Livrarias, requiem e renascimento

No universo das livrarias teremos ainda, provavelmente, mais más notícias. Mas a par delas vão surgindo novos espaços, com ousadia e ideias próprias

Não é fenómeno novo, o encerramento de livrarias históricas na baixa lisboeta. Mas acentuou-se no novo milénio devido a uma soma de factores: concorrência eficaz noutros espaços (hipermercados, internet), quebra de vendas, alterações no mercado livreiro, desinteresse pelo negócio, aumento do preço dos espaços arrendados. Quando fechou a Livraria Portugal, com forte presença há sete décadas na Rua do Carmo, no Chiado, os lamentos públicos foram inconsequentes. E no lugar dela surgiu uma pastelaria. Isso em 2012. Agora foi a vez da Livraria Rodrigues, bem mais antiga (fundada em 1863), na Rua do Ouro. É uma tendência difícil de contrariar? A realidade confirma-o. Os nomes das antigas livrarias, quando subsistem, vão migrando para o mundo virtual (a Portugal e a Petrony são exemplo disso), onde o negócio é mais sustentável. Os que subsistem no espaço físico vão acrescentando algo à tradicional oferta das livrarias: a par dos livros, há também discos, filmes, auditórios, cafés, bares.

“Os livros vendem-se hoje em todo o lado: nas grandes superfícies, na Internet, nos correios, a preços e com condições que não podemos acompanhar”, referia um dos livreiros da Portugal, na altura em que esta se viu forçada a fechar as portas. Por isso, hoje, o desafio das livrarias é reinventarem-se para lá do seu conceito básico. Outra das livrarias do Chiado, a Sá da Costa fechou quando completava pouco mais de um século, mas no seu lugar surgiu um alfarrabista que não se tem queixado do negócio. Que é rentável, como prova a experiência de vários outros alfarrabistas, em Lisboa mas sobretudo no Porto, onde se registam vários casos de sucesso; o mesmo Porto onde a Lello (fundada em 1906) tem sabido explorar bem a sua condição de livraria-museu, atraindo não apenas turistas mas também clientes.

No universo das livrarias teremos ainda, provavelmente, mais más notícias no futuro. Mas a par delas vão surgindo novos espaços, com ousadia e ideias próprias, uns nascidos dos que fenecem, outros vindos apenas de gente com paixão pela leitura, pelos livros, pelo mundo que os vê crescer. Talvez a prazo ressurjam até os antigos vendedores qualificados, que se foram perdendo na mercantilização rápida e impessoal dos nossos dias. Se isso acontecer, o requiem de hoje poderá dar lugar a um verdadeiro renascimento nos próximos anos. E há-de haver público, se houver engenho e gosto em tal tarefa.

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