Especialistas pedem uma estratégia pública de reabilitação urbana

Para o sociólogo João Queirós, o Porto deve “restituir a complexidade na discussão e nas políticas” de reabilitação urbana. Reduzir a questão ao turismo é um erro, acredita.

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Nelson Garrido

Um dos painéis da conferência “Lisboa: Que Futuro?”, realizada esta terça-feira no Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE), reuniu o consenso de especialistas de quatro cidades europeias em torno do massificação do turismo e do galopante fenómeno de mudança das cidades: “Há uma imperiosa necessidade de políticas públicas novas”. O resumo é feito por João Seixas, da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa e moderador do painel sobre as mudanças e aprendizagens das cidades da Europa do Sul, que juntou aos testemunhos de Milão, Barcelona, Paris e Porto.

A falar da cidade portuguesa estava João Queirós, investigador do Instituto de Sociologia da Universidade do Porto. O sociólogo considera necessário um reforço das políticas municipais e estatais na regulação das actividades turísticas e imobiliárias. Apoia programas de renda controlada, que defendam a permanência e regresso da população ao centro da cidade. Defende a reabilitação de prédios camarários devolutos para habitação e medidas de protecção do património. Capacitar quem responde aos desafios dos grupos excluídos, como pessoas sem abrigos e idosos, não deve ser uma questão secundária em matéria de requalificação dos centros envelhecidos das cidades.

Há, nesta matéria, “margem de manobra para os políticos, que não deve ser recusada”, acredita.

O sociólogo fez um balanço das políticas de reabilitação urbana na cidade: depois de uma requalificação pensada na “identidade e do perfil urbano local” da habitação na baixa, iniciada em 1974, a política passou, nos anos 90, a ser mais orientada para o espaço público. Preparava-se o centro do Porto para a classificação como Património Mundial da Humanidade, lançava-se o repto para a Capital Europeia da Cultura de 2001.

Desde então, houve “um deslizamento para um polo neoliberal das políticas” de reabilitação urbana. Em 2004, a Câmara Municipal do Porto cria a Porto Vivo - Sociedade de Reabilitação Urbana da Baixa Portuense (SRU). Uma sociedade que tem como desígnios requalificar a habitação para colocar no mercado, qualificar o espaço público, revitalizar do comércio e dinamizar o turismo.

O percurso seguido para cidade alinhou, a partir daí, com a “tendência dos agentes no campo das políticas de habitação”: reduzir a participação municipal, facilitar os licenciamentos, entrar no campo do neoliberalismo, resume João Queirós. Os 92 estabelecimentos hoteleiros no centro da cidade em 2009 passaram a ser 160 cinco anos depois, segundo os mais recentes dados da Pordata. A aceleração dos alvarás tornou-se evidente. O número de licenciamentos na Baixa duplicou entre 2011 e 2016. Foram 36 entre 2006 e 2010.

Deste aumento da oferta resultaram 6,8 milhões de dormidas no Porto e Norte em 2016 – onde a cidade do Porto representa uma importante fracção. 3% dos alojamentos da cidade estão registados na plataforma de alojamento turístico Airbnb. O número sobe para 25% quando falamos do centro histórico.

O dinamismo económico é inegável. João Queirós aponta para os últimos dados de 2017: 2500 a 3000 euros por m2 para reabilitar no centro da cidade. Um número que tem sido revisto em alta.

Para João Queirós importa agora “restituir a complexidade na discussão e nas políticas”. Uma vez que o fenómeno no Porto é mais recente que em Lisboa e nas cidades europeias do painel, a cidade tem “condições e tempo para dar a complexidade a estas políticas de cidade e dar resposta aos desafios complexos”. Reduzir a questão ao turismo é um erro, acredita.

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