Agência europeia diz que glifosato não é cancerígeno. Quercus contesta

Avaliação da Agência Europeia de Produtos Químicos foi divulgada esta quarta-feira.

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Charles Platiau/Reuters

O Comité de Avaliação de Riscos (Rac) da Agência Europeia de Produtos Químicos (Echa) anunciou esta quarta-feira que considera que o glifosato não é um produto cancerígeno. “O Rac concluiu que a avaliação científica provou que não há um critério para classificar o glifosato como cancerígeno, mutagénico ou tóxico para a reprodução”, refere um comunicado no site da Echa, que tem sede em Helsínquia, Finlândia.

Esta agência europeia chegou a estes resultados da avaliação “por consenso”, segundo a agência Lusa, que adianta que esta deliberação “deverá levar a Comissão Europeia a relançar o procedimento para a renovação da licença desta substância utilizada como herbicida.”

Este parecer surge na sequência da falta de um consenso, em 2016, entre os especialistas de um comité da Comissão Europeia (CE), com representantes dos 28 Estados-membros (o Comité Permanente de Plantas, Animais, Alimentos de Consumo Humano e Animal). Portugal foi um dos países que se abstiveram. Na ausência de um consenso entre os peritos desse comité – que analisavam a proposta da CE para prolongar a autorização por mais nove anos –, palavra passou então para a CE, segundo a regulamentação europeia.

E foi assim que, em Junho de 2016, a CE anunciou que nos 18 meses seguintes, até ao final de Dezembro de 2017, o glifosato estava autorizado na União Europeia. Durante esse período, a Echa, responsável pela classificação das substâncias químicas, ficou de avaliar se a exposição humana ao glifosato provoca cancro. Foi essa análise que agora foi anunciada.

Ainda que a Echa classifique o glifosato como não cancerígeno, considera-o uma substância que provoca graves danos à visão e que é tóxico para a vida aquática.

A organização ambientalista Greenpeace já reagiu: “Para chegar às suas conclusões, a Echa rejeitou provas científicas flagrantes de cancro em animais de laboratório”, cita a Lusa. A Quercus considerou esta avaliação favorável à indústria: “Infelizmente, não é surpresa, já é tradição das agências europeias serem favoráveis à indústria”, disse à Lusa Alexandra Azevedo, da Quercus, que defende que o glifosato é potencialmente causador de cancro.

“Organizações internacionais como a Greenpeace têm denunciado a falta de transparência e o conluio com a indústria de entidades que deviam ser garantia de isenção e defesa do interesse público”, criticou a ambientalista portuguesa. Em 2014, a Quercus lançou uma campanha nacional a apelar aos municípios para que deixassem de utilizar pesticidas para eliminar ervas daninhas em jardins e outros locais públicos, com o argumento de que são responsáveis por danos na saúde, podendo provocar cancro.

O glifosato pode ser encontrado em herbicidas de uso corrente como o Round-Up (da Monsanto, que o desenvolveu) ou da Syngenta, BASF, Bayer, Dupont e Dow Agrosciences. Na Europa, estão disponíveis mais de 300 herbicidas à base de glifosato de cerca de 40 empresas diferentes. Devido ao desenvolvimento de culturas geneticamente modificadas com o objectivo de resistirem a este herbicida, a utilização do glifosato tem aumentado. Contudo, tem estado também no meio de uma controvérsia devido à sua natureza carcinogénica, de acordo com diferentes estudos científicos.

Uma petição

Há diferentes avaliações na União Europeia sobre o assunto. Em Março de 2015, a Agência Internacional para a Investigação do Cancro (IARC, na sigla em inglês), que faz parte da Organização Mundial da Saúde (OMS), referia que havia provas, ainda que limitadas, de que o glifosato era carcinogénico.

Mas depois deste relatório, duas outras agências pareciam contrariar a IARC. Sete meses depois da decisão da IARC, a Autoridade Europeia para a Segurança Alimentar (EFSA), uma agência independente financiada pela União Europeia, considerava “pouco provável que [o glifosato] tenha perigo carcinogénico para os humanos”. Por sua vez, em Maio de 2016, um relatório conjunto da OMS e da FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura) concluía que era “pouco provável que o glifosato tenha um risco carcinogénico nos humanos devido a exposição através da dieta”.

Mas outras vozes se têm levantado na Europa a favor da utilização do glifosato. A Copa-Cogeca, principal organização sindical europeia, defende a autorização da substância.

Entretanto, também várias organizações não-governamentais europeias, incluindo portuguesas, lançaram uma petição para exigir à Comissão Europeia o fim do uso do glifosato. A petição, a decorrer desde Fevereiro deste ano, pretende recolher um milhão de assinaturas até 25 de Janeiro de 2018.

Em Portugal, a 26 de Janeiro deste ano, o Governo aprovou a proibição do uso do glifosato como pesticida em espaços públicos, como jardins infantis, parques e jardins urbanos, escolas e hospitais para reduzir os efeitos na saúde pública. 

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