Offshores: Bancos, reguladores e até IGF levantam problemas sobre novas regras

Perda de competitividade, isolamento do país face às iniciativas dos parceiros, difícil de aplicar ou até alertas sobre possível promoção de más práticas, são alguns dos argumentos contra as propostas dos partidos.

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Carlos Jasso / Reuters

As várias entidades que entregaram pareceres na Assembleia da República concordam com o princípio de mudar a legislação para regular a relação com paraísos fiscais, mas nem sempre concordam com a forma como os partidos o querem fazer. Banco de Portugal (BdP), Comissão de Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), Associação Portuguesa de Bancos (APB) e mesmo a Inspecção-Geral de Finanças (IGF) levantam problemas que passam não só pela aplicabilidade e utilidade de algumas medidas, como defendem que em alguns casos podem prejudicar o investimento estrangeiro em Portugal ou a competitividade do país no mercado de capitais.

Até agora sete entidades entregaram pareceres sobre os projectos-lei que estão a ser debatidos no Parlamento e que de algum modo se relacionam com offshores - são 14 as propostas que visam, por exemplo, aumentar os impostos sobre estras transacções e aumentar a sua base de incidência; obrigar à publicação de todas as transferências; ser declarado quem é o destinatário final de um negócio e ainda há uma proposta do PCP para proibir ou limitar negócios com offshores, cooperantes ou não.

Os pareceres referem por várias vezes que no geral esta legislação pode ser "excessiva" e até prejudicial ao país. Um dos argumentos sublinhados pelos reguladores, supervisores e pelos bancos é a sugestão de que Portugal não abra uma frente legislativa anti-relações com offshores de modo unilateral. Num parecer, o BdP, lembra aliás que há legislação europeia que pode ser transposta e que resolverá parte do problema. A APB acrescenta que é preciso garantir que a lei portuguesa não vá "além" da  Europa "sob pena de grave desvantagem competitiva geradora de prejuízo para o sistema financeiro nacional". A associação que representa os bancos coloca ainda várias dúvidas sobre a aplicabilidade de algumas das normas, que recaíriam sobre os bancos.

Não são as únicas entidades a pensar assim. A CMVM, que até diz compreender estas propostas, apela a que se tenham em conta os efeitos práticos, sobretudo quando as medidas são tomadas "isoladamente" e podem por isso ter "eventuais impactos reflexos ao nível designadamente, do crescimento, do emprego, das receitas fiscais, das contribuições para a segurança social, entre outros”

Esta frente unilateral, ou seja, Portugal mudar as regras sem ser acompanhado pelos restantes parceiros europeus, traria várias desvantagens. O BdP, avisa, por exemplo, que um aumento das taxas como é proposto por vários projectos do PCP em análise, devem ser avaliados pelas "vantagens e custos" que podem ter, "nomeadamente o risco de deslocalização de actividade para outros países e até de quebra de receita fiscal, resultantes de alterações de grande amplitude nas taxas de tributação decididas de forma unilateral por parte de Portugal".

A entidade que não vê nisto um problema é o Observatório de Economia e Gestão de Fraude, que dá parecer positivo à maioria das propostas, apesar dos efeitos. "Mesmo que estas limitações impliquem alguma redução da atractividade do investimento directo estrangeiro, não nos parece que seja este tipo de investimento estrangeiro que será motor do desenvolvimento económico e social do país", lê-se no parecer.

Já a IGF, que concorda com algumas medidas, como o alargamento da base de incidência dos impostos para estes negócios com paraísos fiscais ou a publicitação de todas as transferências, deixa dúvidas sobre a proibição de relações com offshores. "Pensamos que a via mais correcta não seria a proibição destas operações, visto que esta medida, além de poder colocar questões de direito internacional, tenderia a ser contornada por práticas possivelmente ainda mais complexas e evasivas", avisa.

O grupo de trabalho estava ainda à espera de receber dois pareceres em falta, mas decidiu avançar com o trabalho depois de receber estes sete. Assim, os deputados têm até ao dia 3 de Março para apresentar propostas de alteração. Para já, a limitação de pagamentos em numerário a partir de determinado valor, uma proposta de combate à criminalidade financeira, deverá ser a primeira a avançar

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