Governo dá protecção a denunciantes de branqueamento de capitais

Proposta de lei do Governo cria um regime de protecção da identidade de funcionários de instituições financeiras que denunciem casos de branqueamento de capitais.

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Acção legislativa do Governo ainda vai ser debatida e eventualmente alterada na Assembleia da República Enric Vives-Rubio

Numa altura em que os crimes financeiros estão nas primeiras páginas de jornais, o Governo vai adoptar legislação europeia que cria uma protecção a denunciantes de crimes de branqueamento de capitais ou financiamento a terrorismo. 

No preâmbulo da proposta de lei, o Governo reconhece que é necessária uma "actualização" dos instrumentos de combate a este tipo de crimes que usam técnicas cada vez mais sofisticados e têm conhecido uma "constante evolução e adaptação". Um dos instrumentos de combate ao crime, que tem sido essencial ao desenrolar de alguns dos processos judiciais de crimes ditos de colarinho branco, é precisamente a existência de denúncias. Até porque a lei portuguesa não prevê a figura jurídica de "arrependido" como, por exemplo, nos Estados Unidos, o que torna ainda mais relevante a ocorrência de denúncias. 

E por isso, na proposta de lei, que ainda vai ser sujeita a debate e alterações na Assembleia da República, o Governo propõe "normas de protecção dos funcionários que comuniquem suspeitas de branqueamento de capitais, no sentido de protecção da revelação da identidade desses funcionários".

Essa protecção traduz-se, na prática, por uma garantia da "confidencialidade sobre a identidade do denunciante" durante o tempo do processo ou até ao momento em que os acusados exijam a sua revelação para se poderem defender. 

Contudo, para os casos em que a identidade do denunciante acaba por ser conhecida, a nova legislação - que transpõe uma directiva europeia sobre o combate aos crimes de branqueamento de capitais e de financiamento ao terrorismo - acrescenta uma salvaguarda aos funcionários, impedindo as entidades empregadoras de levarem a cabo "quaisquer ameaças ou actos hostis" e ainda "quaisquer práticas laborais desfavoráveis ou discriminatórias contra quem efectue denúncias às autoridades sectoriais".

Assim, quem denunciar estes casos às autoridades fica ainda a salvo de processos disciplinares, civis ou criminais, com a ressalva que estes podem vir a ser abertos se as denúncias "forem deliberada e manifestamente infundadas".

Esta é apenas uma das alterações introduzidas pela nova legislação relativa à prevenção da "utilização do sistema financeiro e das actividades e profissões especialmente designadas" para efeitos de branqueamento de capitais e combate ao terrorismo. Outra dessas mudanças previstas na proposta prende-se exactamente com o alargamento da sua actuação. Com esta proposta, haverá mais entidades e profissões que passam a estar sujeitas a estas regras. Desta forma, passam a estar abrangidas todas as entidades não financeiras que têm operações em dinheiro vivo acima de 10 mil euros, bem como "as instituições de pagamento e de moeda electrónica estrangeiras que actuem através de agentes ou distribuidores, bem como as entidades gestoras de plataformas de financiamento colaborativo".

Esta alteração legislativa  ainda não está completa: faz parte de um conjunto de directivas europeias que visam não só o combate a crimes financeiros como a protecção de clientes em relação a práticas de instituições financeiras. Falta ainda chegar à Assembleia da República a transposição de outra directiva que muda as regras de relação entre os clientes e os bancos, impedindo, por exemplo, entidades financeiras de comercializarem ao balcão produtos financeiros qualificados dos grupos a que pertencem.

O debate sobre este assunto já começou no Parlamento há alguns meses e terá desenvolvimentos nas próximas semanas. Algumas propostas sobre este tema já foram debatidas no grupo de trabalho e algumas foram até aprovadas numa primeira fase. Por exemplo, passou a ser obrigatória a publicação anual das transferências para paraísos fiscais. E, mais do que isso, foi também aprovada a obrigatoriedade de registo dos accionistas dos bancos mas também a identificação dos beneficiários efectivos das entidades que participem no seu capital, isto é, a intenção é saber quem são os verdadeiros donos de participações qualificadas.

Esta medida já aprovada cruza-se com esta proposta do Governo, uma vez que será criada uma base de dados com os registos dos beneficiários efectivos até porque, defende o executivo no preâmbulo da legislação, é importante a "troca de informações entre autoridades" e uma melhor "cooperação nacional e internacional".

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