O "fantasma" Khalid Masood foi um jovem brilhante mas também violento

A polícia britânica divulgou mais informação sobre o terrorista que matou quatro pessoas junto ao Parlamento de Londres. Autoridades já fizeram 3500 interrogatórios e detiveram 12 pessoas. Buscas continuam.

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HANNAH MCKAY/EPA

A polícia britânica divulgou esta sexta-feira mais informações sobre Khalid Masood, incluindo a sua fotografia, mas entre a comunidade muçulmana da cidade de Birmingham, onde foram identificados grandes problemas de radicalização islâmica no Reino Unido, o homem de 52 anos que lançou um ataque terrorista junto ao Parlamento de Londres aparentemente em nome do Daesh permanecia um desconhecido.

“É como um fantasma, ninguém o conhece e ninguém sabe nada sobre ele”, disse à BBC Jaharn Mahmood, que é responsável por um projecto anti-radicalização na cidade e tem um vasto conhecimento da comunidade islâmica. “O que é interessante é que ele parecia viver isolado dos outros muçulmanos. Sempre que eu pergunto por um nome, consigo encontrar quem o conheça, mas neste caso não há quem saiba dizer absolutamente nada sobre ele”, observou.

Khalid Masood foi o nome escolhido pelo atacante de Londres após a conversão ao islão, que terá acontecido depois de 2003 e antes de 2009, quando deixou cair o seu nome de nascença no recenseamento eleitoral. Registado como Adrian Elms, adoptou o nome Adrian Russell Ajao após o casamento da mãe (do qual tem dois meios irmãos, com os quais cresceu). A sua mãe vive agora no País de Gales. Sabe-se que é casado e tem vários filhos – pelo menos três, dos quais uma menina e um rapaz de cinco anos.

Num raide armado realizado sexta-feira no mesmo bairro de Birmingham onde Masood vivia, a polícia deteve um indivíduo e apreendeu três veículos. Além desse, foi detido outro homem, de 35 anos de idade, na sequência de buscas efectuadas a uma moradia de três andares inserida num condomínio fechado da área metropolitana de Manchester. As duas prisões foram apresentadas como “significativas” para a investigação, que continua a tentar estabelecer conexões com o atacante, para confirmar ou desmentir a tese do “lobo solitário”.

A polícia já efectuou um total de 12 prisões: onze pessoas, suspeitas de conspiração para a realização de um ataque terrorista, permanecem sob custódia e uma mulher de 39 anos, que foi detida em Londres, foi libertada sob caução. Para muitos especialistas em terrorismo, estas informações vêm dar força à tese da ligação de Masood a algum tipo de rede jihadista, como o Daesh: em menos de 10% dos ataques executados por apenas por um indivíduo, a acção é verdadeiramente solitária, existindo sempre apoio para a preparação ou condução do ataque.

As autoridades, e os líderes religiosos e comunitários de Birmingham, reforçaram o seu apelo à informação do público. “Isto é difícil de dizer, mas esta pessoa que fez o ataque fazia parte de uma comunidade. Tinha amigos, vizinhos, fazia compras. A maior parte dos muçulmanos frequentam uma mesquita, e ele deve tê-lo feito também, algures. Quem tenha informações, ou suspeitas, por mais insignificantes que sejam, deve apresentar-se”, pediu o comandante e líder da unidade de crimes de ódio da Scotland Yard, Mak Chisty, depois de uma reunião na mesquita central de Birmingham.

Várias pessoas que conheceram e conviveram com Masood em diferentes fases da sua vida fizeram descrições muito diferentes da sua personalidade: o retrato que compuseram foi o de um jovem inteligente e promissor, que terá acabado por se envolver em actividades criminosas. “Ele era muito popular, um tipo brilhante e muito simpático. Adorava desporto, e jogava na equipa de râguebi. Toda a gente se dava bem com ele”, lembrou Stuart Knight, que foi seu colega na escola secundária de Huntleys, na região de Kent, até aos 16 anos.

Mas há muito que ainda está por explicar, nomeadamente a sua transformação num jovem violento. A primeira detenção no seu registo criminal remonta a Novembro de 1983, quando tinha 19 anos. No ano 2000, foi condenado a uma pena de dois anos de prisão por agressão com uma faca, na sequência de uma altercação que poderá ter tido motivações racistas, num pub, em Rye – para onde se tinha mudado com a mulher, supostamente para “viver uma vida mais calma, segundo dizia uma notícia da altura do jornal local The Brighton Argus, que descrevia o agressor como um arruaceiro que já tinha bebido demais. Quando saiu da prisão, mudouEm 2003, voltou a ser condenado, desta vez a uma pena de seis meses, por ter esfaqueado um homem no nariz – nessa altura, vivia em Eastbourne.

Em Setembro de 2004, casou com uma mulher de Kent chamada Farzana Malik – que poderá ou não ser a parceira com quem vivia actualmente, em Birmingham. Entre 2005 e 2009 esteve na Arábia Saudita, onde dava aulas de inglês – no seu currículo profissional só consta a profissão de professor, embora não seja claro se possuía as habilitações necessárias. A imprensa britânica menciona uma licenciatura em economia, mas essa informação não está confirmada.

Algures no seu percurso, terá chamado a atenção dos serviços de segurança que seguiam o rasto do fundamentalismo islâmico no país, embora não seja claro porquê: poderia ser amigo de algum suspeito, ou frequentar um local que estava a ser investigado. O que é certo é que não cumpriu os critérios das agências para ser designado como uma ameaça.

Masood usou a sua identidade para alugar o automóvel que usou no ataque em Londres, e para reservou um quarto no hotel Preston Park, de Brighton, onde pernoitou na véspera. “Foi cordial, sorridente, agiu pacificamente”, disse à BBC o gerente do estabelecimento, Saveur Toumi. Outros clientes, que se depararam com o atacante no hotel, disseram não ter notado nada no seu comportamento que levantasse suspeitas – calmo, educado, corpulento, foi como o descreveram.

Em Londres, a polícia já entrevistou 3500 testemunhas que assistiram ao ataque ou estiveram nos mesmos locais por onde passou o terrorista. A polícia já determinou que a última comunicação de Masood foi uma mensagem através da rede social Whatsapp, três minutos antes do ataque.

Em Londres e no resto do país continuam a multiplicaram-se os tributos e homenagens às vítimas. O mayor londrino, Sadiq Khan, visitou o centro operacional dos serviços de emergência médica , o quartel-general da brigada de bombeiros e a sede da Scotland Yard. O príncipe de Gales esteve no hospital do King’s College, para onde foram transportados feridos no ataque. Ainda há 17 vítimas internadas, das quais seis em estado considerado crítico (e dessas, duas ainda correm risco de vida). Uma cerimónia ecuménica na abadia de Westminster juntou líderes das comunidades cristã, judaica e muçulmana em Londres, e em Birmingham centenas de pessoas participaram numa vigília pela paz.

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