Este é o primeiro peixe descoberto em grutas na Europa

A partir da observação de um mergulhador, uma equipa de cientistas estudou uma espécie de peixe que partilha características genéticas com outra espécie que vive à superfície no rios Danúbio e Radolfzeller Aach.

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A espécie tem olhos muito pequenos e uma cor pálida, com tons de rosa Jasminca Behrmann-Godel

Um simples passatempo de Joachim Kreiselmaier, o mergulho, contribuiu para que fosse descoberta a primeira população de peixes a viver numa gruta na Europa. É uma espécie que habita muito isolada de outras espécies à superfície e contém características habitualmente verificadas em criaturas adaptadas à vida subterrânea, como olhos pequenos e uma cor pálida. O estudo, publicado esta segunda-feira na revista científica Current Biology, contém análises realizadas no final de 2015, depois de Kreiselmaier ter avistado a espécie, e durante todo o ano de 2016.

Quando estava a explorar o sistema de grutas Danúbio-Aach, no Sul da Alemanha, Joachim Kreiselmaier deparou-se com um peixe que lhe pareceu estranho. Tirou fotografias e mostrou-as ao geólogo alemão Roland Berka. O também co-autor do estudo mostrou por sua vez as fotografias a Jasminca Behrmann-Godel, que também participou no estudo. Os investigadores ficaram surpreendidos e sabiam que tinham “algo de especial”.

Só três meses depois, quando Kreiselmaier voltou ao mesmo local para capturar um peixe, é que os investigadores puderam realmente começar a analisar a espécie.

“Teve de ser alguém com o ‘olho certo’ para perceber que isto podia ser algo especial e eu acredito que, mais do que as condições certas e a viagem difícil, esta descoberta dependeu de um mergulhador excepcional como o Joachim para perceber, em primeiro lugar, que o peixe podia ser especial”, disse Behrmann-Godel, da Universidade de Konstanz (Alemanha), em comunicado de imprensa do grupo que edita a revista científica.

O sistema Danúbio-Aach é de difícil acesso e o local onde Kreiselmaier encontrou os peixes não é visitado por muitos (uma área no subsolo que se estende por 250 quilómetros quadrados), como o próprio explica: “Devido à invulgar falta de visibilidade, correntes fortes, baixa temperatura e um labirinto na entrada [no sistema cársico], muitos mergulhadores não voltam para mergulhar.”

O Danúbio-Aach nem seria o local onde os investigadores pensariam encontrar a recente descoberta, mas sim na região oeste do Balcãs, onde se encontram aproximadamente 400 espécies a viver em grutas. O sistema de grutas formou-se há cerca de 400 mil a 450 mil anos, mas só depois do último período glaciar, diz o estudo, há aproximadamente 20 mil anos, é que se formou a nascente do Aach, que permitiu que tivesse ocorrido uma “primeira colonização do sistema de grutas com peixes”.

“A primeira coisa que se vê é que eles [os peixes] são pálidos, apresentam-se um bocado rosados, ou com tons de rosa, porque se consegue ver os vasos sanguíneos através da pele”, disse Behrmann-Godel à BBC News. “Os olhos estão lá, mas são mais ou menos metade do tamanho dos peixes que vivem à superfície. Se lhes direccionarmos uma luz, eles não reagem, por isso não temos a certeza se ainda estão activos. Há uma mudança a ocorrer da visão para outras capacidades de percepção.”

O facto de a equipa de investigadores de várias instituições alemãs, que também conta com Arne W. Nolte e Jörg Freyhof, ter verificado a presença de peixes com diferentes idades permitiu-lhes chegar à conclusão de que esta população recentemente descoberta é auto-suficiente.

As análises dos investigadores revelaram que a população subterrânea partilha características genéticas com outra espécie de peixe, a Barbatula barbatula, que habita no rios Danúbio e Radolfzeller Aach. Apesar de viverem separados, é possível ter existido uma migração das espécies à superfície para as águas subterrâneas, visto que o sistema Danúbio-Aach está ligado à superfície.

Para já, os investigadores vão continuar com a investigação, que vai incidir em características genéticas e comportamentais.

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