do PSD, Pedro Duarte, também fez parte, segundo a imprensa, da mesma loja Mozart, de onde terá saído quando a coincidência entre o uso de avental e os negócios mal explicados começou a tomar uma dimensão inaceitável. Se nos lembrarmos que Miguel Relvas é ele próprio um destacado maçon, e que hoje em dia é o principal promotor de um PSD pós-Passos Coelho (a quem nunca perdoou a saída do governo), esta investida maçónica não revela nada de bom. Mas o meu ponto aqui nem sequer é esse – é saber como é que se justifica que um primeiro-ministro, necessariamente alvo do mais apertado escrutínio disponível em democracia, faça parte de uma sociedade secreta com as suas próprias regras hierárquicas. A minha resposta é só uma: não se justifica. Um maçon não deve chegar a primeiro-ministro.

Estamos em 2017, não em 1917, em 1817 ou em 1717, quando o secretismo da maçonaria era uma forma de autoprotecção. Eu conheço a argumentação em torno da subtil diferença entre “sociedade secreta” e “sociedade discreta”, tal como os magníficos princípios que devem nortear a vida de um maçon. Reconheço igualmente o papel importante que a Maçonaria desempenhou na promoção da escolaridade em Portugal, sobretudo durante a Primeira República. Mas a existência de um segredo maçónico e de regras de fraternidade próprias e indisponíveis ao escrutínio público não são compatíveis com as exigências de um cargo de primeiro-ministro. Pior que isso: nas últimas décadas o nome de várias lojas maçónicas apareceu ligado a demasiados casos de polícia, sendo impossível não considerar que a sua opacidade, a sua influência e os seus pactos deram cobertura a práticas ilegítimas. Montenegro e Pedro Duarte devem escolher: ou maçons ou candidatos a primeiro-ministro.

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