Educação para a cidadania é a chave para a maior participação política

Investigadora sugere medidas para aproximar eleitos e eleitores a nível autárquico.

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Educar para mudar mentalidades Fabio Augusto

O discurso de que os cidadãos estão cansados da política e dos políticos é antigo e isso prova-se a cada domingo em que os portugueses são chamados às urnas: a abstenção não tem parado de aumentar, mesmo apesar de uma cada vez maior abertura da política ao cidadão. Para a investigadora Maria Antónia Almeida, o maior problema é a falta de educação para a cidadania – “o papel da escola é fundamental”.

Por exemplo: o Parlamento aprovou, há quase ano e meio, uma recomendação ao Governo para integrar o estudo da Constituição nos conteúdos curriculares a partir do 7.º ano e para disponibilizar aos estudantes um exemplar do texto –“isso não foi concretizado nem se sabe quando poderá ser”, lembra, afirmando encontrar alunos na universidade que não sabem as diferenças entre presidente da câmara, da República ou primeiro-ministro.

Ao PÚBLICO, Maria Almeida defende que esta educação para a cidadania é especialmente importante numa altura em que o país vai mergulhar num processo de transferência real de competências da administração central para as autarquias. “Será que temos cidadãos suficientemente conscientes para fiscalizar os poderes acrescidos que os autarcas vão ter?” E lembra casos em que autarcas foram condenados em tribunal por corrupção ou apropriação de dinheiros públicos, mas que conseguiram ser reeleitos. “Infelizmente generalizou-se a ideia de que alguns políticos podem ser corruptos mas até fazem coisas boas para o povo. Isso tem a ver com a educação dos eleitores.”

Mas se as mudanças de mentalidade são as mais difíceis e demoradas, há também mecanismos que é preciso alterar – e esses são mais fáceis. Uma medida fundamental é a simplificação do processo das candidaturas independentes, por exemplo, permitindo que apareçam no boletim de voto com um logótipo, em vez de um simples número romano. A vertente financeira também é complicada, pelo que Maria Almeida afirma que a legislação deveria permitir algum instrumento que lhes possibilitasse um suporte financeiro inicial para as campanhas, e também aliviar o processo burocrático de apresentação das listas.

A par disso, é preciso fazer cumprir na prática a lei da paridade – muitas mulheres são eleitas mas depois cedem o lugar aos homens. “As mulheres deviam tomar consciência de que se os partidos não as colocam no primeiro lugar das listas, então deviam candidatar-se como independentes.” Embora não concorde com o voto obrigatório, a investigadora defende que pelo menos a “discussão” sobre ele deveria ser lançada, tal como se deveria estudar o voto preferencial.

Vincando que a “confiança” é um elo fundamental para o interesse e a participação dos cidadãos, a investigadora defende que seria de aumentar os instrumentos de transparência dos eleitos locais, obrigando-os a tornar públicas as declarações patrimoniais ou os seus currículos. “Isso acaba com a sensação de impunidade que existe de ambos os lados.”

Ao nível do funcionamento dos municípios e das juntas de freguesia, há uma série de instrumentos que os eleitos podem usar para estimular e aumentar a participação dos eleitores na gestão autárquica ou, pelo menos, para tornar a relação entre os dois lados mais próxima. Entre elas contam-se as reuniões descentralizadas pelas freguesias, os orçamentos participativos, os referendos locais, as consultas públicas, os conselhos de jovens (ou de idosos), as agendas XXI, os gabinetes de apoio ao munícipe. Esta participação, lembra Maria Almeida, será cada vez mais importante tendo em conta o processo que se avizinha de descentralização de competências para as autarquias.

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