Controlo de fronteiras para visita do Papa vai “limitar liberdade religiosa”

Suspensão de Schengen tem sido equacionada, mas ex-ministro da Administração Interna, Rui Pereira, que tutelou visita de Bento XVI em 2010, discorda. Diz que só se justifica se houver ameaça terrorista.

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Plano inclui hospitais de campanha, meios para controlar qualidade do ar, helicópteros... PAULO PIMENTA

A vinda do Papa Francisco a Portugal, nos dias 12 e 13 de Maio, vai circunscrever-se a Fátima e não ultrapassará as 24 horas, mas, ainda assim, o dispositivo de protecção e socorro poderá contemplar a reposição do controlo documental em todas as fronteiras nacionais, segundo o Ministério da Administração Interna (MAI), que tem até duas semanas antes para comunicar esta decisão à Comissão Europeia, tal como aconteceu no Euro 2004 e na Cimeira da Nato, em Dezembro de 2010.

A hipótese ainda está em cima da mesa de Constança Urbano de Sousa, confirmou ao PÚBLICO fonte do seu gabinete. Porém, na opinião do ex-ministro da tutela, Rui Pereira, que detinha aquele cargo quando, em 2010, Bento XV visitou Lisboa, Fátima e Porto, a suspensão do acordo do livre circulação não se justifica, até por causa da limitação à liberdade religiosa que tal medida acarretaria.

“É verdade que a existência de uma fronteira externa suscita riscos especiais, mas estamos a falar de uma grande manifestação religiosa de um Papa que convoca fiéis de todo o mundo. Isto não se compara à organização de uma cimeira como a da Nato, em que se previa a chegada de pessoas hostis à cimeira e empenhadas em criar incidentes", diz Rui Pereira. "Aqui são fiéis e o preço a pagar pela suspensão de Schengen seria uma limitação efectiva e de ordem prática à liberdade religiosa”, aponta o ex-ministro.

Falando “à vista desarmada”, Rui Pereira conclui assim que, “a não ser que haja sinais que apontem para alguma possibilidade de atentado efectiva”, a reposição do controlo fronteiriço não se justifica.

Vocação “táctil” do Papa dificulta segurança

O facto de a visita se circunscrever a Fátima facilitará o trabalho dos profissionais responsáveis pela segurança do Papa, segundo António Nunes, do Observatório de Segurança, Criminalidade Organizada e Terrorismo. “Quanto menos [o Papa] se desloca no território menos medidas de segurança são necessárias e mais aumenta a capacidade preventiva, de vigilância e de acompanhamento”, observa.

Visitas como esta “começam a ser preparadas um ano antes” entre as diferentes polícias, explica, nomeadamente os responsáveis no Vaticano por acompanhar o Papa e para os quais a visita a Portugal não deverá passar de uma “operação rotineira”, mesmo considerada o risco de haver um atentado terrorista.

De resto, a ameaça terrorista já pairava por ocasião da vinda de Bento XVI e, nestes casos, o que importa, segundo o ex-titular do MAI, Rui Pereira, é “conjugar a acção da segurança territorial, com a contribuição do serviço responsável pelas fronteiras, que é o SEF, do responsável pela produção de informações, que é o SIS, e com os órgãos que detêm responsabilidades em matéria de terrorismo e criminalidade que é a PJ”.

Os locais por onde passará o Papa serão inspeccionados previamente para detectar a presença de explosivos e haverá atiradores especiais destacados em diferentes locais. “A dificuldade acrescida é que este Papa é extremamente popular, gosta de falar com as pessoas e tem uma vocação táctil que Bento XVI não tinha. Isso torna mais difícil a missão de segurança, para cujos operacionais quanto mais isolada estiver a pessoa a proteger melhor é", afirma.

Quando faltam dois meses para a visita do pontífice argentino, as medidas de segurança começam a ser conhecidas. Do lado da protecção civil, vão ser mobilizados 565 operacionais. Este número poderá ser reforçado, segundo o comandante operacional distrital do Comando Distrital de Operações de Socorro de Santarém, Mário Silvestre, caso haja uma “situação de emergência”. Para isso, haverá 186 operacionais de reserva.

Nas imediações do santuário, haverá dois hospitais de campanha e 100 ambulâncias, além de dois postos médicos avançados e postos de socorro fixos e móveis. O dispositivo de protecção e socorro contará ainda com três helicópteros, meios de análise da qualidade do ar e de combate a incêndios. E, logo a partir do dia 10 de Maio, será criado um Centro de Orientação de Doentes Urgentes (CODU) em Fátima, responsável pela triagem e encaminhamento das chamadas que forem feitas para o 112 a partir de Fátima.

Os operacionais da protecção e socorro começarão a chegar ao local a partir do dia 5 e até 21 de Maio, sendo o pico de emergências médicas esperado para 12 e 13. Nesses dias, a GNR conta com a presença de pelo menos 500 mil pessoas. Alguns responsáveis da Igreja Católica já apontaram para um milhão.

Para os peregrinos que não consigam aceder ao recinto, haverá ecrãs gigantes e uma instalação sonora no espaço envolvente à Basílica da Santíssima Trindade. O controlo da entrada de carros na Cova da Iria iniciar-se-á logo no dia 11 e, a partir da manhã de 12 só poderão circular ou entrar viaturas credenciadas. Para garantir a segurança da multidão e prevenir actos criminosos, a GNR reforçou as câmaras de videovigilância: de oito para 11. As câmaras funcionarão 24 horas por dia, durante um ano. E visam, além de ajudar a garantir a segurança durante a visita papal, diminuir a actividade dos carteiristas.

Do lado do Governo, já foi dada autorização especial para a aquisição de 200 coletes para protecção balística e 150 pistolas-metralhadoras para a GNR. Já a PSP pôde, igualmente no âmbito da preparação para a visita do Papa, municiar-se com mais 17 malas de protecção balística, 15 malas tácticas, 18 malas codificadas para armas e 80 kits básicos de emergência média.   

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