Obrigatório passear

Por cada colisão na estrada há dez quase-colisões. Só a sorte distingue umas das outras. Infelizmente só as primeiras é que entram para as estatísticas.

É nas áreas de passeio, nos parques naturais, com estradas estreitas e muitas curvas, que mais bem se observam os comportamentos lunáticos ao volante. O pior são sempre dois automóveis picados em que dois labregos procuram ultrapassar-se um ao outro porque essa é a única maneira de determinar cientificamente quem é que é mais másculo.

Como sempre é na língua que se encontram as autorizações culturais para estas selvajarias. Em Portugal continua-se a falar em acidentes como se todas as colisões fossem azares. Só falta acrescentar "de percurso" para a inocência dos responsáveis ser total. Continua-se a falar de sinistros como se as colisões fossem obras do diabo. Continua-se a falar em desastres como se fossem catástrofes inevitáveis, tão isentas de causação humana como um maremoto.

Vou montar uma câmara GoPro no meu carro para filmar os destravados que andam a arriscar as vidas dos outros. O que é que nos impede de denunciá-los? Que estranho civismo nos faz calar a boca para protegê-los? O nosso silêncio e a nossa aversão ao policiamento são uma forma irresponsável e perigosa de cumplicidade.

Os condutores mais perigosos não são aqueles que se julgam pilotos de automóveis. São os que andam zangados com a vida e com a pessoas. Eles que arranjem outra maneira de morrer, que não mate mais ninguém. Tirem-lhes as cartas.

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