“Parece-me que a maioria poderá alargar-se”

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André Freire SHAMILA MUSSA

André Freire sublinha que a aliança das esquerdas em Portugal pode ser um exemplo para países da União Europeia e pode ser reeditada, evoluindo até para uma coligação de governo, no futuro. Ainda assim, adverte que a actual “solução não tem o mesmo grau de implicação de uma coligação”. Sobre o Presidente, considera que “está a fazer é a normalizar o país constitucionalmente e a cumprir o que disse que ia fazer”.

Escreve que o eleitorado “premeia quem está disponível para cooperar e penaliza quem não está”. Isso pode acontecer em futuras legislativas, premiando esta maioria?
O eleitorado, quando decide, é por uma multiplicidade de factores. Mas esta solução, a continuar como está, a tentar cumprir globalmente as regras europeias com resultados relativamente positivos e a haver esta capacidade de entendimento, penso que isso será premiado e parece-me que a maioria poderá alargar-se. Gostaríamos de ter mais crescimento económico e menos dívida, naturalmente, mas apesar de tudo os resultados são positivos e assim são avaliados pela maioria da população.

Este tipo de alianças pode evoluir para coligação de Governo com participação do BE e PCP?
Primeiro temos de ver se esta aliança cumpre a legislatura inteira, o que acho que era desejável e bom para a própria capacidade de renovação da aliança. As coisas não são assim tão fáceis, porque esta solução não tem o mesmo grau de implicação de uma coligação, mas também dá margem de manobra aos partidos para realçarem as suas nuances. Assim respira mais, as identidades e as autonomias de cada partido ficam mais afirmadas. Cada solução tem vantagens e inconvenientes. Mas num país em que as esquerdas estiveram quarenta anos sem conseguir falar umas com as outras, talvez esta seja a solução mais adequada neste período.

Defende que este tipo de alianças foi comum na Europa depois da queda do Muro de Berlim. Mas a esta aliança de governo na actual fase da UE pode vir a fazer escola para outros países de forma a levar a esquerda a ser dominante na Europa e a influenciar uma viragem da política europeia? Há vários partidos que têm vindo cá ver como esta aliança funciona.
É preciso ter em conta que a esquerda-radical é muito fraca na Europa de Leste, é a herança do comunismo, foi um trauma. Mas na Europa Ocidental, a seguir à queda do Muro de Berlim, já lá vão 27 anos, de facto houve uma generalização em muitos países, durante um período. Antes da queda tinha havido em França, Islândia e Finlândia. Agora, neste período mais próximo da crise das dívidas, a solução portuguesa é relativamente extraordinária. Acho que esta via pode ser sinalizadora para outros países da Europa, porque os partidos socialistas estão numa crise profunda de identidade, o que resulta de alianças com o centro direita. Mas pode ser um sinal, eu termino o livro a dizer isso.

No livro não fala de Marcelo Rebelo de Sousa. Como vê a actuação do Presidente da República?
Está a ter um papel muito importante. O que Marcelo Rebelo de Sousa está a fazer é a normalizar o país constitucionalmente e a cumprir o que disse que ia fazer, que é: vou conviver com qualquer governo com normalidade constitucional. Não é só a esquerda que está a cumprir as promessas, é o Presidente também. E isso é uma coisa muito boa para a democracia.

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