Colégio turco em Luanda foi encerrado, estudante vira rosto do protesto

Especula-se sobre se Governo angolano terá seguido ordens do Governo turco, que mandou fechar na Nigéria escolas do movimento Fethullah Gülen. Novo Jornal diz que colégio fechado na sexta-feira vai para mãos de angolanos

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Tchissola Figueiredo protesta contra fecho do colégio turco em Luanda

Colocou um vídeo de dez minutos no Facebook. Pediu que o partilhassem. E em menos de 24 horas, Tchissola Figueiredo tornou-se no rosto do protesto de encerramento do colégio turco em Luanda, na sexta-feira, nem uma semana depois do arranque do ano lectivo. Na manhã desta segunda-feira, o vídeo ía em quase 50 mil visualizações, mais de 2700 partilhas e mais de 250 comentários. A estudante de 17 anos quer que a mensagem circule o máximo possível para pressionar o Governo a não fechar a escola.

De camisola azul com o logotipo do Colégio Esperança Internacional, o nome do colégio turco, Tchissola Figueiredo promete explicar os rumores que circularam desde que a escola fechou por ordem de um despacho do Ministro da Educação, Pinda Simão, de 7 de Fevereiro. O despacho manda a entrega de toda “a documentação fundamental da instituição” ao Gabinete Provincial de Educação de Luanda no prazo de oito dias: documentos legais, processos individuais dos alunos, contratos e registos do corpo docente. Será o gabinete a supervisionar o processo e a prestar informação aos pais e aos encarregados de educação, diz. Mas até agora nada foi avançado, queixa-se Tchissola Figueiredo ao PÚBLICO.

Quando se abre a página na Internet do colégio, há um anúncio a avisar que as inscrições para o ano lectivo de 2017 já estão abertas. Nenhuma informação sobre o fecho. Esta segunda-feira estava marcada uma reunião com os encarregados de educação no Ministério, seguido de um protesto de pais e alunos às 16h, disse a jovem. Segundo o Novo Jornal, os encarregados de educação tinham sido informados de que haveria novo dono, um angolano, com quem se deveriam ter reunido no domingo, mas ele faltou ao encontro.  

Na sexta-feira, sem explicação, os alunos foram surpreendidos pelo fecho do colégio em pleno horário de aulas. Nas redes sociais criticava-se o facto de o Ministério ter deixado o ano lectivo começar seis dias antes. “Representantes do Ministério da Educação e do SME (Serviço de Migrações e Fronteira) apareceram na escola, chegaram e interromperam as nossas aulas. Houve um grande alarido”, conta Tchissola Figueiredo no vídeo. Os professores “fizeram uma fileira e estavam rodeados da polícia”, continua. No encerramento, foram “violentos”, “e em frente de crianças”, acusou. “Também estou muito chateada pela forma como humilharam os professores na minha frente”, disse.

A maioria dos professores são turcos, diz a jovem ao PÚBLICO, e as aulas são leccionadas em inglês. No vídeo explica que há uma polémica com o movimento Fethullah Gülen, acusado pelo presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, de ser responsável pela tentativa de golpe de Estado de 15 de Julho. Na Nigéria, em Julho, o embaixador turco tinha pedido ao Governo que encerrasse 17 escolas ligadas a Gulen. “Este movimento não tem nada de errado, é humanista, tem como objectivo mostrar que nem todos os muçulmanos são radicais e extremistas", repete a jovem no vídeo. "E mesmo assim, nós não fazemos parte deste movimento.”

Garantir bem-estar, diz Presidente da República

Já em Outubro de 2016, o Presidente da República José Eduardo dos Santos tinha ordenado o fecho do colégio justificando-o com a “necessidade de se garantir o bem-estar e a segurança dos cidadãos num clima de paz e harmonia social”, “sem quaisquer divisionismos susceptíveis de atentar contra a unidade e a integridade territorial”. O despacho presidencial, a que o PÚBLICO teve acesso, ordena o cancelamento dos vistos dos docentes e funcionários “obtidos por via do colégio” e que os “seus utentes sejam administrativamente expulsos do país”. Além disso, “as instalações e o património dos órgãos referidos ficam sob custódia do Ministério do Interior”, define.

Justamente em Outubro, o director provincial da Educação, André Soma, garantiu que o colégio estava legal, noticiou na altura o Novo Jornal. Isto depois de, segundo O País, o director do colégio, Abdullah Góne, ter dito  que tinha recebido informação de que o colégio teria que encerrar no segundo semestre de 2016, sem que lhe fossem dadas razões.

“Somos privados, sem dedo nenhum do estado e sem apoio de nenhuma embaixada. E temos o ensino angolano", diz Tchissola Figueiredo ao PÚBLICO. Considerando que aquela é “uma das melhores escolas” do país, acrescenta que há uma relação familiar entre os alunos e o corpo docente e que os professores estão a ser tratados como criminosos. "Vamos perder pelo menos um mês de aulas”, lamenta.  

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