Os companheiros portugueses de Orbán

PSD e CDS convivem quotidianamente no PPE com os líderes do regime nacional-populista húngaro e com eles concertam políticas, votações, nomeações e apoios morais.

O PSD e o CDS nunca perdem ocasião de, a propósito da Venezuela ou da Coreia do Norte, exigirem explicações ao BE ou ao PCP sobre a repressão política ou as violações de direitos humanos que nesses países ocorrem a coberto de uma certa (ou errada) ideia de socialismo. Devo dizer que não me escandaliza que o façam. Parece-me um hábito saudável que nos obriga a lembrar que não estamos sozinhos no mundo e que as ideias têm consequências e trazem consigo responsabilidades, mesmo quando temos uma influência reduzida nas violações de direitos humanos que em nome das nossas ideias — sim, das minhas também — ocorrem e mesmo que pouco possamos fazer para prevenir essas violações de direitos humanos.

O que me escandaliza, e creio que nos deveria escandalizar a todos, é o silêncio de PSD e CDS quando a repressão e as violações de direitos humanos ocorrem muito mais perto de casa. Falo da Hungria do primeiro-ministro Viktor Orbán e do seu partido FIDESZ, que com PSD e CDS faz parte do Partido Popular Europeu.

Viktor Orbán está de novo nas notícias porque decidiu mudar a lei para perseguir e tentar encerrar a única universidade do país que ainda escapa ao seu controle — a Central European University, fundada pelo bilionário de origem húngara George Soros. Dado o renome internacional desta universidade, a qualidade da sua produção académica e a extensão das suas redes de cooperação científica, este ataque à liberdade de pensamento e de associação deu mais brado do que o costume. Mas está longe de ser a única agressão de Orbán aos valores fundamentais da União Europeia, ou sequer a mais grave. Só nos últimos tempos o governo húngaro criminalizou os refugiados em violação da Convenção de Genebra (e da Carta de Direitos Fundamentais da UE), reintroduziu o tema da pena de morte no debate público e mexeu-se nos bastidores para fechar o maior jornal da oposição de um dia para o outro.

Antes disso, Orbán mudou a constituição a seu bel-prazer, reintroduzindo nela leis que tinham sido chumbadas pelo tribunal constitucional; decapitou o sistema judicial, pondo os seus nomeados politicos a controlar os tribunais; e alterou as leis eleitorais para garantir a si mesmo uma maioria mais ou menos permanente de dois terços no parlamento (com menos de 40% dos votos).

E fez tudo isso enquanto manteve o seu partido filiado na maior família política europeia, o PPE, de que fazem também parte o PSD e o CDS. Ou seja, ao contrário de BE e PCP com a Venezuela ou a Coreia do Norte, PSD e CDS convivem quotidianamente com os líderes do regime nacional-populista húngaro e com eles concertam políticas, votações, nomeações e apoios morais. As desculpas para o fazerem já passaram do prazo de validade: nem o PPE tem conseguido moderar a sede de poder de Orbán, nem tem conseguido evitar as alianças táticas deste com os fascistas húngaros do partido Jobbik, nem tem conseguido conter os seus entendimentos com Vladimir Putin. Está na hora de o PPE expulsar o FIDESZ de Viktor Orbán e deixar bem claro de que lado está: se do lado de Orbán ou ao lado dos valores da União Europeia que ele viola há anos.

No entanto, com as honrosas exceções de Carlos Coelho e Carlos Moedas, não se ouvem no PSD nem no CDS vozes condenando as ações de Orbán. O Paulo Rangel dos discursos sobre a "asfixia democrática" perdeu aqui o fôlego. Nuno Melo aplaude e defende Viktor Orbán.

E Pedro Passos Coelho? E Assunção Cristas? Quando vamos ouvi-los dizer que não aceitam mais que Orbán esteja no partido europeu a que pertencem? Se não agora, quando?

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