A política tem limites

Os 23 ex-autarcas que vão voltar a candidatar-se nas próximas eleições não podem ser impedidos de o fazer por razões legais, mas deveriam abster-se de o fazer. A decisão destes dinossauros peca por razões morais e nada augura de bom para os munícipes e para os municípios.

Isaltino Morais, Narciso Miranda, Avelino Ferreira Torres ou Carlos Pinto têm muito em comum para além de terem sido presidentes de câmara. De alguma forma, nunca se conformaram com o estatuto de ex-autarcas e com a inerente perda de poder. E não são os únicos. Todos os 23 ex-presidentes de câmara que vão voltar a candidatar-se nas próximas eleições autárquicas não podem ser impedidos de o fazer por razões políticas ou legais, mas deveriam abster-se de o fazer. A decisão destes "dinossauros" da política local peca por razões morais e nada augura de bom para os munícipes e para os municípios.

Políticos que exerceram funções durante décadas, que mudaram de município para contornar as limitações de mandato, que mudaram mesmo de partido ou então criaram movimentos chamados "independentes" para concorrer contra as forças partidárias a que pertenceram têm mais apego ao cargo e às suas redes clientelares do que a qualquer resquício de missão pública. Daquele número, 19 vão tentar a reeleição nas mesmas câmaras a que presidiram e quatro vão tentar a reeleição em câmaras próximas daquelas a que presidiram. Avelino Ferreira Torres já o fizera, ao saltar do Marco de Canavezes para Amarante. Luís Flipe Menezes tentou o mesmo, ao trocar Vila Nova de Gaia pelo Porto.

Na maioria dos casos, estamos a falar de autarcas dos dois principais partidos, que estes ressuscitam ou que se disfarçam num movimento independente, e de um emaranhado de circunstâncias que trata a política como um expediente para atingir um determinado fim. Estes 23 candidatos recalcitrantes são o mais forte dos argumentos demagógicos contra qualquer processo de regionalização, que António Costa atirou ontem para uma segunda legislatura, ainda que a tempo do calendário de referendo proposto recentemente pelo PCP. Estas candidaturas são um desfecho necessário de carreiras políticas ensombradas por processos judiciais, suspeitas várias, com dois resultados contraproducentes: não só contribuem para diabolizar ainda mais o poder local, acentuando a imagem do autarca como um caudilho de pacotilha, como para impedir a mais que saudável e (exigível) renovação das listas nas autárquicas. O limite de mandatos é uma regra sensata. É pena que não o seja para todos. 

Sugerir correcção
Comentar