Relatório de Ana Gomes sobre a zona franca da Madeira motiva críticas do PS

Os socialistas madeirenses demarcaram-se da análise entregue pela eurodeputada na comissão que está a analisar os Panama Papers em Bruxelas. Nuno Melo estranha o timing e o governo regional fala de ligeireza e tentativa de protagonismo pessoal.

Foto
PS-Madeira e Nuno Melo (CDS) observam que há dezenas de espaços de fiscalidade preferencial na UE, além da Madeira Miguel Manso

Um relatório entregue esta semana em Bruxelas pela eurodeputada Ana Gomes sobre o Centro Internacional de Negócios da Madeira (CINM) provocou um turbilhão de críticas no arquipélago. O documento, em que a eurodeputada socialista conclui que o CINM é “extremamente vulnerável” à lavagem de dinheiro e fraude fiscal, foi encaminhado para a comissão de inquérito que está a analisar no Parlamento Europeu o caso dos Panama Papers, e mereceu a “absoluta repulsa” do PS-Madeira.

“A deputada Ana Gomes voltou esta semana a abordar o tema da Zona Franca da Madeira e, mais uma vez, tem a absoluta repulsa do PS-Madeira pela forma e pelo conteúdo da sua intervenção”, demarcou-se o líder dos socialistas madeirenses, Carlos Pereira, apontando “erros claros” na análise que a parlamentar faz ao CINM.

As críticas de Carlos Pereira sobem de tom, acusando Ana Gomes de já ter reconhecido, numa recente visita ao Funchal, não ter uma “percepção objectiva” das características da zona franca.

Carlos Pereira, que é vice-presidente da bancada socialista em São Bento, “clarifica” que o relatório não reflecte a posição da direcção nacional do partido, nem mesmo o entendimento do grupo parlamentar do PS no Parlamento Europeu. “A posição do PS é muito clara: as decisões sobre esta matéria têm de ser tomadas de forma multilateral”, sublinha, argumentando sobre a falta de sentido em acabar com a praça madeirense e nada fazer sobre as dezenas de espaços de “fiscalidade preferencial” que existem dentro da União Europeia.

“Se a Zona franca da Madeira acabar, o único efeito possível é a deslocação de investimento para outras praças e o prejuízo imediato para o país”, sintetiza o deputado, lamentando a “abordagem negativa” de Ana Gomes, com a qual está em “profundo desacordo”.

À direita, tanto o governo regional como o CDS também não perdoam aquilo a que chamam um acto “intencional de malvadez” que imputam a Ana Gomes, que o PÚBLICO não conseguiu ouvir. Num artigo de opinião publicado esta quinta-feira no Jornal de Notícias, Nuno Melo lembra que na União Europeia “coexistem muitos destinos que oferecem regimes fiscais preferenciais”. E conclui: ”Atacar o CINM, quando tudo o resto subsiste, não alcança qualquer propósito de harmonização fiscal a nível europeu, mas seguramente que prejudica Portugal”.

No artigo O centro de negócios que o PS odeia, o eurodeputado centrista ironiza com as “coincidências de que o destino é pródigo”, dizendo que antes de Ana Gomes, foi José Sócrates a atacar a zona franca madeirense, ao suspender o processo de negociação com a Comissão Europeia em 2011. “Recentemente, é sabido, José Sócrates tem sido associado pela comunicação Social a offshores geridos pela Mossack Fonseca. Na investida inquisitória feita de lama e suspeições sem provas que lhe marcam o estilo, Ana Gomes decidiu atacar a Madeira e a imagem de Portugal. Tipicamente, esqueceu os Panama Papers naquilo que, alegadamente, poderia ter que ver com o correligionário de partido”, escreveu Nuno Melo.

Também o executivo madeirense, liderado pelo social-democrata Miguel Albuquerque, lamenta os impactos negativos que o relatório pode ter no centro de negócios. “Vem colocar em causa os interesses da região e do país, que são atropelados, com ligeireza, por meras motivações de protagonismo pessoal a todos os níveis reprováveis”, afirmou ao PÚBLICO o secretário regional das Finanças, Rui Gonçalves, sublinhando que o partido pelo qual a eurodeputada foi eleita distanciou-se desta iniciativa. A posição do PS, acrescenta, atesta de forma inequívoca, o descrédito das iniciativas de Ana Gomes, mesmo junto do partido a que pertence.

No relatório, a eurodeputada aponta a falta de fiscalização e de informação sobre as empresas a operar no CINM, crítica os empregos fictícios criados no centro, alerta para o impacto artificial que a receita fiscal ali gerada tem tido no PIB regional e lembra a dívida ocultada pelos governos de Alberto João Jardim.

Sugerir correcção
Comentar