Vem aí um conselho superior de obras públicas com carácter vinculativo

Estrutura deve estar operacional no início do próximo ano. Discussão de programas plurianuais servirá apenas para investimentos a realizar depois de 2020.

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Grandes obras públicas dependerão do aval de um conselho superior DR

Não é a primeira vez que um governo cria uma estrutura superior para discutir a relevância técnica, económica e financeira de uma determinada obra pública, mas aquela que o ministro Pedro Marques se propõe constituir ainda este ano terá uma representação mais alargada que as anteriores e, pela primeira vez, será chamada a dar pareceres obrigatórios e vinculativos.

A ideia de constituir um Conselho Superior de Obras Públicas (CSOP) está inscrita no programa do Governo, e já aí se podia perceber que a “representação plural” invocada passava por “ordens profissionais relevantes, universidades, Regiões e Áreas Metropolitanas e associações ambientais” e que deveria ser designada pelo Conselho Económico e Social (CES). Ao PÚBLICO, fonte do Governo anunciou que o projecto de decreto-lei já começou a ser trabalhado e que a proposta deve estar concluída até ao final do primeiro semestre. Sem se comprometer com prazos, o Governo gostaria de ter esta estrutura a funcionar ainda antes do final deste ano de 2016.

A principal diferença entre esta estrutura que está a ser criada no Ministério do Planeamento e aquelas que foram criadas em 1945, 1971 e 2007 é que ela deverá emitir parecer obrigatório “sobre os programas de investimento e projetos de grande relevância”, diz o programa do Governo. O último Conselho Consultivo de Obras Públicas, Transportes e Comunicações – criado em 2007 e que tinha por missão coadjuvar o governo na resolução das questões relativas a obras públicas, transportes e comunicações, mas apenas com carácter consultivo – foi extinto em 2011.

Obras com maioria de 2/3

No capítulo em que enuncia uma “nova metodologia para programar e executar obras públicas”, o programa do governo também refere a necessidade de enviar para “sujeição, apreciação e aprovação parlamentar, por maioria qualificada de 2/3” todos os programas plurianuais de investimento, sendo que eles devem trazer “indicação expressa das respectivas fontes de financiamento”. Esta mudança implicaria que as grandes obras fossem consensualizadas no Parlamento, antes de avançarem.

Um ano depois da tomada de posse do Governo presidido por António Costa, a Confederação da Construção e do Imobiliário (CPCI) diz que, nestas matérias, está quase tudo por fazer. Manuel Reis Campos recorda que a CPCI tem assento no CES e ainda não foi abordada para discutir “absolutamente nada”. Refere, ainda, que já há planos plurianuais discutidos e consensualizados - como o PETI 3+, o plano de investimento em transportes e infraestruturas, que elenca 63 intervenções e um investimento de 5,1 mil milhões de euros, mas cuja calendarização e execução está “completamente ultrapassada”. “Continuamos a insistir nos mesmos erros do passado – não há planeamento, não existe calendarização e nas raras situações em que há consensualização política e articulação com a sociedade civil, em relação a projectos a cumprir, os mesmos não são concretizados”, critica Manuel Reis Campos, referindo-se precisamente ao PETI 3+, mas também os investimentos na reabilitação urbana.

O presidente da CPCI nota que com este Governo houve uma mudança no discurso e que a hostilidade para com o sector da construção e do imobiliário e do investimento público não é “tão declarada” como foi com Pedro Passos Coelho. “Assumir a política de cidades e habitação como prioridade, avançar com o plano de valorização das áreas empresariais, candidatar mais de 1,2 mil milhões de euros ao programa de financiamento de tranportes da Europa, o CEF, são sinais positivos. Mas ainda não passaram de anúncios. Só terão efeito prático no sector se forem concretizados no primeiro trimestre do ano”, defende Reis Campos.

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Discutir investimentos para depois de 2020

Se o Governo já anda a anunciar obras e investimentos – como o plano Ferrovia 2020, os investimentos no sector portuário e até a nova pista do aeroporto de Lisboa – é porque considera que estes já estão consensualizados e discutidos antes de os fazer aprovar por maiorias parlamentares ou de os sujeitar ao parecer vinculativo de um Conselho Superior de Obras Públicas. Ao PÚBLICO fonte do gabinete de Pedro Marques admitiu que esta nova metodologia para programar e executar obras públicas será utilizada apenas para a discussão e calendarização dos investimentos a efectuar no próximo ciclo de apoios comunitários, após 2020. É o que o Governo pretende fazer com a definição do anunciado Plano de Mobilidade 2030, e cujo arranque de discussão Pedro Marques pretende assinalar ainda este ano.

Apesar de o Governo pretender fazer mudanças ao actual programa de apoios comunitários, e de prever arrancar este ano com a reprogramação do Portugal 2020, a verdade é que esta não poderá trazer grandes alterações em termos de envelope financeiro. E também é verdade que a Comissão Europeia pediu aos países que comecem a trabalhar no próximo ciclo de apoios ainda este ano, para que os programas operacionais que vão estar em vigor a partir de 2020, possam começar a ser negociados em 2018.

Uma outra questão que ainda precisará de ficar definida – porventura em conselho de ministros, e depois no Parlamento – são os limites do que é um “investimento de grande relevância”, ou até, o que é uma obra pública  Isto porque, se até agora se andou sempre a falar de estradas, aeroportos, ferrovia e portos, é legítimo questionar se um hospital ou um centro escolar não devem cair nesta definição de investimento público. Outra questão a definir é qual o montante a partir do qual merece que se esteja falar de uma grande empreitada de obras públicas. No Observatório das Obras Públicas, instalado pela Federação da Construção, esse valor está nos cinco milhões de euros. 

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